O BIG BRASA E MINHA VIDA MUSICAL | ||||||||||
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A música
esteve sempre em minha vida, marcando forte presença. Desde criança, em São
Paulo, e depois em Fortaleza, o mundo da música influenciou minha maneira de
ser e despertou algumas características e habilidades que talvez não aflorassem
sem ele.
As palavras seguintes foram
escritas com o simples objetivo de registrar para os meus filhos - e quem sabe
netos - e outros parentes, além de amigos e colegas, o que aconteceu durante o
meu envolvimento com a música, as minhas diversas e estreitas ligações com o
meio musical, particularmente no período em que existiu o conjunto musical Big
Brasa, do qual fiz parte primeiramente como guitarrista-solo e depois como
tecladista, administrando-o por alguns anos.
Agora com a Internet as chances de
estes conhecimentos passarem adiante serão maiores e fico feliz se puder de
alguma forma contribuir para aqueles que começam a carreira artística ou para
os amigos saudosistas, que como eu consideram esse período como verdadeiramente
inesquecível.
Os fatos passam muito depressa e
muitos acontecimentos simplesmente desaparecem de nossa memória ou talvez
fiquem armazenados em longínquos arquivos perdidos no emaranhado de nossa
mente. Sempre pensei em escrever sobre o meu envolvimento com a música. Ao
aprender que existe uma diferença bem grande entre a fantasia, os sonhos e a
realidade, decidi pôr em prática e detonar o projeto. De início gostaria de
afirmar que este pequeno ensaio não tem grandes pretensões no que se refere à
escrita. As idéias serão sempre mais importantes do que as regras, quando se
trata da transmissão de fatos. Portanto, aqueles que se interessarem pelos
conhecimentos aqui contidos, procurem desfrutar o máximo possível e entender
todos os acontecimentos estabelecendo parâmetros existentes aos anos em que
eles ocorreram, ou seja, com as dificuldades do momento, o ímpeto da juventude,
a falta de experiência em decorrência da idade.
Não espere uma obra literária, mas
sim um relato simples de um cara esforçado e que começou a trabalhar muito
cedo. Na cronologia, procurarei entremear os fatos que para mim foram mais
significativos, de modo especial aqueles ligados à música. Você, que agora está
iniciando a leitura desta história, deverá estar com o espírito numa boa,
desarmado de qualquer preconceito. Não fique triste e não desanime se não for
músico e por esse motivo deixar de entender algum detalhe técnico, em especial
sobre equipamentos ou eletrônica. Calma, fique frio, que ainda há tempo para
aprender muita coisa interessante...
Nós, que
participamos do conjunto musical Big Brasa, vivemos um período extraordinário,
pois conseguimos realizar um de nossos primeiros sonhos, transformando-os em
uma realidade palpável, conhecida e apreciada por muitas pessoas. A existência
do Big Brasa, entre outros fatores benéficos, contribuiu ainda para que eu
ganhasse mais desembaraço, por força dos inúmeros contatos realizados, o que
particularmente me auxiliou muito, pois aprendi a enfrentar os problemas desde
cedo e a tentar resolvê-los, na medida do possível. Algumas decepções
decorrentes do trabalho nunca nos desanimaram. As inúmeras vitórias e o sucesso
obtidos muito enriqueceram nossas vidas, tenho certeza.
Independentemente
do caminho seguido pelos participantes do conjunto Big Brasa ou das pessoas que
estavam à nossa volta, tudo o que passamos fortaleceu nossos espíritos,
personalidades e massageou nossos egos, o que não faz mal a ninguém. A vivência
adquirida, os perigos enfrentados, as descobertas feitas, as experiências, os
obstáculos superados, tudo isso nos fez muito bem. Não há uma rigorosa ordem cronológica dos
fatos narrados. Do conjunto musical Big Brasa temos imagens apenas em
fotografias. Entretanto, no decorrer da leitura você encontrará vários flashes referentes à música, ao Big
Brasa ou a seus integrantes, os quais, de acordo com o envolvimento de cada
participante nos episódios relatados, de maneira direta ou indireta, remeterão
avisos para as áreas mais remotas de nossa memória e certamente trarão
lembranças agradáveis.
Foram muitas as experiências e
situações vividas durante nossa jornada, muitos desafios e perigos enfrentados.
Todos começamos a trabalhar ainda muito jovens, com muito entusiasmo e
dedicação pelo que fazíamos. Certamente que as circunstâncias diversas nos
trouxeram mais responsabilidade e equilíbrio. É por demais oportuno agradecer a
Deus e a nossos guias por nos terem protegido dos perigos que nos rondaram.
Agradecimento especial todos
devemos a meu pai, Alberto Ribeiro da Silva, o Mestre Alberto, e à minha mãe,
Francisca Amasile Pereira da Silva, a Dona Zisile, pela ajuda constante,
incondicional e das mais diversas formas, no desenvolvimento do conjunto. De
modo particular agradeço à minha mulher Aliete, que muito me incentivou, me
compreendeu e suportou as dificuldades decorrentes da profissão, visto que
ainda jovens não tivemos quase oportunidade de diversão. Os sábados, domingos e
feriados não existiam para nós para lazer, era puro trabalho, muitas vezes
cansativo, mas gratificante. Quem é músico sabe disso muito bem...
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Música desde criança
Meu nome é João Ribeiro da Silva
Neto. Nasci em São José dos Campos, São Paulo, aos 29 dias de abril de 1952.
Filho de pais maranhenses, Alberto Ribeiro da Silva e Francisca Amasile Pereira
da Silva.
Em São José, morava na Rua Justino
Cobra, 235, na Vila Ema. A cidade, de clima frio, sempre foi muito agradável,
limpa e calma. Tenho excelentes lembranças de minha infância.
Quando voltava da aula, a pé,
vinha tocando “Rosa Maria”, que segundo meus pais era a música que
eu gostava mais, talvez por tê-la aprendido primeiro. O segundo acordeon, aos 8
anos, foi presente de minha mãe Zisile, também Scandalli, mas de 80 baixos, tão
grande para mim que eu não podia segurá-lo de forma correta. O incentivo e
gosto de meus pais pela música foram constantes. Até o bolo de meu aniversário
de 6 anos, muito grande e confeitado por minha mãe, tinha a forma de uma
cítara. Na foto ao lado apareço no terraço de nossa casa, em São José dos
Campos.
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Tentativa de conseguir um milagre com música
Da infância e dos primeiros anos
de música, lembro de um fato interessante, coisas de menino. Certo dia, meu pai
chegou em casa trazendo um presente para
mim. Cinco ou seis pintinhos, que ele ganhou não sei onde. Fiquei super animado
com os bichinhos e, para curtir melhor ainda aqueles “brinquedos”
coloquei-os para nadar em um tanque no quintal. Devo ter ficado ali por algum
tempo me divertindo e olhando os pintinhos nadarem. Não sei porque motivo saí
de perto, me envolvi com outra coisa, certamente, e esqueci aquela brincadeira.
Foi o suficiente para a tragédia. Quando eu lembrei dos pintinhos e voltei
correndo para continuar a brincadeira me deparei com todos eles flutuando no
tanque. Morreram de cansaço pois, pela altura do tanque e quantidade de água,
não conseguiram alcançar a borda e sair. A ligação desse lance com a música deu-se pelo fato de eu ter pegado o acordeon
e ir para a frente de um oratório e ficar tocando desesperadamente para Nossa
Senhora e pedindo que ela ressuscitasse os pintinhos. Mas infelizmente isso não
ocorreu. Achava que com a música iria agradar Nossa Senhora e assim facilitar
aquele meu difícil pedido.
Já em Fortaleza, por volta de
1962, quando morava perto da Igreja de Fátima, voltei a estudar acordeon com o
professor João Colares, hoje maestro. Ensinava em sua própria casa, na rua
Joaquim Távora, centro da cidade. Estudava uma temporada e parava outra, não
por malandragem, mas por dificuldades de transporte e problemas de saúde.
Quando voltava tinha que repetir o primeiro livro de novo. Não avancei o
esperado, creio. Mas serviu para que eu aprimorasse o conhecimento de leitura
musical.
Em 1963 ocorreu nossa mudança para
Messejana, um pequeno e maravilhoso distrito a oito quilômetros de Fortaleza,
de clima saudável, o que veio a constituir um marco importante em nossas vidas.
Nos trouxe muita sorte e felicidade, principalmente pelo meu pai ter realizado
um de seus sonhos, o de comprar uma casa própria em Fortaleza. Em princípio
voltei-me para a gandaia. Muitos colegas para brincar, jogar bola e malandrar.
Tudo o que faltava em São José dos Campos apareceu de repente. Aí eu passei uma
boa temporada, mais ou menos um ano, sem querer saber de música. Dava um
trabalho danado para a mamãe e só queria jogar futebol de salão, de campo,
tudo. Fui campeão de Futebol de Salão pelo Colégio Cearense em 1965, jogando
como goleiro e também como atacante. Mas em compensação fui reprovado no final
do ano em cinco matérias. É como aquela velha história: para jogar, um aço,
para estudar, um fracasso...
Com 14 anos
fui contaminado outra vez pela música. Depois das brincadeiras de dublagens,
quis aprender a tocar violão. Logo consegui adquirir um, de tamanho médio, mas
não sabia nem mesmo afiná-lo. Descobri que em nossa rua, a José Hipólito, morava o Zé da Senhora, que era um
jogador de futebol do Salgado da Gama, time de Messejana, que sabia tocar
violão e me ensinou a afinar e a tocar os primeiros acordes. Uma de suas
músicas prediletas era a Marcha dos Marinheiros. Nas primeiras semanas eu devo
ter perturbado muito o Zé da Senhora, porque quase todas as tardes passava na
casa dele para que conferisse a afinação do instrumento e tocasse alguma música.
Daí voltava para casa e tentava repetir tudo até aprender.
Perto do campo de futebol do
Salgado da Gama, em Messejana, moravam dois irmãos, que também tocavam a Marcha
dos Marinheiros e outras músicas muito bem. No violão, faziam batidas de bolero
e muitas outras que eu não conhecia, as que hoje em dia o pessoal acha super
brega. Não se negavam a ensinar o que sabiam. Por isso freqüentei diversas
vezes a casa desses rapazes e aprendi muito com eles, aos quais deixo
registrado o meu agradecimento.
Naquela época os meios para o
aprendizado musical em Fortaleza, particularmente em Messejana, praticamente
não existiam, nada se comparando aos que existem hoje em dia, com revistas de
músicas cifradas para violão, fitas de aula em vídeo e métodos para aprendizagem
de todo o tipo. Naquele tempo a gente tinha que aproveitar todas as chances
possíveis para aprender.
- A época das dublagens Em Messejana, entre os anos de 1964 e 1965, antes mesmo da idéia ou pretensão de formar um conjunto musical, eu e alguns de meus colegas de infância nos reuníamos em nossa casa, na garagem, para fazer dublagens. No grupo estavam sempre o José Wellington, o Luís, o Amaury, o Sérgio e outros meninos e meninas mais novos, que faziam parte da platéia. Nós colocávamos uns discos na radiola – quase sempre compactos do Elvis Presley - e começavam as dublagens. Tinha aplausos no final e tudo, como em um show de verdade. Foram realmente bons tempos.
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As serenatas em Messejana
Mais tarde, na adolescência, após
termos aprendido um pouco de violão e usado os conhecimentos de teclado do
acordeon para tocar escaleta, fizemos muitas serenatas em Messejana. A escolha
do repertório e o ensaio das músicas sempre foi o de mais importante.
As serenatas eram feitas com toda
a tranqüilidade, pois diferentemente de hoje em dia, praticamente não havia
perigo nas ruas e podíamos transitar até às altas horas da madrugada e voltar
para casa sem problemas. O roteiro das serenatas passava pelas casas das
paqueras, namoradas ou simplesmente de colegas. Na maioria das vezes tocávamos
na casa de quase todas as garotas de nossa turma.
Após o ensaio e a definição do
repertório a turma toda se deslocava pelas ruas conversando animadamente.
Quando nos aproximávamos de uma das casas escolhidas para a serenata havia o
momento silencioso da chegada, nem sempre tão silencioso como deveria ser, e um
certo temor de que o pai da garota acordasse e reclamasse. Depois, o início das
músicas e a espera do sinal, que consistia no acendimento de uma lâmpada
qualquer da casa, de preferência externa, para que notássemos que a serenata
tinha sido percebida. Tudo nos deixava muito ansiosos. Parecia existir uma
certa magia naquilo que fazíamos.
Em uma das serenatas feitas na
casa do Hugo Pompeu, que fica no lado oeste da lagoa de Messejana, quando
estávamos tocando e cantando aquela música que diz assim: - Vento que balança
as palhas do coqueiro... Um amigo nosso, chamado Luciano, se pendurou nas
palhas de um coqueiro anão para fazer uma real sonoplastia. Resultado: no meio
da música a palha quebrou e ele caiu no chão, fazendo um barulho danado. A cena
marcou o fim da serenata e o começo da “farra”. Daí por diante o
riso generalizou-se e a serenata não teve condições de prosseguir. Fomos embora
depressa, antes que houvesse alguma reclamação por parte dos donos da casa.
No início desse período de
serenatas, quando a maioria da turma tinha 15 anos, havia pureza total no que
se refere às bebidas e quaisquer outros envolvimentos perigosos para a nossa
idade. Drogas, nem pensar. Só mais tarde é que um ou outro fazia “uma
base”, como se chamava, tomando um pouco de cerveja, mas sem nenhum
exagero. Eu nunca gostei de bebidas e por isso mesmo ficava sem beber nada.
Tenho certeza de que fiz bem.
Tempos depois, profissionalmente
no Big Brasa, nunca tomava nada de bebidas alcoólicas. Este exemplo procurei
transmitir para meus filhos, no sentido de que, na minha opinião, o músico que
se preza tem que estar sempre sóbrio para melhor desempenhar sua função. Graças
a Deus nunca precisei de bebida alcoólica ou de nenhum outro tipo de
estimulante para tocar. Em funções no Big Brasa como guitarrista-solo,
especialmente nos temas onde havia muitos improvisos, sentia muitas vezes uma
sensação espetacular, indescritível, quando a própria música me elevava o espírito
de forma que eu não conseguia ver ninguém naqueles momentos, parecendo estar em
um mundo inteiramente novo e espetacular. Ou seja, a própria música me
embriagava. Isso ocorria por vezes também em razão do ambiente em que nos
apresentávamos, visto que alguns nos favoreciam com iluminação adequada, “luz
negra” ou outros efeitos especiais de palco que ajudavam a “fazer o
clima”. Em muitas oportunidades, completamente envolvido pela música,
cheguei a fazer improvisações na guitarra, das quais no dia seguinte não
conseguia lembrar quase nada.
- Como surgiu o apelido "Beiró"
Muita gente não sabe como surgiu o
apelido “Beiró”, através do qual fiquei conhecido no meio musical.
Foi assim: em Messejana, de 13 para 14 anos eu gostava demais de jogar bola.
Fizemos um campinho de futebol num terreno em frente à nossa casa e, depois que
chegava do Colégio Cearense, corria para lá e passava a tarde inteira no “racha”.
A mamãe, quando tinha que me chamar, à distância, gritava “João Ribeiroooooo”, estendendo a
terminação da palavra, de modo que o que se ouvia a distância era apenas o “beiroooooo”.
E assim, por brincadeira, um vizinho
nosso, o Pinha, começou a me chamar somente de “Beiró”, como soava
o chamamento de minha mãe. Daí o apelido pegou e fiquei conhecido assim. Na
foto ao lado estou posando como goleiro na rua José Hipólito, a “Estrada
do Fio” de antigamente (1964).
Se no meio musical sou conhecido
por Beiró, como radioamador, classe “A”, de prefixo PT7-JSN, meu
nome (ou QRA) é Silva Neto, por soar mais facilmente. “QRA”
significa o nome do operador, segundo o código internacional “Q”,
utilizado em transmissões via rádio.
Em Brasília e no serviço público
federal, no qual servi por muitos anos como Analista de Informações, ligado aos
órgãos de Inteligência do Ministério do Trabalho e da Presidência da República,
me chamavam de Silva Neto. No seio da família simplesmente de João Ribeiro. É
este o nome que realmente gosto de ser chamado. Pudera eu ter conhecido meu avô
João Ribeiro da Silva, homem bom, que desapareceu cedo, mas conseguiu deixar
lembranças fortíssimas em toda a família, as quais perduram até hoje.
A IDEIA DA FORMAÇÃO DO CONJUNTO BIG BRASA
-
O “Quartel General” da Rua José Hipólito
A idéia de formar um conjunto surgiu
em conversa com os colegas de Messejana. A partir daí, com o total apoio de
meus pais, foi como uma bola de neve. A vontade e o entusiasmo pela música
cresceram rapidamente.
O embrião do conjunto musical Big
Brasa foi em nossa casa, na rua José Hipólito, 698, em Messejana. Durante toda
a existência do grupo e de minha vida musical a sede sempre foi a mesma. O
local onde foi realizado o primeiro ensaio do grupo, foi por algum tempo meu
quarto, que dividia com o Carló. Tinha as paredes todas pintadas, com desenhos
coloridos, feitos com tinta a óleo. Nele desenhávamos de tudo. Guitarras,
pistas de corrida e até mesmo o famoso personagem “Amigo da Onça”,
este feito pelo Carló. Até um dia desses, em uma das reformas que fiz em nossa
casa, vimos as marcas das pinturas que ainda estão lá, agora encobertas por um
tipo de revestimento. Aquele ambiente era nosso mundo. O violão sempre ficava
disponível, em cima de uma cama ou cadeira, para facilitar o seu rápido acesso.
Tudo o que era de equipamento nós montávamos empilhados, de modo a formar uma “parede
de som”. Sem intenção, nós projetávamos o que iria acontecer em um futuro
breve.
Alberto Ribeiro da Silva, meu pai.
O Mestre Alberto, como alguns o chamam até hoje, teve presença marcante no Big
Brasa.
Apreciador fanático da boa música,
independente do estilo, mesmo sem conhecimentos teóricos sobre o assunto sempre
demonstrou ter bom ouvido, pois como ele próprio diz, sabia quando “alguma
coisa estava errada”. Acompanhou o Big Brasa por uns três anos. Nas
festas ele ficava circulando, ouvindo o som do conjunto dos diferentes pontos
do clube para nos informar se estava bom ou não. Volta e meia trazia elogios
recebidos ou reclamações (quase sempre de diretores ou dos coroas) sobre o alto
volume de som do grupo. Cuidava dos contratos e de receber e distribuir os
cachês para o grupo, na base de 10 por cento do líquido para cada participante.
Exerceu fundamental papel, também,
como orientador do conjunto, uma espécie de guru.
Apesar de ser um ardoroso apreciador da música, ele sempre nos alertava para o fato de que o conjunto poderia “não dar camisa a ninguém”, querendo dizer que deveríamos estudar e ter uma outra profissão, tendo em vista as dificuldades que os músicos encontram, via de regra, para sobreviver apenas da música, de modo especial numa região pobre como a Nordeste. Vale a pena destacar os artigos A VOLTA DOS ANOS 60 COM BEATLES E ROLLING STONES, publicado no Jornal Tribuna do Ceará, em 08 de julho de 1988, que menciona aspectos do Mestre Alberto e o Conjunto Big Brasa.
OS EQUIPAMENTOS E AS
DIFICULDADES DA ÉPOCA
Nossas primeiras guitarras foram
adquiridas do conjunto “Os Rataplans”, dos meus amigos César
Barreto e seu irmão Antônio Carlos Barreto Filho, o Barretinho, que
infelizmente nos deixou há algum tempo. Eles tocavam com guitarras de
fabricação caseira. Instrumentos bem construídos, leves, e que deveríamos ter
mantido até hoje como verdadeiras relíquias musicais. Como “Os Rataplans”
estava em vias de renovar seu instrumental, adquirimos dele duas guitarras e um
contrabaixo.
Com esses instrumentos fizemos
nossa grande estréia, no Balneário Clube de Messejana, e na minha primeira
guitarra por muitas vezes toquei o prefixo do Big Brasa, “And I Love Her”,
dos Beatles. A renovação de nosso equipamento transcorreu de forma gradual e
contínua, nos anos seguintes, de acordo com nossas possibilidades financeiras e
com o progressivo aumento do número de contratos.
Sobre essa pequena guitarra vale
mencionar que poucos dias antes de nossa primeira apresentação o César Barreto
esteve em nossa casa e me ensinou a introdução da música “O Tijolinho”,
na tonalidade de Lá Maior. Eu ficava simplesmente fascinado com o som que ele
conseguia “tirar” e pela facilidade que tocava a guitarra, parecia
brincadeira. Para o César aquilo era a coisa mais simples do mundo, porque
tinha prática e estava bem acostumado com o instrumento. Olhando para ele, eu
pensava: “puxa, será que vou conseguir tocar desse jeito algum dia?”.
O César e todos os seus companheiros de
conjunto, o Barretinho (guitarra e vocal), o Camelo (baterista) e o Adilson
(contrabaixista) sempre deram a maior força para nós.
Para aqueles que são leigos ou não têm muita percepção musical, a
falta de um contrabaixo em um conjunto é mais ou menos como a falta de um
goleiro em um time de futebol, para ser “sutil” na comparação. Ou a mesma coisa que sentir-se
inteiramente nu, em plena Praça do Ferreira, no meio de uma multidão. O negócio
é “brabo”. Quando a gente está tocando uma música, e o contrabaixo,
por algum motivo, pára de funcionar ou deixa de tocar algumas notas, sente-se
um vácuo, um vazio, uma sensação estranhíssima. Quando ele volta é uma beleza,
o sangue retorna, a música fica mais harmoniosa, enfim, tudo vai bem. O
contrabaixista tem que ser um cara ligado. Não pode faltar nem por poucos
instantes.
No início dos chamados Anos Dourados, nós do Big Brasa, em Fortaleza,
particularmente pela falta de equipamentos e informações musicais diversas,
tocávamos sem contrabaixo. Acostumados que estávamos a cantar com o
acompanhamento de violão ou violões, a substituição pelas guitarras foi aceita
com todo o entusiasmo e não se notava muito a falta de um contrabaixo pelo
próprio desconhecimento de sua necessidade, conforme foi dito.
Ainda bem que foi por pouco tempo. Depois que se acostuma pelo menos
por uma vez a tocar com a marcação e com a harmonia proporcionadas pelo
contrabaixo não se consegue mais retornar à situação anterior.
A entrada do contrabaixo no Big Brasa foi incentivada pelo “quase irmão” e grande amigo, o saudoso Barretinho,
irmão do César Barreto. Excelente músico, saxofonista, guitarrista e vocalista
dos “Rataplans”. Ele insistiu com o meu pai, dizendo que o
contrabaixo era a alma de um conjunto e que não se podia tocar sem ele. Daí
para a frente a coisa mudou - e para bem melhor!
Vale dizer que nas próprias gravações iniciais dos anos 60, o
contrabaixo não era destacado como merece. Ouvia-se seu som e sua marcação, mas
os destaques e maior presença do instrumento nos arranjos musicais veio mais
tarde. Hoje a gente percebe que as músicas que caracterizaram a Jovem Guarda,
gravadas na época do iê-iê-iê, (música “pop”, como também era
designada na época), por exemplo, têm aquele sonzinho de lata, meio “fajuto”,
se comparado à qualidade que se possui na atualidade.
-
Instrumentos e acessórios musicais
No início do Big Brasa tudo era
muito difícil em Fortaleza. Não havia nenhuma loja especializada em
instrumentos musicais. Algumas possuíam seções com poucos instrumentos ou
acessórios. A diversificação dos produtos oferecidos era mínima. Por exemplo,
quando se encontrava um tipo de encordoamento ou mesmo simplesmente “palhetas”
para violão em determinado lugar você já poderia se dar por satisfeito.
Havia, no entanto, a casa do Sr.
Aurélio (avô do saxofonista Zezinho), no Benfica, onde podíamos encontrar peles
diversas para bateria, palhetas para guitarra (isso mesmo!) palheta era coisa
difícil para caramba. Também baquetas e outros acessórios, como cordas para
guitarra e contrabaixo. Esses acessórios somente podiam ser encontrados lá.
Hoje em dia a casa ainda vende esses materiais, dirigida pelas sobrinhas e
outros familiares do Sr. Aurélio, já falecido. Esse senhor, nós descobrimos que
nasceu parece que em Riachão, mesma terra de minha mãe. Um dia desses,
recentemente, estive por lá para comprar um encordoamento de nylon, à noite.
Uma das senhoras me reconheceu prontamente. Muita memória, depois de
aproximadamente 25 anos. Mas disse que estava um pouco mudado, mais gordo etc.
Imagine ela... Mas é assim mesmo, quando se passa bastante tempo sem ver
alguém, imaginamos que a pessoa permanece tal como está armazenada em nossa
memória, com os traços intactos. Mas o tempo vai nos pregando surpresas.
Em outra oportunidade encontrei,
em uma feira de informática, com um guitarrista, chamado Evaldo, que tocava em
um conjunto do Bairro de Fátima. Ao me ver, ele disse, muito admirado:
- Puxa, cara, você não mudou nada,
não tem nenhum cabelo branco, o que é que você tem feito?
O Evaldo é apenas um pouco mais
velho do que eu e já estava com a cabeça
toda branca. Um dos segredos, acho eu, é aprender a encarar com tranqüilidade a
ação do tempo e sempre avaliar cada situação de acordo com nosso potencial do
momento.
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Os amplificadores e as caixas de som
As caixas
de som, como chamávamos, no início eram pequenas e integradas aos
amplificadores. Tínhamos no Big Brasa amplificadores de 6, 8 e 10 Watts, com as
caixas de som, com mais ou menos 70 a 80 centímetros de altura, coisas
simplesmente ridículas se comparadas ao que existe hoje em dia em matéria de
equipamentos musicais. Tanto que pouco aparecem nas fotografias, escondidas
atrás dos músicos. Imaginem só: duas guitarras ligadas a um amplificador de 6
Watts, com um alto-falante de 6 ou 8 polegadas. Que sonzão!
Com o
aumento da potência e da qualidade dos equipamentos, nos anos seguintes os
amplificadores começaram a ser produzidos em módulos, separadamente das caixas
de som. Abaixo seguem-se comentários sobre alguns desses equipamentos, para que
vocês tenham uma idéia mais precisa do material que nós trabalhamos.
Um dos primeiros equipamentos
utilizados pelo Big Brasa para o som de voz foi o amplificador Delta. Tinha o gabinete parecido com os rádios transmissores e
receptores da mesma marca. Aquecia demais e precisava funcionar com a tampa
aberta, para receber mais ventilação. Em uma das funções do Big Brasa, o “bicho”
estava dando problema. O papai, cheio de boa vontade, foi se meter a técnico e,
inocentemente, meteu a mão dentro do Delta para apertar uma válvula de saída de
áudio, daquelas tipo chupeta. Queimou
a ponta do dedo, logicamente. Além do susto, o choque também não deve ter sido
pequeno. Ainda vai, Mestre Alberto?
O superaquecimento dos
amplificadores foi um problema seríssimo para o conjunto. Eles ficavam “mesmo
que fogo” e exatamente por isso apresentavam defeito com maior facilidade
do que os atuais, queimando ou danificando filamentos de válvulas. Um dos
macetes que descobrimos foi o de não transportar o equipamento logo após de
desligá-los. Os bigus esperavam um pouco, tempo suficiente para que as válvulas
esfriassem e pudessem ser movimentadas sem pifar. Mais tarde, o papai
apresentou uma idéia muito legal para a solução do problema, imediatamente
adotada. Foi a de comprar pequenos ventiladores, os quais, sobre uma chapa de
sustentação colocada embaixo dos amplificadores, passavam o tempo todos
ligados, não deixando o superaquecimento chegar. Os prejuízos decorrentes de
equipamentos quebrados por esse problema diminuíram depois desta simples, mas
excelente idéia.
Após esse amplificador Delta,
surgiu mais um avanço: o serviço de som Gianinni, modelo A-100, valvulado,
composto de dois módulos, em um “rack”, com suas colunas de som e
os seus respectivos suportes laterais. Na parte de cima do “rack”
ficava instalado o misturador, para seis microfones, e na parte de baixo, o
amplificador de potência. Naquele época, era um dos melhores. Comparando-se ao
que existe hoje é como se estivéssemos utilizando uma mesa de som estéreo, com “tudo
que tem direito” e muita qualidade e potência de som. Cada aquisição de
equipamento causava intensa satisfação para todos, como esse serviço de som
A-100, comprado na Mesbla.
Num dos carnavais que tocamos em Cascavel descobrimos que o som
estava baixando (oscilando) muito por causa de uma válvula que estava frouxa em
seu suporte. Quente para caramba, mas o Marcílio, que foi o cantor daquela
jornada momina, de vez em quando ficava apertando a tal válvula para que o som
melhorasse. Ele lembra e ri muito desse lance até hoje. No ano seguinte surgiram
outros modelos, o A-200 e o A-300, um pouco melhores e mais potentes.
Pouco a pouco, com o avanço
tecnológico, novas marcas e modelos de amplificadores apareceram no mercado.
Fomos renovando nosso equipamento, pouco a pouco. Surgiram os amplificadores “Tremendão”,
da Gianinni, com potência de 100 Watts de saída, para guitarras, órgãos
eletrônicos, voz e contrabaixo. Essas “caixas” permaneceram
bastante tempo no mercado e tinham uma saída incrível. Todo mundo desejava ter
um amplificador “Tremendão”. O amplificador tinha quatro válvulas de saída de áudio tipo “6L6”,
que produziam uma sonoridade aveludada, um som mais puro. Para as caixas de
contrabaixo usávamos as válvulas “EL-34”, que se encaixavam nos
mesmos soquetes (encaixes para válvulas) mas que tinham um som mais agressivo e
duro, bem apropriado ao instrumento. Essas máquinas resistiam bem à rotina de
ensaios e funções variadas, com transportes para lá e para cá toda hora.
Outra novidade que os
amplificadores Tremendão trouxeram foi o Reverber. Consistia em um circuito
ligado a um módulo que ficava dentro do amplificador, numa caixa metálica com
duas molas e pequenas bobinas, que pelo circuito eletrônico produziam reverberação no som. O reverber enriquecia a qualidade
de áudio nos solos e também em marcações feitas pelas guitarras. Depois de
acostumados a ele, parece que incorporávamos sua sonoridade. A reverberação por
ele produzida podia ser controlada através de botões específicos, no
amplificador. Quando apresentava algum defeito, aí complicava. Era a
desvantagem: quando um fiozinho desligava lá por dentro, em especial do
compartimento metálico de molas e minúsculos transformadores, disparava uma
microfonia (aquele apito bem alto, que incomoda bastante) para valer. E aí o
Reverber tinha que ser desligado imediatamente, pois a microfonia tornava-se
insuportável. Não posso falar de reverber sem mencionar a música “O
Milionário”, que sem esse recurso era quase impraticável de ser
executada. Em algumas festas, quando essa música estava “na parada”,
cheguei a tocá-la inúmeras vezes.
-
O amplificador True Reverber (Gianinni)
Esse amplificador possuía muita
potência. Nos causou espanto pela primeira vez que tivemos que abri-lo, para
substituir um alto-falante que estava com problemas. Tentamos abrir a caixa da
forma convencional e conseguimos ver os alto-falantes. Depois de alguns minutos
alguém notou uma abertura dentro da caixa, e ao olharmos para cima logo os
encontramos, mas em posição não convencional, ou seja, virados para baixo. A
arquitetura sonora era diferente das demais, que tinham os alto-falantes parafusados
na parte frontal da caixa de som.
Havia uma preocupação e a
necessidade de trocar de equipamentos com relativa freqüência, em razão da
concorrência. Por isso mesmo é que a maioria dos conjuntos não agüentava a
barra e ia à falência cedo. Por outro lado, para economizar também fazíamos
reformas nos equipamentos, como troca de cobertura de napa, cantoneiras,
pintura de suportes e outras. Cansei de passar noites quase inteiras, madrugada
adentro, retirando coberturas de napa dos amplificadores e das caixas de som e
recobrindo-os com novo material. Dava um trabalho lascado. Puxa aqui, estira
dali e pronto. Amplificadores e caixas novos de novo! Volta e meia ficava um
canto mal feito mas tudo bem, não dava para ninguém notar e a economia tinha
sido feita...
Desse modo o esforço estava
plenamente recompensado pelo prazer de nos apresentar com um instrumental
novinho, bonito, e com um som legal.
-
Os consertos de emergência e as
improvisações
Muitas vezes tínhamos que fazer consertos
de emergência nos amplificadores, na Capital ou no interior do Estado, quase
sempre com pouco ou nenhum material específico. As válvulas de saída de áudio
eram a “EL-34” e a “6L6”, que tinha um som melhor. Num
desses dias, em Pacoti, foi feita uma solda em um fio da bobina de um reverber,
com um ferro de soldar enorme, aquecido por uma forja. Vejam a “sutileza”
dessa soldagem.
Em outra oportunidade o Carló
desmontou um amplificador de contrabaixo, durante um baile, conseguiu localizar
o defeito e trocar um resistor (componente eletrônico), tendo o equipamento
voltado a seu funcionamento normal depois daquela rápida intervenção. Mas a
verdade é que muitas vezes não conseguimos nos sair tão bem. Em algumas
oportunidades os amplificadores pifaram mesmo, para valer, e não teve jeito.
Nós sabíamos, mais ou menos, quando o defeito era sério, pela experiência. E
também o bom senso para decidir se daria ou não tempo para consertá-lo na hora,
coisa muito difícil, por inúmeras razões: falta de peças ou componentes
eletrônicos, falta de meios técnicos apropriados, de material e de tempo para o
reparo. Em virtude disso, houve períodos que o Big Brasa sempre andava com um
amplificador de reserva, para qualquer emergência.
-
Os cabos e as extensões, sempre problemáticos
Tenho que
falar dos cabos. Cabos e mais cabos “coaxiais”, para ligações dos
diversos instrumentos (guitarras, contrabaixo, microfones e teclados) aos
amplificadores e as extensões elétricas. Não podia confiar neles, nem em seus “plugs”
ou conectores. Mesmo quando não apresentavam defeito durante as apresentações,
quando alguém neles pisava, ou simplesmente suas ligações se rompiam com nossos
movimentos, no dia seguinte eu ia examinar um por um. Isso porque na hora de
dobrá-los, ao fim dos bailes, poderia
dar problema e alguma ligação se romper. Pegava logo o ferro de soldar, solda,
alicate de corte, sentava-me no chão ou em algum banquinho e começava a
revisão. Meu filho Alberto Neto, ainda criança, invariavelmente ficava me “ajudando”
nessas manutenções.
-
A famosa “mala-da-cobra”
Em geral, todo técnico que se
preza e também os conjuntos musicais têm uma “mala da cobra”.
Chamávamos de “mala-da-cobra” toda caixa, bolsa ou qualquer outro
tipo de depósito para transportar os cabos, as extensões e outras miudezas
necessárias ao funcionamento do conjunto, tipo “plugs” diversos,
conectores, tomadas, fita isolante, parafusos extras e tudo aquilo que se
imagina que poderá quebrar numa apresentação. A tal mala deveria conter ainda
ferramentas de primeira necessidade, para as emergências.
Esse nome “mala-da-cobra”
se justificou muito bem quando, em uma ocasião, o conjunto tinha acabado de
tocar em um clube de Sobral e ao final da festa fomos guardar as tumbadoras em
seus estojos de proteção. Dentro deles foi encontrada uma cobra. Que susto. A
cobra, certamente se encantou com o som do Big Brasa e com o calor dos
estojos.
Toda
azul, com as partes metálicas de cor cinza metálico, foi adquirida da charanga
do Gumercindo, líder da torcida do Fortaleza Futebol Clube. Lembro como se
fosse hoje da alegria que todos sentimos quando chegamos em casa, após meu pai
ter concretizado o negócio. No primeiro mês de utilização ela sofreu uma
avaria. Quebrou um suporte. Só para vocês terem uma idéia, para que o bombo se
sustentasse em pé era preciso colocar um transformador velho de lado para
servir de apoio... Assim mesmo velha, recebeu logo uma pintura nova e nos
prestou inestimáveis serviços. Possuía boa sonoridade.
- A bateria “Pinguim”
Em
madrepérola branca, de marca Pingüim, uma das melhores no momento, era de
excelente qualidade e muito bonita. Foi comprada em São Paulo. A mamãe na época
negociava bordados com minha Tia Zenóbia, que residia em São José dos Campos.
Aproveitando uma das transferências de dinheiro que receberia dessas vendas,
pediu ao tio João que fizesse a compra de uma bateria novinha em folha. Quando
este instrumento chegou foi motivo de admiração por todos nós. A bateria depois
de montada ficou linda. O meu pai, na preocupação de preservá-la em bom estado,
mandou logo fazer uns estojos para todos os seus apetrechos. Por essa excelente
providência é que essa bateria teve longa duração, sempre bem conservada e em
ordem.
-
A distorção caseira
Sempre
gostei de eletrônica, montagem de “kits” de alarmes sonoros,
sirenes para discoteca, compressores de áudio e outros circuitos eletrônicos.
Ainda em São José dos Campos, quando criança, gostava demais de brincar com
tudo aquilo que tinha eletrônica. Montava e desmontava lanternas, pequenos
circuitos para acender foquitos de lanterna, com instalações feitas na parte de
baixo de mesas e camas. Mexia e fuçava em brinquedos eletrônicos, sempre que
podia. A eletrônica e tecnologia moderna sempre me fascinaram.
Com
14 anos, fiz por correspondência um curso de rádio e televisão pelo Instituto
Universal Brasileiro. Consegui aprender um bocado de coisas e montei um rádio,
sob a orientação e com todos os componentes fornecidos pelo Instituto, como
parte do treinamento. De vez em quando estava eu gostava de pesquisar as
novidades, na Rua Pedro Pereira, local onde se encontra em Fortaleza o maior
número de lojas de produtos eletrônicos. Conhecia todas as lojas e muitos
vendedores, e como bom cliente, principalmente durante a existência do Big
Brasa, obtinha bons descontos em todas as compras.
Essa
relativa habilidade que tenho para eletrônica me ajudou muito durante toda a
minha vida, desde criança, passando pela juventude, no Big Brasa, mais tarde no
campo do radioamadorismo e até hoje em dia, com a Informática. A prática e a
iniciativa incentivam o processo de criatividade e vice-versa. Digo isso para
demonstrar como é que foi o lance da primeira distorção do Big Brasa e de
Fortaleza. Para que os mais novos tomem conhecimento, ocorreu uma verdadeira
pesquisa, coroada de êxito. Foi assim.
Ao
ouvir umas gravações, a fim de escolher músicas para nosso repertório, notava
alguns sons de guitarras super pesados, mas não sabia como é que os caras
conseguiam aquilo. Vendo um filme musical e lendo um pouco sobre conjuntos,
soube que existia um “aparelho”, que conectado à guitarra, produzia
aquele som rachado e distorcido. Esse tal aparelho era a distorção. Fiquei
louco de vontade de conseguir um som daquele tipo e comecei a falar com todo
mundo que eu achasse que poderia ter uma idéia. Escrevi uma carta para o tio
João e, depois que ele fez sua pesquisa em São Paulo, não conseguiu descobrir
nada. Na verdade eu nem sabia o nome do aparelho direito, muito menos ele, que
leigo em música, não deveria saber ou entender do tal som que eu procurava.
Pois olhem, aí vai a dica: quando desejarem alguma coisa, finquem o pé e
batalhem, lutem e tomem iniciativas, que certamente serão bem recompensados.
Continuei procurando o tal aparelhinho - e sem nada conseguir.
Um
belo dia, em minhas conversas com os colegas, disse para o Júlio Matos, o
Julinho, que estava querendo comprar uma distorção mas não sabia onde. Para meu
espanto ele me falou que tinha uma revista de eletrônica com um “esquema”,
ou seja, o diagrama de montagem de uma distorção. Foi demais! O bom é que o
Julinho gostava do assunto e sempre foi um técnico muito competente e
pesquisador. Além disso, ele ficou interessadíssimo e disse que poderia tentar
montar a tal “distorção”. Compramos todos os componentes
necessários para a montagem e depois de poucos dias estava ele, o Julinho,
chegando lá em casa com uma caixinha de metal, tirada de alguma sucata, que
deveria ter sido de alguma outra montagem ou experiência anterior. Com muito
cuidado, localizamos quais os locais de entrada e de saída de som, para que a
guitarra fosse conectada ao aparelho, e este ao amplificador. Fizemos os cabos
necessários, todas as devidas soldas, “plugs” e pronto.
Preparamo-nos para o resultado. Acreditem: neste momento mais parecíamos dois
soldados tentando desarmar uma mina, na expectativa de uma explosão, tal era
nosso grau de ansiedade. Suspense total. Após ligar tudo, peguei a guitarra e
toquei algumas notas. De início, nenhuma alteração e ficamos naquela, os dois
meio sem jeito, sem olhar um para o outro. Fui tocando mais um pouco e mexendo
nos dois potenciômetros (botões de regulagem e outras funções) que o
aparelhinho possuía. De repente, o som ficou mais forte e pesado, começando a
distorcer. Nessa hora, eu comecei a rir muito e a dizer:
-
É isso aí, olha cara, esse é o som que estava querendo, deu certo!
O
Julinho estava incrédulo, visto que ele próprio não sabia que som ou efeito sua
montagem seria capaz de produzir.
-
O primeiro pedal tipo “wah-wah” de Fortaleza
O
conjunto sempre procurou criar um diferencial, fazer inovações. Por exemplo, o
Big Brasa foi o primeiro conjunto de Fortaleza a usar o pedal conhecido como “wah-wah”.
Eu tinha visto esse tipo de pedal em um filme e apreciei muito os efeitos que
produzia. Expliquei como funcionava e para que servia e o tio João se
encarregou de fazer a aquisição para nós, em São Paulo.
Inauguramos
o “wah-wah” durante todo o Festival Nordestino da Música Popular,
realizado no Náutico Atlético Cearense, que teve como vencedora a música
Beira-Mar, do Ednardo, acompanhado pelo Big Brasa. Ligado à guitarra-solo
produzia sons diferentes e foi motivo de admiração. Algumas pessoas chegavam a
ficar com a boca fazendo o movimento correspondente ao “wah-wah”.
Ao
longo de minha carreira como guitarrista-solo usei várias marcas de pedais
desse tipo. Sua característica, para quem é leigo ou não conhece esse pedal de
efeito, é a de possibilitar a que o músico alterne rapidamente, através de
movimento com o pé, um som agudo para um grave ou vice-versa, produzindo
efeitos espetaculares. Daí o nome desse pedal ser “wah-wah”.
Em
uma de nossas idas a Parnaíba, um músico local me fez uma proposta vantajosa
para comprar meu “wah-wah”. A quantia que ele oferecia daria para
eu comprar dois pedais novos. Animado, concretizei o “grande negócio”.
E “dancei”, porque ao chegar a Fortaleza e manter ligações com o
tio João, descobri que aquele pedal não era mais fabricado e tive que optar por
uma marca pior, quase com o mesmo custo.
-
A minha guitarra “Supersonic”
Tive umas
quatro ou cinco guitarras durante a existência do Big Brasa. Cuidava muito bem
delas, como até hoje tenho zelo por tudo que possuo. O músico que se preza tem
que tratar bem seu instrumento, conservando-o sempre da melhor maneira
possível. Uma dessas guitarras, a que mais gostava, chegando mesmo a “conversar”
com ela às vezes, foi uma “Supersonic”, fabricada pela Gianinni. No
princípio eu a usei por algum tempo sem modificação nenhuma. Essa guitarra possuía uma característica
importante para um solista. Com ela eu conseguia utilizar a alavanca diversas
vezes sem que ela perdesse a afinação (para quem é músico fica fácil entender).
Nos improvisos em rocks e blues coisa fundamental. Mesmo assim, um
dia resolvi dar uma melhorada nela, em suas formas e em seu som. Desmontei-a
por inteiro, inclusive seus componentes eletrônicos, como os três captadores de
som, sistema de alavanca, molas, cavalete, braço e tudo. Ao final estava
completamente desmontada. Eu olhava para as peças e pensava: será que vai dar
certo? Com uma pequena serra e depois lixas, cortei um pouco suas formas de
modo a que ficasse parecida com uma “Gibson”, uma das melhores
marcas do mundo. Depois começou a parte dos acabamentos. Apliquei massa como se
faz numa pintura de automóvel, no sentido de laqueá-la. Adquiri um novo
conjunto de captadores e escolhi um deles em substituição a um dos originais,
por ter uma sonoridade bem interessante. Andei mexendo um pouquinho nos
pequenos circuitos dos controles de graves e agudos, acrescentando ou
modificando, na base da experimentação mesmo, alguns capacitores (componentes
eletrônicos que, dependendo de onde são usados, alteram o som). A pintura, de
branco, foi à pistola, com um cuidado todo especial. Ficou muito legal, parecendo
até mesmo “de fábrica”. Passei então à fase crítica da montagem,
para que ficasse afinando normalmente e conseguindo as “oitavas”
numa boa. Com um encordoamento “zerado”, não lembro a marca,
comecei a testar a “nova” guitarra. Deu certo! Estava com uma verdadeira
“Gibson”, home-made, que
me serviu por muito tempo e que até hoje me traz ótimas recordações.
-
O primeiro órgão eletrônico
A
aquisição do primeiro órgão eletrônico - um Diatron - foi feita pelo meu pai,
na Mesbla, através de um cartão de crédito, cujas prestações foram inúmeras e
difíceis para serem quitadas. Lembro-me que ele reclamava bastante no final do
mês, quando ao pagar a prestação a dívida pouco diminuía.
Com
a presença do órgão o Big Brasa evoluiu muito, tendo em vista o aumento das possibilidades
de arranjos, combinação das sonoridades, marcação rítmica e base harmônica mais
completa, além dos próprios solos do instrumento. Esse Novatron não tinha
muitos recursos, se comparado aos equipamentos modernos: vibrato e alguns
timbres diferentes, com os controles de graves, agudos e volume, este feito
através de um pedal que volta e meia apresentava defeito - quase sempre em seu
cabo de ligação.
No
segundo órgão, que a fábrica chamou de Novatron, algumas novidades, mas a mesma
essência. Nesse segundo equipamento é que houve a decepção, por parte do Mestre
Alberto, quando encontrou o órgão, em um final de festa, com as laterais do teclado e uma das teclas
queimadas por um cigarro, por simples desleixo do organista. Ele fala nisso até
hoje. Na verdade um músico que se preza e que compra seu instrumento com
dificuldade, pelo menos em princípio deveria ter muito cuidado e zelo com ele.
Posteriormente,
nos teclados que o Big Brasa usou, pudemos inovar bastante. Na época em que
passei a tocar teclados, quando tive que substituir o Adalberto, adquiri três
pedais (sustainner, phaser e flanger), os quais interligados ao órgão produziam
sons bem diferentes dos usuais, despertando muita atenção por seus efeitos
sonoros.
Além
de órgãos eletrônicos utilizei diversos outros teclados, a exemplo de um
sintetizador monofônico (para os que não leigos, que tocava uma nota de cada
vez, não produzindo acordes). Pouco tempo depois fui à São Paulo e adquiri um
sintetizador polifônico, mais moderno. Custou uma grana violenta. Com ele a
parte harmônica podia funcionar, visto que os acordes soavam normalmente.
Entretanto a dificuldade para programar os diferentes sons e efeitos era muito
grande. Perdia muito tempo e tinha que ser mais operador do que músico. Não
satisfeito com esse equipamento, troquei-o em Fortaleza por um órgão eletrônico
de dois teclados e comprei um outro sintetizador, o Poly-800. Com o Poly-800 a
gente tirava sons e efeitos incríveis. Daí por diante chegou a fase dos sintetizadores
mais “pesados”, tipo DX-7, da Yamaha.
O
primeiro modelo DX7 era excelente, em seus diversos aspectos. Com sua qualidade
de som espetacular, o equipamento pesava aproximadamente oito quilos e possuía
um teclado de cinco oitavas, muito macio. Possibilitava ao músico nele
programar, ou seja, criar seus próprios sons e timbres à vontade e
armazená-los em sua memória. O DX7 já
vinha com um cartucho com uma infinidade de sons programados, além daqueles
previamente gravados de fábrica. Adquiri depois outros cartuchos RAM, aqueles
nos quais se pode gravar, e assim pude gravar meus sons, timbres e combinações
de sons prediletos para utilizá-los em outro DX7, se necessário, levando apenas
os cartuchos previamente gravados.
Mais
tarde consegui adquirir também um teclado Roland, modelo E-20, de excelente
qualidade. Com esse instrumento, eu e o Airton França formamos uma dupla muito
legal. Ele com um violão Ovation, de sonoridade ótima, cantando (muito bem, por
sinal) e até mesmo tocando piston, e eu fazendo alguma parte de vocalização e
tocando órgão e sintetizador. Na fase dos órgãos eletrônicos modernos, cheguei
a utilizar alguns desses teclados que “fazem tudo”, com bateria,
baixo, harmonia e efeitos para solo de diversos tipos. Chamados também de “desempregadores”
de músicos, visto que um tecladista com um desses equipamentos pode substituir
um conjunto inteiro, dependendo do ambiente que esteja trabalhando.
Associado
a esses órgãos eletrônicos cada vez mais perfeitos, hoje em dia mantenho ainda
um sintetizador DX7 - II, da Yamaha, que possibilita centenas de possibilidades
de programação, enfim, um instrumento utilizado pelos melhores grupos não só do
Brasil mas do mundo inteiro. Com esse DX7, utilizo também um teclado Roland, de
sonoridade excelente.
Meus
filhos, Alberto Neto e Cristiane, desde pequenos demonstraram uma grande
afinidade pela música. “Filho de peixe, peixinho é”, diz o ditado,
pois mesmo quando crianças sempre gostavam de tocar em instrumentos musicais de
brinquedo. Em nossa casa, para não “perder a forma”, ainda hoje
mantemos uma pequena sala de música, com teclados, guitarra, pedais,
microfones, amplificadores, caixas de som, estante, partituras e outros
acessórios, onde todos nós somos freqüentadores. De vez em quando estamos por
lá para “tirar um som”.
O ESTILO DE REPERTÓRIO O
Conjunto Big Brasa sempre teve um repertório variado, que atendesse à maioria.
Tocava músicas de muitos estilos, sendo preferencialmente um conjunto de
iê-iê-iê, ritmo quente no movimento que constituiu a Jovem Guarda. Mas quando
tocávamos no interior, tínhamos que estar preparados para tocar de tudo. Xotes,
forrós, sambas, boleros, mambos e valsas. O que desse e viesse ...
A
responsabilidade pela seqüência das músicas a serem tocadas era minha, assim
como a de avisar a todos os músicos no palco qual seria a música seguinte. Uma
preocupação a mais, além de tocar o próprio instrumento. Com a prática,
sabíamos mais ou menos a ordem como as músicas deveriam ir sendo tocadas. A
gente estabelecia, para facilitar, sinais ou gestos que representavam uma
determinada música ou uma seqüência previamente ensaiada. Nesses roteiros,
muitas músicas não figuravam com seus nomes corretos. E outras vezes nem
chegávamos a saber o nome real da música, sendo muito fácil a gente encontrar
em um repertório, músicas como “Rapado em Fá”, “Rita Lee nova”,
“Tema Seis”, dentre outras denominações. Portanto, eu procurava
organizar o repertório de uma forma que as músicas iniciais fossem leves. E
seguia depois, gradativamente, até a uma grande animação, que poderia ser
obtida tanto com rocks, sambas ou
forrós. No meio dos bailes, tocávamos músicas lentas por um bom tempo, para o descanso
geral e para a dança colada, a verdadeira hora do “amasso”. Depois
o conjunto chegava a “temperatura máxima” de novo, para fazer um
intervalo, de trinta minutos, com a festa no auge. Após a pausa, entrávamos
quase sempre como no começo e terminávamos o baile com todas as músicas mais
animadas do repertório, para fechar “com chave de ouro”. Isso tudo
dependia muito do local e do público onde estávamos nos apresentando. A
seqüência do repertório, na realidade, não era rígida. Essa flexibilidade
significava quebrar a ordem determinada pelo roteiro para atender a um pedido
ou solicitação de alguém, desde que a mudança não atrapalhasse o ritmo da
festa. Quem tinha essa função, não estava livre de erros. Uma escolha de música,
feita de modo errado, podia esvaziar o salão repentinamente.
Guardei
até hoje muitos roteiros usados pelo Big Brasa em seu repertório. Quem
participou do conjunto deverá lembrar, com certeza, de algumas das seguintes
músicas, as quais estão transcritas como foram grafadas na época e em ordem
alfabética:
A Candinha - A Distância - A Little Bit Me - Além de
Tudo - All My Love For You - Assim falou Zaratustra - Baiana - Be My Lover - Beautiful You - Because I Love You
-
A inclusão de músicas antigas no repertório
Outra
novidade que apresentávamos desde o início do conjunto, por sugestão de meu
pai, foi a inclusão de músicas antigas com ritmos e arranjos modernos. “Peguei
um Ita no Norte” iniciava uma das seqüências. O pessoal do conjunto não
vibrava muito com isso, mas na verdade causou grande sucesso. Essa fórmula
posteriormente foi - e ainda está sendo até hoje - utilizada por inúmeros artistas,
cantores e grupos musicais.
-
Idéia excelente, dificuldade para a execução
O Mestre
Alberto tentou inovar mais uma vez, através da idéia de apresentar “slides”
com o título de cada música do repertório, que seriam projetados no palco durante as festas. Desse
modo o público ficaria vendo a projeção do nome das músicas tocadas.
A
seqüência desses “slides” seria a mesma que a do repertório.
Excelente idéia mas muito onerosa e de execução difícil, por isso mesmo deixou
de ser implantada. Ele próprio, no intuito de melhor organizar o repertório,
chegou a datilografar fichas para cada música, como em um arquivo, catalogando
mais de 200 títulos de diversos estilos.
Vejam
vocês que tudo isso ocorreu por volta de 1967 a 1969, quando nem se pensava em
programas de computadores capazes de fazer apresentações magníficas, telões, “data-show”
e demais recursos tecnológicos da atualidade.
Outra
tentativa de meu pai foi a de gravar todas as músicas tocadas durante os eventos.
Mais uma vez a falta de recursos financeiros de nossa parte e também de
tecnologia. Ainda não tínhamos os gravadores de fita cassete. O gravador que
ele usava, funcionava com fitas de rolo e possuía um mecanismo muito
problemático. Além disso as gravações tinham que ser feitas nos palcos, com o
som ambiente, pois não se utilizava naquele tempo recursos como saídas de áudio
em linha dos amplificadores ou mesas de som.
Fitas de
vídeo, nem pensar. Conhecemos o videoteipe mais ou menos em 1971, com as
antigas máquinas de videoteipe da TV Ceará, também com fitas enormes. Acho até
que nem existem registros em vídeo dessa emissora. Os programas gravados num
dia era apagados pouco tempo depois, com novas gravações, pela necessidade de
reutilização das fitas.
VESTUÁRIO – UM GRUPO ELEGANTE
No
princípio, por orientação do meu pai, bem acolhida por todos, o Big Brasa usava
fardamentos, isto é, mantinha grupos de roupas que às vezes substituía durante
as próprias festas. Houve uma noite, em Umirim, que o Conjunto mudou de roupa
quatro vezes, impressionando a todos os presentes. Isso contribuiu para formar
uma falsa idéia, também em Fortaleza, de que o conjunto era composto por
pessoas ricas.
O
Big Brasa procurava acompanhar a moda jovem. Se era camisa de gola-rolê, tudo
bem, malha, calça estreita, cabelos longos, tudo. As calças “Lee” e
os tênis também faziam parte efetivamente de nosso guarda-roupa. Fazíamos
questão, além de ensaiar bastante para fazer o melhor, procurávamos também
manter boa aparência, pois isso para nós era fundamental.
O
Mestre Alberto não gostava de barba malfeita ou por fazer, ou então cabelo
grande. Segundo ele, dava um aspecto de sujeira e não era legal. No começo do
conjunto, quando ainda nos acompanhava, pediu para o Lucius tirar sua barba,
que estava grande. O Lucius, com muito respeito, educação e diplomacia,
qualidades que sempre possuiu, disse-lhe que iria satisfazer a sua vontade, mas
que aquilo não tinha nada a ver. Hoje em dia o Mestre Alberto reconhece que
estava errado e aquilo “não tinha nada a ver” realmente.
Houve
o tempo, pelos anos 69, 70 e 71, das calças boca-de-sino. Era moda total e quem
não as usasse não estava com nada. Nas calças “Lee”, que foram os
primeiros jeans a surgir, nós
tínhamos que arranjar umas tiras e mandar emendar na parte de baixo para
alargá-las e assim poder ficar “na crista da onda”.
Na
coluna do jornal O Estado, intitulada “Alta Roda”, o seguinte
comentário sobre o Conjunto: “O Big Brasa, aqui da terra, talvez seja o
único conjunto que não aderiu à moda cabeluda. Seus componentes se apresentam
elegantemente com cabelos cortados à la homens sérios!”.
Nos
bailes de 15 Anos e nos de Formatura, bem como em outras funções mais
especiais, usávamos terno e gravata ou blazers. O Big Brasa sempre se portou
adequadamente no que se refere ao visual.
OS ENSAIOS DO BIG BRASA –
SEMPRE NO “QG”
Durante
os ensaios, quando esses se realizavam na garagem de nossa casa, o pessoal que
passava na rua sempre parava para olhar. Hoje, passados 30 anos, de vez em
quando algumas pessoas ainda associam e fazem referências ao endereço, dizendo:
- É ali,
perto do Big Brasa?
Muitas
vezes passávamos dias inteiros plenamente envolvidos com a música.
Consequentemente, toda a alimentação do pessoal ficava por conta de meus pais.
Naquele tempo eu não percebia nada disso. Não porque não me importasse, mas com
certeza pela falta de experiência, natural da juventude. Nunca tinha pelo menos
imaginado o custo de um dia de ensaio para todo mundo, em se tratando de
alimentação e trabalho por parte de todos aqueles que se envolviam,
particularmente de minha mãe, que se preocupava para não faltar nada para o
grupo. Somente alguns anos depois é que descobri que tudo aquilo devia pesar no
orçamento de meus pais, além de ser trabalhoso, pois envolvia a participação
direta e indireta de todos de casa, no desejo de atender bem e de que o
conjunto se firmasse.
Um
detalhe importante, merecedor de registro, é o fato de que os meus pais
preferiam que a turma toda se reunisse em nossa casa, nos cafés das manhãs,
depois das viagens, objetivando manter a unidade do grupo. Muitas e muitas
vezes chegamos de viagem e a mesa estava pronta, com café, pão, bolos, suco de
frutas e tudo mais que a mamãe conseguisse preparar. Tal fato pode hoje ser
analisado por dois aspectos: o da segurança, se é que eles queriam observar
como o pessoal tinha retornado; e também o de proporcionar uma reposição de
energia necessária a jovens de nossa idade, em vista do sacrifício de uma noite
inteira sem dormir e com alimentação muitas vezes precária.
Tão
logo que possível regularizamos nossa situação junto à Ordem dos Músicos do
Brasil, Secção do Ceará e com o Sindicato dos Músicos do Ceará. Tudo
providenciado pelo papai, pois nós mesmos só queríamos saber de tocar. Aliás,
hoje vejo que isso é perfeitamente normal. Na adolescência é difícil ver algum
jovem preocupado com os aspectos legais, burocráticos e coisas do gênero. O
Registro do nome “Big Brasa” foi feito no Cartório de Registro de
Títulos e Documentos de Fortaleza. Inicialmente todos os músicos tinham
carteiras provisórias. Depois, com a devida habilitação, receberam as carteiras
profissionais definitivas.
Ao
longo da existência do Conjunto outros músicos participaram com carteiras
provisórias. Mas todo mundo tinha que estar devidamente regularizado.
CONTRATOS E HORÁRIOS
Quando
o Big Brasa foi registrado oficialmente e todos os seus músicos foram
legalizados frente à Ordem dos Músicos do Brasil, Secção do Ceará, bem como
junto ao Sindicato dos Músicos, todos nossos contratos passaram a ser
devidamente registrados. Inúmeras vezes, é importante lembrar, a mamãe se
deslocou para a Ordem e Sindicato para registrar nossos contratos.
Mandamos
fazer um papel timbrado para os contratos do Big Brasa, de modo a facilitar seu
preenchimento. Esse formulário continha cláusulas relativas ao contratante, ao
tempo de duração do evento, à forma de pagamento, preço da hora de prorrogação
e a relação dos músicos do conjunto, com seus respectivos números de carteiras
profissionais da OMB ou licenças temporárias. Tinha que ser registrado em cinco
vias.
No
que se refere ao cumprimento desses contratos e dos horários, o Big Brasa era
muito caprichoso. Eu próprio fazia questão de chegar ao local dos eventos bem
antes, para acompanhar e instalar todo o equipamento, afinar o instrumental,
testar os amplificadores, fazer a distribuição do som de maneira adequada ao
ambiente etc. Após tudo isso sempre mantinha contato com o contratante ou
responsável no sentido de dizer que tudo estava em ordem e pronto para o início
no horário determinado.
Foi
um dos primeiros conjuntos que começaram a tocar apenas bailes de quatro horas de
duração em Fortaleza, com meia hora de intervalo. Os outros conjuntos tocavam
festas de cinco horas. Mas isso, enfatizo, somente na capital porque no
interior do Estado a coisa pegava. Tínhamos que enfrentar verdadeiras batalhas.
Festas de cinco, seis e até sete horas de duração, quando havia prorrogações. A
legislação específica estabelece que os músicos devem tocar no máximo 45
minutos, com intervalo de 15 minutos por cada hora. Mas no Ceará esse
dispositivo nunca foi cumprido.
Em
uma ocasião, chegamos ao ponto de deixar de fazer um contrato financeiramente
compensador porque já havíamos firmado outro compromisso, para tocar de graça,
a título promocional. Responsabilidade não é para qualquer um...
PROFISSIONALISMO - UMA PALAVRA
FUNDAMENTAL
Em
qualquer trabalho, para que se obtenha pleno êxito e destaque, o
profissionalismo tem que existir. Dentro dos princípios que regem um bom
profissional, se encaixam diversos aspectos, como responsabilidade, habilidade
naquilo que executa (que é conseguida através do estudo e do trabalho),
respeito aos companheiros de profissão, coleguismo, disciplina e perseverança nos objetivos,
entre outros.
No
caso do músico, especificamente, isso tudo deve ser multiplicado por dois, ou
seja, o esforço tem que ser duplicado, para superar aquela imagem de que todo
artista é relaxado, desligado, “lunático” e até mesmo alienado.
Para
mencionar um simples exemplo, uma vez fui tachado pejorativamente de “aquele
guitarrista”, pela mãe de uma namorada. Não deixei por menos, conversei demoradamente
com aquela senhora, de modo que ela soubesse que estava falando com um cara
sério, de boa família e de bons princípios. E através de meus procedimentos
consegui que ela e seus familiares modificassem o conceito que faziam sobre
mim, pelo fato de ser músico.
Por
esses e outros fatores, é que formulei uma proposta de trabalho para o
exercício de minhas funções profissionais, de modo a tentar, de todas as
maneiras possíveis, desfazer essa imagem negativa, que o músico ainda possui,
para uma parcela da população. Tarefa difícil, pelo preconceito existente com a
profissão de músico, mas não impossível, pois consegui fazer a minha parte, de
manter a dignidade da profissão e lutar contra o preconceito.
FORTALEZA E OS CLUBES DA ÉPOCA
É
importante dizer que nos anos 60 as diversões da vida noturna de Fortaleza se
caracterizavam por bailes em clubes, diferentemente do que ocorre hoje em dia,
com os mega-shows em casa de
espetáculos de grande porte. Quem viveu os “Anos Dourados”
certamente tem saudades das festas desse período.
Quem
não lembra dos preparativos que fazíamos para ir a alguma festa e de como os
conjuntos musicais eram mais valorizados? E dos festivais, sempre muito
freqüentados, as paqueras, a dança colada? Para nós músicos não era muito fácil,
pois na maioria das vezes estávamos trabalhando nos finais de semana. Em nosso
caso, quando o Big Brasa tinha folga nos contratos, saíamos de Messejana para
nos divertir um pouco em algum clube. Entretanto, antes de nossa turma
completar dezoito anos e poder dirigir, tínhamos que chamar um carro de praça,
normalmente uma rural, para que nos conduzisse até o clube e voltasse na
madrugada para nos trazer de volta para Messejana.
Para
se ter uma idéia do que rolava nas noites de Fortaleza, segue uma relação dos
clubes que existiam na época, em ordem alfabética, nos quais o Big Brasa atuou,
por várias vezes.
O
Balneário Clube de Messejana, a Sociedade Bairro de Fátima, o Clube de Regatas
Barra do Ceará. Mais adiante o Iracema, o Líbano, o Iate Clube de Fortaleza, o
Ideal Clube, o Náutico Atlético Cearense, o América Futebol Clube, o CRA -
Clube Recreativo da Aerolândia, a COFEBA (Colônia de Férias dos Funcionários do
Bento Alves), o Recreio dos Funcionários, o Clube General Sampaio, o Vila
União, o Massapeense, a Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB), o Clube
dos Diários, o Clube do Jornal O POVO (Messejana), o Clube da Caixa Econômica,
o Maguari e o Memphis Clube, de Antônio Bezerra.
O BALNEÁRIO CLUBE DE MESSEJANA
Localizado às margens da Lagoa de
Messejana, na qual, segundo a lenda, e o escritor José de Alencar, Iracema, a “virgem
dos lábios de mel”, tomava banho e saía correndo até a Praia de Iracema,
chegando a seu destino ainda com os cabelos molhados, tal a sua rapidez.
O Balneário Clube de Messejana
tinha uma extensa área verde ao redor do salão, bem arborizada, formando um
espaço muito agradável para seus freqüentadores. O clube possuía uma
arquitetura simples, sendo amplo e bem estruturado, no que se refere ao salão
de dança e palco. Deixava muito a desejar pela precariedade de suas instalações
de secretaria, bar e da própria fachada.
A vista do Balneário era muito
bonita, tendo como cenário a belíssima Lagoa de Messejana, que às tardes nos
proporcionava um pôr-do-sol magnífico, com cintilantes reflexos em suas águas.
Nas manhãs dos sábados e domingos, podíamos ver algumas velozes lanchas,
circulando a lagoa, em passeios que deviam ser muito agradáveis. Naquela época,
como ainda hoje, aquilo era privilégio de gente rica.
Nossa turma freqüentava o
Balneário para jogar pingue-pongue, tomar banho de lagoa, jogar bola, paquerar
e dançar nas tertúlias. Praticamente toda a pequena comunidade de Messejana se
encontrava no Balneário. Todo mundo se conhecia. Vivemos, pode-se dizer, a fase
áurea do Balneário de Messejana.
As pessoas de “elite” e o
preconceito
Messejana,
como também Fortaleza nos anos 60, tinha algumas famílias tradicionais que se
sentiam superiores às demais. Como exemplo o Balneário Clube de Messejana, às
margens da lagoa de mesmo nome, que foi por muito tempo um clube preconceituoso
onde só deveria freqüentar pessoas tidas como de “boa linhagem”.
Pelo
Balneário passaram ótimas orquestras, oriundas de outras regiões do País. Em
todas as festividades os grupos tinham que atender as preferências musicais dos
ditos “nobres”. Para exemplificar o preconceito existente nas
cabeças de quase todos os diretores do Balneário, no final de década de 60, ou
para quem é detalhista no ano em que o América Futebol Clube foi campeão
cearense, havia um jogador em seu plantel que destacou-se de forma brilhante
por boas atuações. Chamava-se José Deusimar Moreira Pontes, mas era conhecido
por “Pinha”, seu apelido. Nosso vizinho e amigo, o Pinha jogou a
princípio no Salgado da Gama e depois de uma bem sucedida campanha por aquele
clube, foi contratado pelo América onde fez boa figura. Posteriormente foi
contratado pelo Maranhão Atlético Clube, onde ficou conhecido como o “Pelé
cearense”. Pois bem, durante uma das animadas matinais que o Big Brasa
tocava no Balneário, o referido jogador adentrou ao clube, ocasião em que meu
pai fez referências elogiosas a ele ao microfone. Pelo ocorrido o Mestre
Alberto foi seriamente criticado pela diretoria do clube e pela “nobreza”
messejanense, por terem achado um absurdo a menção a um jogador de futebol
naquele recinto...
Outra
vez, em uma promoção do próprio Big Brasa, realizada no Balneário clube de
Messejana, um dos diretores chegou a dizer que algumas mulheres de programa tinham
sido vistas durante o evento. Falsa moral, daquele cidadão. À sua colocação, o
Mestre Alberto respondeu:
-
Rapaz, é o seguinte: desde que não esteja dançando nua, tenha pago ingresso e
esteja se comportando adequadamente, não há problema nenhum nisso. Teimosamente, esse mesmo diretor insistia
sempre no triste preconceito, dizendo para o meu pai:
- Não adianta querer popularizar o Balneário, que
você não vai conseguir, seu Alberto ...
Realmente o Balneário não se popularizou, como
desejava meu pai e todos nós, e veio a amargar um melancólico fracasso, tempos
depois, indo totalmente à bancarrota por conta de suas diretorias locais de “elite”.
A TÃO ESPERADA
ESTRÉIA E O PREFIXO - “AND I LOVE
HER”
Lembro
bem da primeira festa, da estréia do Big Brasa no Balneário Clube de Messejana.
Passamos o mês inteiro nos preparando, ensaiando as músicas que fizeram parte
de nosso primeiro repertório. No dia “D”, amanheci com muita
ansiedade, gerada pela expectativa do evento. Afinal de contas seria uma
apresentação pública e teríamos que animar uma tertúlia, responsabilidade e
tanto, principalmente para quem nunca tinha participado daquilo.
À
noite, todos os componentes do Big Brasa, com a indumentária escolhida para a
estréia, esperaram pela hora da festa começar na secretaria do clube, para
fazer surpresa do visual do grupo aos presentes. Eu estava sentado em um
banquinho, muito nervoso e até mesmo com um pouco de dor de barriga. Quando
chegou a hora “H”, ouvimos alguém anunciar a entrada do conjunto.
Nos deslocamos da secretaria e finalmente subimos ao palco. Fomos bastante
aplaudidos. Eu não enxergava praticamente ninguém. Comecei a tocar o prefixo,
And I Love Her, dos Beatles, com a guitarra, mas quase minhas mãos trêmulas não
atendiam as notas desejadas. Minutos depois senti mais firmeza, em parte também
motivada pelos aplausos do público presente, e aquele impacto da estréia foi
sendo aos poucos superado.
Posso
dizer que essa estréia foi verdadeiramente estressante para mim, de modo
especial por ser eu quem liderava o grupo no que diz respeito a mudanças de
músicas e a seqüência do repertório, além da preocupação em tocar o próprio
instrumento. Com o tempo todos nós adquirimos mais segurança e aquele
nervosismo natural foi gradualmente desaparecendo, o que nos possibilitou
enfrentar públicos de qualquer proporção com muita tranqüilidade.
AS TERTÚLIAS NO
BALNEÁRIO CLUBE DE MESSEJANA
No
Balneário foram inúmeras as apresentações feitas pelo Big Brasa. Nas primeiras,
por idéia de meu pai, o Mestre Alberto, durante o intervalo, eu e o Carló
saíamos de mesa em mesa, ao redor das mesas, tocando com escaleta e violão as
músicas de maior sucesso no momento, sendo que uma delas era “Les
Marionettes”, do Herbert Albert.
Além
das tertúlias, tocávamos matinais e vesperais. Em 1969 chegamos a tocar um
carnaval inteiro no Balneário. Contratamos mais alguns músicos, para
instrumentos de sopro e de percussão, e fizemos quatro bailes carnavalescos sem
problemas. Nosso desempenho foi plenamente satisfatório e o conjunto atendeu à
expectativa geral.
Como
sempre o Clube, através de suas diversas diretorias, ao longo da existência do
Big Brasa nos convidou sempre para “prestigiar a prata da casa”, ou
seja, para tocar mais barato. O Balneário, nem o pessoal de Messejana, com
pouquíssimas exceções, nunca nos deu nada, nem uma corda de guitarra. No final
dessa nossa primeira experiência com carnaval, o clube pagou apenas uma parte
da quantia acertada alegando prejuízo. Tivemos que arcar com o pagamento dos músicos
e passar o resto do ano inteiro para receber o restante, no “pinga-pinga”.
Foi
tocado na Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB), em Fortaleza. O Big
Brasa para esta ocasião usou um traje especial, com calças pretas, camisas de
seda branca, com destaques em bordado, e uma faixa vermelha de veludo na
cintura. O conjunto, por iniciativa de meu pai, levou um presente para a
aniversariante.
O
repertório estava bem organizado, vestuário também, instrumental quase completo
e o nosso grupo já começava a se estruturar. Muito importante nesse período era
o entusiasmo e a boa vontade da parte de todos, na ânsia de aprender mais e
progredir no cenário artístico fortalezense. Nessa época a música, a guitarra e
o conjunto não saíam de meu pensamento.
Detalhe:
na fotografia abaixo, tirada pelo grupo nesse baile, a nossa primeira bateria
aparece com os dois suportes do bombo inteiros. Mais adiante, após a quebra do
tal suporte, foi preciso a utilização de um transformador velho para escorá-lo.
-
15 anos no Bairro de Fátima
Outra
das apresentações iniciais do conjunto foi em uma festa de aniversário, em uma
residência no Bairro de Fátima. Para vocês terem uma idéia da situação, o conjunto
tocava com suas guitarras e bateria e todo mundo cantava sem microfone nenhum,
na marra, no sacrifício mesmo. Essa função musical durou mais ou menos umas
duas horas. Isso foi no tempo em que o instrumental e todo o grupo cabiam, com
algum aperto, é claro, em um jipe 51...
-
Os restaurantes da Beira-mar
Nos
primeiros meses, após a estréia, o Big Brasa conseguiu alguns pequenos
contratos, ainda verbais, para tocar em restaurantes na avenida Na
realidade, ganhávamos muito pouco ou quase nada. O conjunto recebia uma quantia
que dava apenas para o pagamento do transporte e para um minúsculo “cachê”
para cada músico. Ao final da noite, recebíamos uma refeição completa do
restaurante. Pelo menos isso! O “esquema” naquele tempo, para quem
estava iniciando, era esse mesmo, não tinha outra saída. O que procurávamos era
a promoção do conjunto, aparecer para o público e tornar o Big Brasa conhecido
em Fortaleza. Mas, para garotos como nós, todos na faixa de 15 para 17 anos, tudo
era novidade...
Nessas
tocatas, o conjunto ficava muito exposto ao público, quase sempre sem um local
com proteção adequada, com os microfones de vez em quando sendo derrubados por
garçons ou clientes, cabos e extensões elétricas pisados e todas as desvantagens
de se trabalhar com instrumentos musicais e equipamentos eletrônicos sem estar
em um palco.
Com
o passar de alguns meses, nosso trabalho surtiu efeito. Começamos a receber
contratos para festas particulares de 15 anos, verdadeira moda naquele tempo, e
também de outros clubes. Aí sim, felizmente pudemos deixar de lado os tais
contratos com restaurantes.
-
Tertúlias na Sociedade Bairro de Fátima
Por
várias vezes o Big Brasa se apresentou em um clube chamado Sociedade Bairro de
Fátima. Quase sempre as tertúlias tinham início com pouca gente, o que
desanimava extremamente todo o grupo. Mas depois de algum tempo o pessoal ia
chegando, devagarinho e as festas terminavam animadíssimas. Um dos garçons
dizia para o Mestre Alberto: - Aqui é
assim mesmo, começa fraco e depois melhora.
Na
Sociedade Bairro de Fátima ocorreu um episódio digno de registro. Nunca esqueci
aquela noite. Nós estávamos tocando uma tertúlia normalmente e o público
naquela ocasião era razoável. De cima do palco vimos uma equipe entrando pelas
laterais do salão. Era o pessoal de um conjunto de Recife, com um instrumental
bem mais moderno que o nosso. No intervalo ficamos sabendo que o grupo iria
fazer um show. Ficamos observando
aqueles amplificadores modernos, material muito bom. Esse conjunto iniciou sua
apresentação “rachando”. Sabem como é? Quando um conjunto vai se
apresentar por pouco tempo, seleciona as melhores músicas, aquelas que causam
impacto e “sentam o porrete”. Essas músicas são chamadas de “cavalos
de batalha”. Depois que o curto show acaba, quem fica, ou seja, o conjunto que estava tocando o baile, que se vire
para superá-lo. Foi uma verdadeira barra. Vimos o pessoal desmontar seu
instrumental e depois subimos ao palco novamente para continuar a festa.
Reiniciamos com uma seqüência de solos de guitarra, acho que do “The Pop’s”.
Estava trêmulo, mas com o tempo o pessoal foi entrando no salão para dançar e o
nervosismo acabou.
-
As tocatas em Mondubim
O
Big Brasa também enfrentou paradas difíceis em Mondubim. Tertúlias mal divulgadas,
certamente, e população pequena do bairro contribuíam para isso, entre outros
fatores que desconheço. O Big Brasa se esforçava muito para animar o salão, eu
tentava de tudo, modificando o repertório, alternando estilos e ritmos mas não adiantava nada.
-
Os programas de Rádio
O
Big Brasa participou de alguns programas de rádio levados “ao ar”
pela Rádio Assunção, Rádio Dragão do Mar de Fortaleza e Ceará Rádio Clube.
O
primeiro deles foi na Rádio Assunção, em um programa apresentado pelo radialista
Aurélio Brasil. As condições técnicas para a apresentação de um conjunto
musical eram mais do que sofríveis. Um estúdio apertadíssimo, de uns 10 metros
quadrados mais ou menos, apenas um microfone para captar todo o som do
instrumental e das vozes (imaginem só) e a apresentação ao vivo. O operador de
áudio desse programa, mesmo se quisesse ou se soubesse, não teria nenhuma
condição de mixar um instrumento ou equalizar o som geral do grupo. Saía do
jeito que fosse mesmo, tudo na base da improvisação. Nesse dia todos estávamos
muito nervosos com a expectativa dessa apresentação. O nervosismo se acentuava
quando alguém nos avisava de que o programa começaria dentro de instantes e
logo depois a gente via a indicação “NO AR” acender, dentro de
estúdio.
Um
fato interessante, que nos chegou ao conhecimento muito tempo depois de ter
acontecido, foi que durante a apresentação do Big Brasa nesse referido programa
de rádio, o nosso amigo Lúbi-Lúbi, de Messejana, que era auxiliar do programa,
nos intervalos chegou para nós com a notícia de que os telefones da emissora
não paravam de tocar, segundo ele os ouvintes elogiando o conjunto e pedindo
mais músicas. O Lúbi-Lúbi fez isso para nos incentivar e até hoje todos nós
somos a ele muito gratos, pois o choque não teria sido nada agradável para quem
estava principiando. A verdade, nesse caso por ele escondida, é que o pessoal
telefonava para pedir para nos “tirar do ar”.
Ainda na Rádio Assunção, mais tarde chegamos a
fazer gravações de “jingles” para algumas empresas locais, com o
Mauro Coutinho como técnico de som, e a nos apresentar no Auditório, com
platéia, também em programas ao vivo, mas com melhores condições acústicas para
melhor exibição. No mesmo período participamos de programas semelhantes
transmitidos pela Rádio Dragão do Mar de Fortaleza. O apresentador era o
Jurandir Mitoso, muito brincalhão e que ficou sendo nosso amigo e incentivador.
Nesses programas o Jurandir Mitoso, entre uma música e outra, fazia perguntas
sobre o grupo, nos entrevistando sobre a programação para o fim de semana.
Sempre nos deu a maior força.
Na
Ceará Rádio Clube não houve participação do Big Brasa, mas sim várias gravações
individuais, com solos de guitarra feitos por mim, para a escolha de “sinais
de tempo” para as transmissões de partidas de futebol, a convite do Mauro
Coutinho. O sinal de tempo, para quem não sabe, é aquele rápido som ou efeito
que precede o aviso, pelo locutor, de quanto tempo de jogo é decorrido. Usava a
criatividade e efeitos com distorção para gravá-los. Lembro-me que alguns deles
passaram muito tempo sendo utilizados e quando eu os ouvia sentia um prazer
enorme pela autoria.
A FALTA DE UM TELEFONE
No princípio não tínhamos telefone próprio, fator
que em muito dificultou a procura do conjunto.
O telefone mais perto de nossa casa ficava na
residência da Dona Nadir. Era um daqueles “macacos-pretos”, como os
radioamadores chamam, que tinham uma pequena alavanca ao lado, a qual acionada
fazia soar a campainha de uma mesa telefônica do posto telefônico de Messejana,
para que este completasse a ligação para Fortaleza.
O sistema, muito precário em vista do que temos
hoje, funcionava assim: nós girávamos a tal alavanquinha várias vezes até que
alguém do posto telefônico atendesse. Fornecíamos o número a ser chamado e a
atendente pedia para que a gente desligasse e ficasse aguardando. Quando ela
conseguia, retornava a ligação. Muitas vezes levava uma hora ou mais, pois
dependia do número de chamadas que tinha que fazer no momento.
O
nosso primeiro telefone, de nº 26-40-91, foi adquirido pelo meu pai em um dos
planos de expansão da TELECEARÁ. Este telefone funcionava em uma central nova e
ligava direto para Fortaleza, sem necessidade da intermediação do antigo posto
telefônico. Uma melhoria formidável, portanto.
Com
o telefone próprio, mandamos imprimir cartões e outros impressos, para ajudar
em nossa divulgação. Até hoje mantenho guardado o meu primeiro cartão de
visita, como guitarrista-solo do Conjunto Big Brasa.
MUITOS CONTRATOS, MESMO SEM
EMPRESÁRIO
O
Big Brasa nunca teve empresário. Muitas festas ao longo de sua existência
naturalmente foram intermediadas por empresários, os quais cobravam 10% do
valor do contrato. Mas empresário próprio nunca chegamos a ter.
Os
contratos que o Big Brasa conseguia vinham de quem realmente queria nosso
conjunto pela qualidade. Para vir até a sede do conjunto não era fácil,
levando-se em conta a distância de Messejana para Fortaleza, o tempo que se gastava no percurso pela antiga
BR-116 e as dificuldades de comunicação, pois no início não tínhamos telefone
(coisa rara em Messejana nos idos de 1967), conforme já comentamos.
O BIG BRASA PELO INTERIOR DO CEARÁ
O Big Brasa esteve presente em muitos
municípios cearenses, para animar festas de inauguração, bailes de formatura e
outros eventos, nos quais sempre foi muito bem recebido. Certas vezes,
encontrávamos faixas e cartazes pela cidade ou em frente ao clube local, dando
boas-vindas ao conjunto, além da recepção feita pelas fãs e curiosos. As
viagens do conjunto eram sempre animadas em razão do alto astral da turma.
Depois dos bailes, quando o grupo estava de volta para Fortaleza, elas se
tornavam cansativas, pelo percurso e acomodação nos transportes.
Nas cidades do
interior, quando chegávamos, a rotina praticamente era a mesma. Encontrar o
clube ou o local da apresentação, retirar todo o equipamento dos transportes e
montar tudo, deixando os instrumentos no “ponto de bala” para a
festa, com os amplificadores e caixas devidamente testados, guitarras afinadas,
tudo pronto, de maneira que a gente pudesse chegar apenas a alguns minutos do
início da função.
Em seguida nós
íamos tomar banho, jantar e nos arrumar para o retorno ao clube. Não podíamos
demorar nessas etapas, para não perder o horário. Aí é que vem a responsabilidade.
Eu controlava os horários, ficando de olho na turma, para que alguém não se
atrasasse. Isso numa boa, sem mandar fazer nada.
As hospedagens
sempre foram simples, mesmo porque o interior do Ceará, exceções à parte, não
dispõe de bons hotéis ou pousadas. Na maioria dos contratos o conjunto se
hospedava em um hotel ou pensão de classificação “sem estrelas”,
onde nos preparávamos para o baile.
Durante toda a
existência do Big Brasa consegui manter a liderança sobre o grupo de forma bem
democrática, sem nunca precisar alegar ser dono do equipamento ou coisas desse
gênero. Na realidade eu nunca me senti dono do conjunto e sim um guitarrista e
companheiro de trabalho dos demais integrantes. Nos momentos em que tive que
tomar decisões difíceis, em nome do Big Brasa, não hesitei. De forma certa ou
errada mais decidi. Quando o assunto envolvia todo o pessoal a turma era
consultada, para decidir sempre com base na maioria.
Entre os
municípios cearenses que o Big Brasa se apresentou estão: Aquiraz, Aracati, Baturité,
Canindé, Cascavel, Caucaia, Crateús, Guaiúba, Horizonte, Ipueiras, Itapagé,
Maranguape, Maracanaú, Massapê, Mombaça, Nova Russas, Pacajus, Pacatuba,
Pacoti, Pindoretama, Quixadá, Quixeramobim, Redenção, Russas, São
Benedito, Sobral, Tianguá, Umirim e Várzea Alegre.
AS VIAGENS PARA FORA DO ESTADO
Os
contratos do conjunto para fora do Estado não foram muitos, porém todos eles
marcantes. O Big Brasa esteve nos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte,
Maranhão e Piauí. Como músico “free-lancer”, além disso, estive
também em Campina Grande, Estado da Paraíba.
No
Maranhão, por exemplo, tocamos muitos bailes, em boas temporadas realizadas em
Balsas, Carolina e Caxias e São Luís. As fotos seguintes são ilustrativas desse
período.
-
As festas tocadas em Caxias
Estivemos
em Caxias em 1968, para três apresentações, ainda sob a orientação de meu pai
Alberto. A primeira na União Artística Caxiense, depois na Associação Atlética
do Banco do Brasil (AABB) e por último no Balneário Veneza. Fizemos uma rápida
apresentação na residência do prefeito local, que nos recebeu para um jantar. A
presença de fãs foi uma constante, inclusive com solicitação de autógrafos e
fotografias. Nessa época participavam do Big Brasa o Carló, Adalberto, Edson,
Severino, Getúlio e eu.
Nota
da imprensa local sobre essa temporada dizia:
“Encontra-se
em nossa cidade, procedente de Fortaleza, o vitorioso Conjunto Musical Big
Brasa, em excursão artística de divulgação da música moderna. Composto de cinco
músicos, todos pré-universitários, membros de destacadas famílias da sociedade
alencarina, os jovens intérpretes do iê-iê-iê estrearam ontem em animado baile
realizado na sede da União Artística Operária Caxiense, quando tiveram
oportunidade de empolgar os numerosos convidados com uma verdadeira apoteose de
sons e ritmos, que bem os recomendam como um dos melhores conjuntos do gênero
que nos têm visitado. Além de ser equipado com um instrumental dos mais
modernos, o conjunto agrada e faz vibrar a todos pela vivacidade que executa o
seu variado repertório”.
Imaginem
só que o Big Brasa ainda usava amplificadores de pequena potência e a velha
bateria. Apenas as guitarras já tinham sido substituídas por outras mais
modernas, de marcas Gianinni e Phelpa, modelos “Apache” e “Coronado”.
-
Um verdadeiro “ladrão” na guitarra
Em Caxias, fiquei conhecendo algumas das diversas
expressões usadas pelos maranhenses. Durante um dos intervalos das festas que o
Big Brasa tocava, um grupo de pessoas estava reunido em torno da mesa reservada
para o conjunto, quando ouvi uma delas dizer para a minha mãe, o seguinte:
- Minha Senhora, o seu filho é um verdadeiro “ladrão”
na guitarra!
Fiquei prestando atenção no que ele dizia,
percebendo que referia-se à maneira que eu tocava a guitarra, principalmente
por ter usado, em um improviso, um efeito interessante, tirado com a utilização
de um copo, passando pelas cordas, cujo som se assemelhava ao de uma guitarra
havaiana.
O que de outra forma seria uma qualificação triste,
para se ouvir a respeito de um filho, para ela, a Dona Zisile, soou como
música, pois o emprego da palavra “ladrão”, nesse caso, significava
uma pessoa que executava bem aquele instrumento, um “craque” em sua
arte. Uma expressão muito usada pelos maranhenses.
Big Brasa em São Luís do Maranhão
Em
1968 o Big Brasa também foi contratado para tocar três festas em São Luís do
Maranhão. Não sei bem como foi feito e nem com quem foi assinado o contrato.
Lembro, com certeza, que tocamos no Casino Maranhense, no Lítero Clube e no
Grêmio dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar do Maranhão. Pelo
contrato para três bailes, receberíamos 600 mil cruzeiros, mais passagens de
avião de ida e volta. Um contrato e tanto, visto que hoje em dia apenas os
grupos famosos conseguem contratos assim.
O Big
Brasa nesse tempo era composto pelo Carló, Edson Belém, Edson Girão, Adalberto,
(guitarristas-bases e vocalistas), Severino (baterista) e eu, “Beiró”, como guitarrista-solo. O
Getúlio, meu irmão, mascote e pandeirista, também viajou conosco. Antes de
partirmos fizemos umas fotos no Aeroporto Pinto Martins e outras logo que
chegamos a São Luís.
Num dos
bailes dessa temporada, no Clube dos Sargentos e Subtenentes da Polícia
Militar, o organizador veio até nós solicitar que acompanhássemos uma jovem cantora da cidade, de 15 anos, que
tinha uma voz belíssima.
No meio
da festa fizemos uma pausa e essa moça ensaiou rapidamente conosco para depois
dar um verdadeiro show de voz,
empolgando todos participantes. Ficamos sabendo muitos anos depois que essa cantora
era nada menos que a Alcione, hoje famosa, filha de um daqueles militares. Ela
estava vestida de branco, muito graciosa, e fez uma belíssima apresentação.
O
Big Brasa, mais uma vez, em São Luís, teve contato direto com outro conjunto
local que logicamente possuía contrabaixo. O contrabaixista nos mostrou o
instrumento e até se propôs a nos emprestar o instrumento para a noite, se
fosse o caso. Mas não tínhamos ninguém ainda capacitado para isso. E foi tudo
daquele jeito, sem contrabaixo mesmo. Imaginem só como deveria ser: aquele som
metálico e estridente de três ou quatro guitarras e uma bateria, sem o peso da
marcação e do próprio som do contrabaixo.
Foi
em 1968. O Conjunto Big Brasa era integrado pelo Dummar, Carló, Marcos Oriá,
Severino e eu. Chegamos à cidade e foi aquele sucesso estrondoso.
A
curiosidade e o desconhecimento de conjuntos faziam que surgissem confusões até
mesmo de nomenclatura, quando um cara perguntou ao Mestre Alberto, logo após nossa chegada, se o nome daquele
instrumento era “tarracha” ou guitarra. Ele quase morreu de rir do
cara e lhe explicou direitinho, que o nome era mesmo “guitarra”.
Seguimos do aeroporto de Balsas em cima de um caminhão, que rodou pelo centro e
principais ruas de Balsas, acompanhado por outros carros (a maioria jipes),
como uma “carreata”. O pessoal ficava olhando aquilo tudo, admirado
e acenando das portas e janelas. Tudo aquilo foi realmente impressionante para
nós e a responsabilidade pesava mais ainda, depois daquela recepção. Era o Big
Brasa o primeiro conjunto com guitarras que iria se apresentar em Balsas. Daí
se explicava toda aquela curiosidade.
Um
panfleto circulou pela cidade, antes de nossa chegada, anunciando:
“A
partir do dia 18 do corrente mês se encontrará em nosso meio o conjunto Big
Brasa, autêntico representante da música popular moderna. Trata-se de um
conjunto de jovens, onde figuram dois balsenses, e que vem alcançando grande
sucesso no meio social de Fortaleza. Espera-se contar com o apoio integral do
povo balsense para este acontecimento, que cumprirá uma dupla missão:
recreativa e cultural”.
O pessoal todo estava entusiasmado com a nossa presença.
Dentre os mais animados estavam o nosso primo Bernardino, o Gonzaguinha e o
próprio Mestre Alberto. Depois
seguiu-se a preparação do nosso “enorme instrumental” no clube. O
problema maior era o som para a voz. Havia naquele tempo os “serviços de
som” dos clubes, normalmente um amplificador muito fraco e ruim, com
pouca potência e caixas de som também de péssima qualidade. na última hora uma
das caixas pifou e quem “salvou a pátria”, substituindo um
alto-falante defeituoso, foi um padre italiano de quem não lembro o nome. Mas
assim mesmo o som não deixava muito a desejar...
-
E cordas de guitarra, tem mais por aí ?
Outro
problema que surgiu nessa temporada foi o da falta de alguns acessórios,
principalmente cordas para as guitarras. Nós não tínhamos experiência e
falhamos ao não levar para Balsas vários encordoamentos de reserva. Resultado:
a turma da mão pesada quebrou várias cordas. Desse “time” fazia
parte o Dummar, que com suas batidas fortes, como fazia ao violão, bateu o
recorde. Eu também não escapava quebrava disso e de vez em quando quebrava uma.
Os encordoamentos não tinham a resistência como os de hoje. A solução, embora
precária, foi comprar cordas de violão para substituir as das guitarras. Não
tinham a sonoridade adequada, mas não tinha saída, foi o jeito utilizá-las.
Vale aquele ditado: ruim com elas, pior sem elas. E demos uma verdadeira baixa
nos encordoamento de violão no comércio local.
-
A acertada crítica do Leonizar sobre o conjunto
Ainda
sobre a temporada de Balsas um fato merece citação com destaque. Soube-se que
durante a apresentação do Big Brasa no Clube, na qual a platéia admirada
aplaudia, com sucesso total, um músico da cidade (saxofonista), chamado
Leonizar, comentou numa roda de amigos que naquele conjunto uma guitarra estava
desafinada. Foi levado ao ridículo, por desconhecimento musical e pela empolgação
daquela turma. Simplesmente não admitiam a idéia exposta pelo Leonizar.
Esta
história espalhou-se por toda a cidade e o pessoal “tirou o couro”
do Leonizar. Acontece que o único mesmo que estava com plena razão era o mestre
Leonizar, dono de um “ouvido” fora de série, excelente músico, que
simplesmente constatou uma grande verdade. Muitas guitarras estavam mesmo
desafinadas e era uma confusão geral para acertá-las quando isso ocorria em
virtude da precariedade dos instrumentos, das cordas (encordoamentos de violão)
e da barulheira total. Esse fato serve para ilustrar que muitas vezes a razão é
encoberta pela emoção.
-
Big Brasa em Carolina
Motivado
pelas apresentações do Big Brasa em Balsas, um grupo de pessoas de Carolina,
cidade próxima, que mantinha certa rivalidade com Balsas, logo se mobilizou, no
sentido de contratar o conjunto para duas apresentações. Ainda mais, porque
esta cidade tinha fama pelo seu bom nível cultural.
Depois
do contrato devidamente acertado foram enviados dois pequenos aviões monomotores
para nos transportar, daqueles que já levantam vôo “na emergência”,
por terem apenas um motor. Imagine só, o Big Brasa viajando em dois aviões. Na
verdade aquilo era um verdadeiro luxo para nós!
Ao
distribuir nosso equipamento e o pessoal do conjunto nesses dois pequenos
aviões, não houve espaço para o banco da bateria, o qual, por não ser
desmontável, teve que ficar. Foi a primeira dificuldade.
Durante
o vôo, o piloto do avião no qual eu estava, um pouco mais potente e veloz,
disse que nós poderíamos logo avistar o outro, que tinha decolado um pouco
antes. E com uns dez a quinze minutos ele nos apontou a outra aeronave, que
estava voando do nosso lado esquerdo, a uns 300 metros de distância.
Teve
ainda a “gracinha” feita pelo mesmo piloto, com relação a uma
inocente pergunta feita pelo Getúlio:
-
E avião também tem acelerador?
E
o piloto prontamente respondeu:
-
Tem... E empurrou um dos botões do painel para a frente, diminuindo toda a
aceleração. O motor diminuiu a rotação e consequentemente o barulho, e aquele
leve aviãozinho começou a perder altura. Só por alguns instantes, porque nós,
imediatamente, pedimos para que ele acelerasse de novo.
Chegando
em Carolina o Big Brasa foi muito bem recebido, ainda no aeroporto, e em
seguida nos deslocamos para conhecer o clube local, testar e instalar nosso
instrumental. A curiosidade e a admiração pelas guitarras era enorme, em
virtude de ser total novidade naquela época, principalmente em uma cidade do
sul do Maranhão. O caso do banco da bateria, que não coube no avião, foi resolvido com uma cadeira, colocada em
cima de um engradado de cerveja, de modo a ficar na altura adequada. O Severino
teve que se arranjar desse jeito.
Surgiu
um segundo problema: a tensão da rede elétrica oscilava bastante, por ser
gerada através de uma usina local. Baixava muito dos 220 volts, prejudicando o
funcionamento e a qualidade de som dos amplificadores. Tivemos que arranjar
vários transformadores, de diversos tipos e capacidades variadas, cuja
instalação ficou uma verdadeira “gambiarra” no palco. Mas o
sacrifício para conseguir os tais transformadores, por parte de todos, acabou
dando certo, no final de tudo.
Nas
duas festas tocadas em Carolina, eu e o Carló fizemos apresentações, durante o
intervalo, tocando de mesa em mesa, ao redor da pista de dança, com escaleta e
violão. A música escolhida para aquela oportunidade foi “Les Marionettes”,
ainda lembro. Fomos muito aplaudidos, o que de certa forma causou admiração ao
meu primo Pedro Ivo, que lhe confidenciou ter estranhado “o povo de
Carolina bater palmas daquela maneira”, tendo em vista que era de seu
conhecimento que vários artistas de renome tinham se apresentado na cidade e
não receberam tantos aplausos. Ainda bem que eles “desencalharam”
em nossa vez.
Nosso
retorno à Balsas foi em vôo comercial,
em uma aeronave bimotor, “DC-3”, da extinta Real Aerovias. Esse
tipo de avião, muito utilizado pelas companhias aéreas naquele período, não era
pressurizado e ouvia-se o ronco dos fortes motores bem alto, mesmo estando
dentro da aeronave. Durante o trecho Carolina - Balsas, um dos músicos do
conjunto resolveu dar uma de turista, pensando que o atendimento de bordo era
de “primeira”. E perguntou a um comissário de bordo:
-
Seria possível um pouquinho de leite?
O
comissário, achando muita graça, disse com a maior cara de brincalhão:
-
Você está vendo alguma vaca aqui dentro? Tem refresco de limão, lá atrás, pode
pegar. Disse ele, apontando para uma torneirinha daquelas. Nesse vôo lembro que
a turbulência foi enorme, em razão da baixa altitude, deixando uma parte de
nosso pessoal meio atordoada. Na chegada em Balsas muitos amigos e conhecidos
estavam nos esperando e nos recepcionaram com muita satisfação.
Foi
muito divertido. A temporada valeu a pena por mais uma experiência para todos
nós.
-
Big Brasa em Recife
Em
Pernambuco, o conjunto participou por duas vezes das finais dos Festivais
Nordestinos da Música Popular, televisionados para todo o Norte e Nordeste. As
transmissões via EMBRATEL, muito comuns hoje em dia, naquela época consistiam
novidade e motivo de repercussão na imprensa, visto que apenas eventos de
grande vulto mereciam tal destaque.
-
Big Brasa em Teresina
No
Piauí, o conjunto se apresentou mais de uma vez em Teresina e Parnaíba. Em
Teresina ficamos hospedados na casa do tio Raldir Bastos, que juntamente com
sua esposa, tia Hermelinda, nos recebeu de forma excelente e pudemos
estabelecer um convívio com todos os meus primos. Em um dos bailes realizados
em Teresina, no Clube dos Diários, lembro que durante o intervalo houve um show de um grupo musical da terra.
Quando retornamos para a segunda parte do baile o Big Brasa “botou para
quebrar”. O pessoal mostrou determinação para superar o tal grupo e
conseguimos nosso objetivo.
O
esforço para apresentar uma música de boa qualidade mais uma vez foi realizado.
Nesse dia, por exemplo, durante uma pequena pausa senti que meus dedos da mão
esquerda estavam latejando e doendo muito, em função de solos e improvisos
executados e, quem sabe, por causa de encordoamentos velhos de minha guitarra.
Tive a impressão que estavam sangrando. Logo que desci do palco, sem olhar para
mão, derramei sobre os dedos primeiramente um pouco de guaraná. Vendo que
estava tudo normal, apenas doloridos pelo esforço, fiquei mais tranqüilo e
segui em frente até o final daquele baile, sem problemas.
-
Shows em Parnaíba, com o Ednardo
Em
Parnaíba, fizemos dois shows com o
cantor e compositor Ednardo, realizamos um show no SESC, seguido de baile no principal clube da cidade. Na primeira viagem o
Big Brasa integrou uma caravana composta por apresentadores e artistas da TV
Ceará.
Destaque
especial para o show no SESC, onde o
conjunto se apresentou de uma forma impecável e foi muito bem recebido por uma
platéia calorosa e muitas fãs. Ao final da última música, uma senhora que
estava na frente do palco, aplaudindo freneticamente durante o tempo inteiro,
disse para mim que queria cortar um pedaço de minha orelha para ficar de
lembrança! Já pensaram? Ela devia ser alguma parente do Mike Tyson para ter
esse desejo...
Sobre
esta mesma apresentação, vale também registrar que o conjunto teve dificuldades
para deixar o palco, localizado no auditório, que ficava no segundo andar do
prédio, em razão do verdadeiro assédio praticado pelas fãs. Eu e o Lucius, por
exemplo, passamos entre muitas garotas que aproveitavam para nos abraçar,
beliscar, beijar e pedir autógrafos, gritando freneticamente.
A
televisão realmente exercia uma força de propaganda significativa para o Big
Brasa no interior do Estado. De forma que podíamos estar com o grupo em
qualquer condição, mas sempre fomos muitíssimo bem acolhidos.
-
Em Mossoró, com o “Big”
No
Rio Grande do Norte, em Mossoró, o Big Brasa animou diversos bailes, dentre eles
o da formatura do Carló como engenheiro agrônomo. Essa festa de formatura da
Escola de Agronomia de Mossoró, a ESAM, foi um sucesso total. Havia uma
predisposição para que isso acontecesse, em função do Carló ser muito conhecido
na cidade (era chamado de “Big”, pelos seus colegas de turma e
demais conhecidos). Todos os seus amigos se integraram a nosso grupo e o baile,
que contou com presença de um grande número de pessoas, transcorreu dentro da
mais absoluta normalidade.
No
princípio era um jipe 51, que cabia todo mundo e mais o instrumental completo.
Não acreditam? É pura verdade. Uma bagunça danada, partes da bateria
espalhados, amplificadores minúsculos e algumas guitarras pequeninas e cabos.
Só isso, não tinha quase nada e dava para fazer a festa!
Ah!
Tenho que falar mais desta inesquecível fase dos jipes. Marcante também pelos
verdadeiros “estragos” que eles faziam em nossos bolsos em razão
dos inúmeros consertos que de vez em quando neles era necessário realizar. Em
contrapartida nos deram muitas alegrias. Passava na televisão, naquele tempo, o
seriado “Ratos do Deserto”, sobre episódios de guerra, no qual o
jipe modelo 42, que assemelhava-se ao 51, aparecia sempre. Eu fazia de tudo
para que o nosso jipe fosse um “Rato do Deserto”.
Se
você não se liga nesse papo de “pregos” em carros e oficinas, pule
esta parte. Agora se quiser se identificar comigo, sofrendo um pouco, vá em
frente. Às vezes eu passava dias inteiros na oficina do “Faúna”,
que localizava-se pertinho do Seminário Seráfico de Messejana, em um terreno do
lado direito de quem vai para Fortaleza pela Frei Cirilo, que antigamente era a
BR-116.
Para
manter os jipes em forma tínhamos que marcar presença constante nessas
oficinas. Um dia a parte elétrica, outro a carburação ou a caixa de marchas, a
embreagem. Mais raramente, por sorte nossa, um bloco de motor rachado ou
empenado, com uma junta do tampão queimada. Essas “coisinhas simples”
de resolver... Como eu tinha pouco dinheiro para pagar mecânicos o jeito foi ir
aprendendo a consertar de tudo um pouco, inclusive pintura, chegando ao ponto
de efetuar inúmeros consertos em casa, com recursos e ferramentas
próprios.
Certa
vez um desses jipes ficou quase um mês na oficina, para remendar a lataria e
fazer uma pintura nova. Paralelamente, o “Raimundo capoteiro”, que
ainda hoje trabalha no ramo, fazia uma capota conversível para transformá-lo em
clone de um “Rato do Deserto”, como aqueles jipes usados pelos
americanos que a gente vê nos filmes de guerra. Foi um verdadeiro sufoco, e
haja paciência para que o serviço fosse terminado. Na verdade a oficina não
podia se ocupar o tempo integral com nosso amigo jipe e ficava parando de vez
em quando para receber pequenos consertos. Mas valeu a pena. Quando o jipe saiu
parecia novinho em folha. Coloquei a capota nova e foi um sucesso total. Por
onde passava ou estacionava o jipe era muito observado. Tão observado que em
uma noite, enquanto tocávamos uma festa de 15 anos na Aldeota, tivemos uma bela
surpresa ao sair. Tinham furtado nosso jipe. Tristeza, decepção, queixa na
polícia e nada. Veio aparecer perto do Círculo Militar, três dias após da
ocorrência. Os ladrões, depois de terem usado e abusado do jipe, amassaram seu
"capô", rasgaram o estofamento dos bancos, capota, tudo. Foi uma
verdadeira sacanagem - essa é a palavra - feita talvez por um grupo de “filhinhos
de papai” daquela área.
Mas
com todos os problemas, o fato é que os jipes 51 eram muito resistentes,
ajudaram o Big Brasa em seu início e nos trouxeram muita sorte em nosso
aprendizado no volante, apesar de que, coincidentemente, no mesmo dia em que
recebi a Carteira de Motorista, tirada em um jipe, a tenha “inaugurado”,
com uma batida na uma traseira de um fusca que atravessou minha
preferencial. Mas isto é outra história ...
Em
algumas oportunidades, com o Big Brasa recém-formado, também utilizamos uma
Kombi, dirigida pela tia Maria de Lourdes, quando ela ainda era freira -
chamada de “Irmã Margarida”. Ela também nos incentivava bastante.
-
A Rural
Antes
da compra da nossa Rural, alugávamos a do Colares, um policial que fazia “bicos”
como motorista. O Colares chegou a fazer algumas viagens com o Big Brasa. Tipo
de policial alto e forte, cabelos grisalhos, sempre brincalhão e muito
tranqüilo. Em certa ocasião, nós achamos o máximo quando ele desceu a Serra da
Ibiapaba, na maior calma, assobiando e dirigindo apenas com uma das mãos. Hoje
em dia temos a consciência de que isso não é vantagem nenhuma, muito pelo
contrário. Lembro também que ele costumava brincar conosco, fazendo uma
demonstração de força que consistia em mandar cada um dos integrantes do
conjunto subir em uma de suas mãos, apoiada com os cinco dedos no chão, os
quais sustentava sem muito esforço. Depois conhecemos o “Seu”
Fernando, motorista de praça que nos prestou muitos serviços com a sua rural. O
Fernando “Galba”, como o apelidou o Adalberto, cuidava muito bem da
manutenção de sua rural e era super responsável com os compromissos do Big
Brasa.
Mais
tarde, com a aquisição da nossa própria rural, veio também o reboque que o
Mestre Alberto mandou fazer para levar o instrumental. Dava um trabalho muito
grande para dirigir a rural com aquele reboque enorme. Para guardá-la na
garagem, com o reboque engatado nem se fala, era dureza... Mais uma vez fomos
treinados intensivamente ao volante e adquirimos mais prática de estrada, como
se diz. Toda essa experiência foi importantíssima para mim.
Aquela
Rural, com bagageiro maior e na parte de cima, nos serviu muito. Tinha um bom
motor e mecânica razoável. Sua deficiência era na lataria, que vez por outra
estava enferrujando. Como a nossa rural tinha algum tempo de uso, possuía folga
na direção, o que sem dúvida se constituiu em um treinamento forçado para todos
aqueles que a dirigiram. Às vezes, quando em uma estrada de asfalto ela puxava
a direção para o lado esquerdo, ou seja, para a contramão, a situação ficava
complicada, pois tínhamos que corrigir o volante para lá e para cá, em virtude
da folga existente. Iniciava-se assim um vai-e-vem desgraçado, um verdadeiro
perigo...
- A Kombi “Big Brasa”
O
tempo foi passando e surgiu a oportunidade da aquisição de uma Kombi, o
transporte ideal para o grupo naquele tempo. A nossa era uma modelo 1959, azul
e branca, com o nome “Big Brasa” pintado nas laterais e na
traseira. Gratas recordações dessa Kombi, a qual por muito tempo serviu ao Big
Brasa. Era muito conhecida em Fortaleza.
Um dia, na volta de um passeio na Prainha, essa Kombi “bateu” o
motor. Como diz o ditado “há males que vêem para bem” e assim foi.
No reparo desse motor, foi transformada por mecânicos da Ceará Motor em uma
1968, praticamente “do ano”, ficando completamente turbinada.
Depois disso nunca nos trouxe problemas maiores e fez inúmeras viagens pelo
interior cearense.
Com
o objetivo de impressionar a todos e chamar mais atenção eu mandei instalar na
Kombi uma descarga tipo “Kadron”, muito barulhenta. E usava um
truque para espantar os pedestres: desligava a chave com o motor em funcionamento
e uma marcha de força (uma segunda, por exemplo) engrenada até que a velocidade
fosse reduzindo e a compressão do motor aumentando, logicamente. Aí então
ligava a chave e ouvia-se uma verdadeira “explosão” na descarga,
que assustava quem estivesse passando por perto na hora.
Certa
vez, para emplacá-la no DETRAN, tive que passar por uma vistoria. Daí eu enchi
o cano de escape com bombril, para abafar o ruído. Meu truque não deu certo,
apesar de testado anteriormente. Falhou na hora em que o fiscal mandou que eu
acelerasse bem o motor. O bombril saiu por completo e eu tive que voltar para
Messejana, nada satisfeito, para colocar uma descarga normal. Depois de
emplacada, o teimoso João Ribeiro trocou a descarga nova pela Kadron de novo
...
-
A Chevrolet de duas cabines
“Massa”,
seria o adjetivo usado hoje para qualificar aquela camionete. Verde, com duas
cabines, seis faróis (os de milha eu acrescentei), a “Chevrolet”,
como a chamávamos, foi de grande utilidade para o Big Brasa. Para completar
aquele carrão eu mesmo nela instalei um som, com amplificador, e alto-falantes
bem distribuídos pelas duas cabines. Para os padrões da época, o máximo. Íamos
para as festas ouvindo as músicas anteriormente ensaiadas ou então aquelas que
a gente ainda tinha que aprender para colocá-las no repertório do Big Brasa.
Assim a gente unia o útil ao agradável.
Essa
Chevrolet, segundo o Mestre Alberto, foi um verdadeiro atraso de vida para ele,
pelas despesas que deu em razão de alguns problemas mecânicos. Em viagens ela
agüentou firme várias vezes, inclusive no dia em que fez duas viagens de
Fortaleza a Mossoró, no mesmo dia, transportando equipamentos do Conjunto e
nosso próprio grupo para o baile de formatura do Carló.
No entanto, em uma noite quando voltávamos de
uma festa, de Messejana à Fortaleza, pela antiga BR-116 antes de sua
duplicação, perto ou quase em frente ao DNER, ela deu uma pifada violenta.
Simplesmente “apagou” o motor e não “pegava” mais.
Tentamos de tudo. Como a gente já era diplomado em mecânica, após ter passado
por três jipes 51, verificamos a parte elétrica, a alimentação, bomba de
gasolina, corrente da bobina, tudo. E nada de encontrar o defeito. Teve que
sofrer a humilhação de ser rebocada de volta.
O
difícil problema foi descoberto apenas no outro dia: um pequeno cano de
alimentação de combustível, por baixo da camionete, que estava obstruído,
provavelmente em razão de alguma pancada. Haja paciência...
Sobre
essa camionete, um fato interessante: um dia, quando meu pai estava em seu
trabalho na TV Educativa, um dos diretores, em conversa informal com ele,
contou que uma vez tinha conseguido se desfazer de um “verdadeiro abacaxi”
(que era a tal Chevrolet), empurrando-a para a frente, como se diz, pois o
carro tinha incendiado em suas mãos e, mesmo depois de consertado, nunca mais
ficou legal.
O PRIMEIRO ANIVERSÁRIO DO BIG BRASA
A primeira festa de aniversário do Big Brasa foi realizada
no dia 28 de abril de 1968, no Balneário Clube de Messejana, com música o dia
inteiro: matinal, vesperal e tertúlia, entrando pela noite. O símbolo desse
primeiro aniversário foi uma flâmula em forma de uma guitarra vermelha e
branca, com os dizeres alusivos à festa.
Na
matinal atuaram os conjuntos “Os Rataplans”, “Os Belgas”
e o “Big Brasa”. À tarde e noite “Os Milionários, a ala
feminina do Big Brasa, e novamente o Big Brasa. Pode-se afirmar, com certeza,
que foi uma das maiores e melhores festas do Balneário, com um participação
maciça durante toda a festividade. Com um detalhe: também foi uma das primeiras
festas dessa natureza a ser transmitida pelo rádio, com participações ao vivo!
A flâmula ao lado foi distribuída na entrada do clube a todos os participantes,
como lembrança do evento.
A
Diretoria do clube nos ofereceu um troféu, em comemoração a nosso primeiro
aniversário e pelo reconhecimento de nosso sucesso em Fortaleza. Durante o
evento houve uma confraternização geral entre os conjuntos participantes,
dentro de um clima de amizade e coleguismo.
Não
houve lucro financeiro na promoção. Além das “cortesias” e de muita
gente “furar” a portaria, as despesas com os lanches dos conjuntos
foram enormes. E a minha mãe ainda doou uma máquina de costura nova, que foi
sorteada durante o evento. Por outro lado, os efeitos publicitários foram muito
bons, pela grande repercussão obtida por essa festa.
A ALA FEMININA DO BIG BRASA
Incentivadas
pela formação do Big Brasa, Célia Alencar, Aliete Lima, Lucinha, Neide e
Adriana Oriá formaram a ala feminina do grupo.
Foi
como uma brincadeira, mas chamou a atenção da moçada de Messejana. As meninas
ficaram empolgadas com o Big Brasa e resolveram ensaiar algumas músicas. Com o nosso instrumental, chegaram a se
apresentar algumas vezes nos intervalos das festas do Balneário Clube de
Messejana, sempre com bastante agrado em face da novidade.
PROMOÇÕES REALIZADAS PELO BIG
BRASA
O
Big Brasa realizou diversas promoções por sua conta e risco, no Balneário Clube
de Messejana. Isso acontecia, na maior parte das vezes, quando não tínhamos
contrato para uma determinada data e desejávamos preenchê-la. Em algumas delas
o conjunto obteve sucesso, mas em outras foi prejudicado pelo famoso “jeitinho
brasileiro”, de querer levar vantagem em tudo.
Para
começar, nesses eventos a diretoria do Clube sempre ficava com a renda do bar,
deixando a venda de entradas na portaria para o conjunto. Aí é que a “coisa
pegava”. Enquanto uns compravam ingresso normalmente, muitos queriam “botar
todo mundo para dentro” do clube sem pagar, a qualquer custo. Muitos se
diziam diretores. Alguns membros da diretoria efetiva usavam de sua influência
para colocar pessoas no clube sem pagar ingresso. E muitos ainda tentavam
entrar sem pagar pulando o muro. Houve inclusive um caso em que um grupo de
rapazes entrou nadando pela lagoa de Messejana, com a roupa na cabeça para não
molhar - essa foi demais, incrível! Mas não tinha jeito, a mentalidade de
alguns era essa...
OUTRAS COMEMORAÇÕES DE ANIVERSÁRIO
O
segundo aniversário, em 27 de abril de 1969, foi realizado no Recreio do
Funcionário - Clube de Campo, na Lagoa Redonda, tendo como convidados especiais
os sócios do Balneário Clube de Messejana. Abrilhantaram aquela festa mais dois
conjuntos, “Os Milionários” e “Os Belgas”. Naquele dia os “Belgas” estavam
demais. O grupo, composto pelo Edson Girão, Eudes, Ricardo e Júlio, deu um show à parte no que se refere a
vocalização. Tocavam e cantavam os arranjos dos “Beatles” de
maneira espetacular, o som bem ajustado, tudo cem por cento.
No
dia 22 de maio de 1971 comemoramos nosso quarto aniversário no Clube “General
Sampaio”, no centro da cidade. Muita gente boa esteve presente naquele
dia. O Brasa Seis, um dos melhores conjuntos da época, tocou uma parte da festa
durante o dia. O pessoal da televisão esteve por lá em peso e curtiu bastante.
AS MATINAIS DO CLUBE DE REGATAS
Era
o que se pode dizer uma parada dura, quando tínhamos que enfrentar aos domingos
uma matinal no Clube de Regatas após um baile no sábado, quase sempre muito
cansativo. Quando isso ocorria eu não participava da desmontagem do material na
noite anterior, voltando imediatamente para casa para ganhar um tempo a mais de
sono. Chegava dos bailes, na maioria das vezes entre três e cinco horas da
manhã em casa e dormia muito pouco. O pessoal que cuidava do instrumental
(motoristas e bigus) se deslocava mais cedo para ir montando tudo. Difícil mesmo era para acordar
e apressadamente tomar um café da manhã, para nos deslocarmos para o clube. Nós
chegávamos quase na hora, a tempo de afinar os instrumentos e logo começar a
função. Mas tudo isso valia a pena, pois nosso rendimento aumentava no final do
mês.
REGISTRO DE
APRESENTAÇÕES – O MAPA “ROUBADO”
Mais
ou menos em 1972 eu organizei um mapa, feito em uma folha de cartolina, contendo
aproximadamente 500 apresentações feitas pelo Big Brasa. Tive muito trabalho na
elaboração desse controle, para recuperar ao máximo possível as funções
musicais em que o Big Brasa atuou. Esse levantamento continha indicações dos
locais, clubes, cidades e às vezes até mesmo os nomes dos aniversariantes. Esse
precioso controle infelizmente caiu nas mãos de um gatunozinho safado,
certamente admirador do conjunto. Daí por diante fizemos mais centenas de
apresentações, inclusive as da televisão, mas não houve mais a preocupação e
nem a paciência de manter registros com
tal precisão.
O CONSERVATÓRIO DE MÚSICA “ALBERTO
NEPOMUCENO”
Época
de vestibular. No primeiro exame prestado eu me inscrevi para Medicina e apenas
por três questões, não obtive aprovação. Deus sabe o que faz. Ainda bem, porque
não teria sido um bom médico, por falta de vocação. No outro semestre, eu e a
Aliete resolvemos prestar exame, desta vez para Licenciatura em Música. O
Conservatório de Música Alberto Nepomuceno tinha sido encampado pela Universidade
Estadual do Ceará (UECE) e iria iniciar sua primeira turma. Conseguimos êxito,
o que para mim foi mais um tento, uma vitória. Estava totalmente envolvido com
o meio musical e “respirava” música o tempo todo. Para ter uma
idéia, nesse período eu era guitarrista do Big Brasa, trabalhava na TV
Educativa como sonoplasta e na TV Ceará como produtor musical do programa “Show
do Mercantil”. Além disso fazia apresentações ou realizava outras funções
como música ambiente para recepções e casamentos, como tecladista.
Durante
os quatro anos de Conservatório, aprendi muita teoria e técnicas musicais com
os experientes professores, de modo especial com a D’Alva Stela, a Repegá
Fernanian, a Nísia, a Afonsina, o José Mário, dentre outros. Se bem que eu
esperava mais, principalmente na parte prática e técnica de instrumentos. Para
se ter uma idéia, houve diversas cadeiras em que os professores me dispensaram
porque não tinha sentido, diziam eles, visto que eu conhecia a matéria.
Pressionava muito esses professores, dizendo que eu estava ali para aprender
mais e não para ser dispensado de aulas.
Dentre
as cadeiras, fora as do ano básico, constavam História das Artes, Canto Coral,
Técnica Vocal, Regência, Som e Ritmo, Prática de Instrumentos (cinco semestres)
e Harmonia.
Depois
de bem ambientado no Conservatório, vale dizer, sobre uma das etapas do curso,
que iniciei a cadeira de Harmonia plenamente confiado nos conhecimentos
práticos que o Big Brasa tinha me proporcionado e na experiência do dia-a-dia.
Quase que entro pelo cano. Tive dificuldades com a matéria, principalmente ao
fazer encadeamentos harmônicos e pequenos arranjos para orquestra. Se não
tivesse estudado para valer teria sido reprovado naquele semestre. Ao final,
como “NTI”, apresentei uma composição intitulada “Entre pelo
Cânon” (da qual ainda mantenho a partitura original), tendo conseguido
nota dez.
Foi
uma faculdade muito interessante e no decorrer dos quatro anos de estudo
fizemos muitos amigos. Chegamos a participar ativamente do Coral e fizemos
algumas apresentações. Tenho ainda as partituras das músicas que cantávamos.
Com a formatura, o Conservatório, através da UECE, nos proporcionou o Nível
Superior, que futuramente veio a ser essencial para minha carreira em outra
área de atividade.
A PARTICIPAÇÃO DO BIG BRASA NA TELEVISÃO
O
Conjunto Big Brasa teve uma presença marcante e freqüente na televisão
cearense, por quase sete anos, fator que influiu de forma significativa na
divulgação do grupo em Fortaleza e de modo especial no interior cearense.
O
ingresso do Conjunto na televisão deu-se por ocasião de um Festival Nordestino
da Música Popular, quando o Big Brasa acompanhava o Ednardo, na música “Beira-Mar”,
no Náutico Atlético Cearense. Nessa ocasião o conjunto estava muito bem
ensaiado e produzia arranjos musicais belíssimos nas músicas que executava. Na
final desse festival a música do Ednardo tirou o primeiro lugar, fato
amplamente noticiado através da imprensa local.
Nesse
apresentação o grupo foi observado pelo radialista e apresentador de TV,
Augusto Borges, que comandava naquela época o programa “Show do Mercantil”,
levado ao ar aos sábados pela TV CEARÁ, Canal 2, antiga emissora de Rede Tupi
de Televisão (cujo logotipo era um indiozinho). Esse programa era patrocinado
pelo Mercantil São José. Pois bem, o Augusto ficou empolgado com o Conjunto e
naquela oportunidade nos convidou para participar de seu programa. Assim foi o
início de nosso contato com a televisão.
O PROGRAMA “SHOW DO MERCANTIL”
O
Show do Mercantil, levado ao ar aos sábados, pela extinta TV Ceará, Canal 2, da
Rede Tupi de Televisão, quase sempre apresentava muitos quadros interessantes e
de bom conteúdo. Durante muito tempo do programa o “layout” do
palco do Show do Mercantil tinha como pano de fundo o Big Brasa. Assim,
qualquer que fosse a atração, estávamos lá aparecendo na TV, o que contribuiu
de forma significativa para nossa maior divulgação no interior do Estado.
No decorrer dos programas o Augusto Borges
freqüentemente se dirigia ao Big Brasa, fazendo um comentário ou simplesmente
brincando com algum de nossos componentes. Desse modo nossa imagem se propagou
rapidamente e nos tornamos muito conhecidos pelo público em geral.
-
Como era o Show do Mercantil
Durante
o período letivo o quadro Colégio contra Colégio encarregava-se de animar o
programa suficientemente, pelas disputas entre os estudantes. Tínhamos que nos
policiar no que diz respeito à postura no palco, pois o tempo de duração era de
duas horas e meia e cansava ficar todo esse tempo em pé. Nos intervalos a gente
saía “de fininho” para a ante-sala, para bater papo e descansar um
pouco. Para quem fumava era uma boa, pois dava tempo para acender um cigarrinho
de leve.
-
Seleção de calouros - uma “boca quente”
A
participação musical do Big Brasa no Show do Mercantil iniciava às noites das
quartas-feiras, quando eu, na qualidade de produtor musical, fazia uma seleção
de calouros para se apresentar no programa seguinte. Tudo funcionava assim: no
auditório da TV Ceará os candidatos chegavam cedo. Eu iniciava o ensaio por
volta das 20:00h. Ao piano, no palco, ia chamando os calouros por ordem de
chegada e, um a um, perguntava-lhe que música que gostaria de ensaiar. Depois
do acompanhamento de cada candidato, fazia algumas anotações para escolher os
melhores ao final. Tive que enfrentar vários problemas, de gente desafinada e
sem ritmo, mas que pensa que sabe cantar. Em cada ensaio eu ouvia em média
trinta candidatos para escolher apenas quatro, estes que ensaiariam na
sexta-feira com todo o conjunto. Às
vezes a escolha ficava difícil e eu tinha que escalar os menos ruins, de
qualquer jeito...
Num
desses ensaios, ao anunciar a relação dos quatro calouros para sexta-feira, um
cara, alto e desengonçado, veio me questionar sobre o porquê de não ter sido
escolhido. Gentilmente expliquei a ele que deveria treinar mais, ouvir mais a
música escolhida, enfim, todas as explicações necessárias ao caso. Mas ele,
inconformado, cada vez mais ia se exaltando. E eu também ia perdendo a
paciência, que nunca foi grande mesmo. Ao final, virei para o “candidato
a calouro” e tive que lhe dizer a verdade, nua e crua:
-
Meu amigo, sem ritmo, cantando desafinado e errando a letra da música, não dá.
É por isso que você não tem condições para se apresentar. E sendo assim,
enquanto eu estiver aqui, você não cantará no programa.
Foi
o suficiente para que eu recebesse um desaforo e uma ameaça de tiro, que
felizmente ficou só na ameaça.
Ao
contar o fato para o Augusto Borges, mencionando a ameaça recebida, ele me
perguntou, com a maior calma:
-
Beiró, o cara disse mesmo que iria atirar em você?
-
Sim, respondi preocupado.
-
Então pode ficar sossegado que ele não vai fazer nada, tranqüilizou-me.
-
O ensaio geral do Show do Mercantil
Realizado
às sextas-feiras, quando o “script”, ou roteiro do programa estava
pronto. Quase sempre enfadonho, principalmente quando a produção tinha algum
novo elemento querendo “aparecer”. No que se refere à parte musical
o conjunto Big Brasa ensaiava com os calouros todas as músicas, com
introduções, até que ficassem “no ponto”, nem que fosse no ponto de
errar no sábado, como alguns faziam, face ao nervosismo ... Depois desse ensaio
geral as entradas das músicas eram repassadas de forma muito rápida, só para
relembrar, no sábado, antes do início do programa, com o Big Brasa no palco do
programa, a postos.
-
Artistas que o Big Brasa acompanhou
Vários
foram os artistas que o Big Brasa acompanhou, muitos de projeção nacional.
Foram seis anos e meio, com atrações todos os sábados e em muitos desses
programas cantores de fora, quase sempre vindos do sul do País.
A
seguir estão listados alguns deles, em ordem alfabética: Adriano (Francisco de
Assis), Carlos Imperial, Belchior, Cauby Peixoto, Cláudia Barroso, Demétrius,
Dóris Monteiro, Ednardo, Jorge Melo, Luís Vieira, Mardônio, Márcio Greick,
Pablo Sebastian, Rodger, Sandra, Wanderley Cardoso, dentre outros.
-
Nosso encontro com o “Rei do Baião”
Em
uma das tardes de sábado, o Big Brasa estava cumprindo função no Show do
Mercantil. Com o auditório praticamente lotado, o programa naquele dia
apresentaria muitas atrações. Não seria monótono, como em outras vezes.
A
produção musical, de minha responsabilidade, tinha preparado alguns novos
cantores da terra, saídos da seleção de calouros. Além disso apresentaria o
próprio quadro de calouros e alguns números do Big Brasa, músicas de sucesso
recentemente ensaiadas. Nessa época, havia um quadro chamado “Fora de
Série”, no qual se apresentavam mágicos, malabaristas, contorcionistas,
enfim, todas as pessoas que faziam alguma coisa diferente, motivo de atração.
Esse quadro permaneceu no ar por muito tempo e tivemos a oportunidade de
presenciar várias cenas ou atrações super interessantes. Para aquele dia, a
produção do programa, através de diversas “chamadas” - pequenos
comerciais do programa exibidos durante a programação durante a semana - tinha
anunciado uma grande surpresa para o público.
No
início do programa, o Augusto Borges adiantou a atração, que seria o famoso
compositor e músico Luiz Gonzaga, nada menos do que o “Rei do Baião”,
como ficou conhecido internacionalmente. Durante os intervalos, de pequena
duração, a gente saía um pouco do nosso palco, que ficava na lateral do cenário
principal, para conversar com o pessoal da produção e outros colegas, na
ante-sala do programa, bastante movimentada. Nesse dia, estávamos também
querendo ver, de perto, o “Rei do Baião”. Em uma dessas saídas, nos
deparamos com o Luiz Gonzaga, na ante-sala, sentado com sua sanfona, calmamente
aguardando a vez de sua apresentação. O meu pai, muito entusiasmado com aquele
encontro, visto ser um dos fãs daquele artista, disse para o pessoal do
conjunto, na frente do Luiz Gonzaga, em tom de brincadeira:
-
Vocês deveriam se perfilar e fazer continência, em homenagem a “esta
verdadeira fera”, referindo-se ao Luiz Gonzaga.
Ele
permaneceu sentado e, sorrindo bastante para todos nós, respondeu:
-
Deixe os meninos, que eles estão “na deles”...
E
nós todos cumprimentamos o famoso Rei do Baião, com muita satisfação por mais
aquele encontro com gente famosa. Naquele momento, o Luiz Gonzaga deixou a
impressão, para mim, de ser um artista extremamente simples e simpático, além
naturalmente de tudo aquilo que produziu em seu inestimável legado musical.
-
Os operadores de câmeras
Os
que trabalharam durante mais tempo conosco foram o Fred e o William. Eles
tinham que ter muita agilidade nas operações com seus equipamentos,
particularmente no início, com as câmeras RCA, americanas, em preto e branco. Elas não possuíam o
recurso de aproximação, o “zoom”, tão comum hoje em dia em qualquer
filmadora. Na frente de cada câmera existia o que eles chamavam de “torre
de lentes”, ou seja, um conjunto de quatro lentes que eles tinham que
alternar de acordo com a distância dos objetos em foco. Havia o perigo, por
exemplo, de um câmera-man, inadvertidamente, mudar de lente quando a sua câmera
estivesse “no ar” - a chamada falha técnica.
De
vez em quando eu gostava de brincar com as câmeras e pedia para que os
operadores me deixassem trabalhar um pouquinho com elas durante os programas.
Isso acontecia mais com a câmera 3, que me parece era a que mais folgava.
-
A equipe de produção do Show do Mercantil
O
programa foi produzido por muito tempo pelo Tertuliano Siqueira, filho do
falecido guitarrista Paulo de Tarso, que hoje trabalha para o grupo do jornal “O
Povo”, auxiliado pelo Oliveira Martins. O “Terto”, como
alguns o chamavam, tinha boas idéias. Produzir e dirigir um programa de
televisão semanal, em Fortaleza, com duas horas de duração, não é fácil. O cara
tem que “se virar” para arranjar matérias e atrações. Entrevistas
diversas, artistas de fora do Estado e curiosidades, como o quadro “Fora
de Série” faziam parte do show.
O
Big Brasa quase sempre apresentava um número na abertura e mantinha algumas
músicas para preencher alguma lacuna. Acompanhava a apresentação dos calouros e
praticamente todos os cantores que vinham do Sul do País para temporadas em
Fortaleza. Adquirimos muita experiência musical por causa disso. Tínhamos mesmo
que saber, ou seja, conhecer bem as harmonias, os acompanhamentos de tudo que é
música ou então “ter ouvido” para pegar o acompanhamento na hora do
ensaio, rapidamente. E depois, memorizar tudo aquilo para não falhar durante o
programa, sempre realizado “ao vivo”.
-
A distribuição das sacolas e brindes
Um
dos momentos que mais agradava ao público presente no auditório, que ficava
bastante agitado, era quando o Augusto Borges mandava distribuir as sacolas do
Mercantil São José, sempre recheadas com diversos produtos de qualidade. O
Mercantil encaminhava para a TV Ceará uma porção de mantimentos, que ficavam
armazenados em um depósito para serem acondicionados em sacolas e distribuídos
ao público no decorrer dos programas.
Todos os participantes do Big Brasa recebiam uma
sacola, às vezes até mais de uma. O motorista, Fernando “Galba”,
bigus, auxiliares, pessoal da produção do programa, todo mundo se fazia
direitinho.
-
As paqueras durante o programa
Sempre
havia muita movimentação no Show do Mercantil, de modo especial quando o
período escolar tinha início e o quadro “Colégio contra Colégio”
também. Auditório lotado, muita gente mesmo. Nos bastidores do mesmo jeito.
Quem conhecia as dependências da TV Ceará, seus corredores amplos, sabia como
chegar ao auditório do programa “por dentro”. E aí ficava sempre
meio tumultuado, com o pessoal querendo ver os artistas, batendo papo,
desejando receber uma sacola “por fora”, o que não era
permitido. Na realidade, sempre
estive muito ocupado - e preocupado -
durante o programa para que tanto a minha participação como produtor musical e
a do Big Brasa fossem satisfatórias. E nesse clima havia paqueras de todo o
lado, além de sempre existir um grande batalhão de meninas e moças que
desejavam “entrar” para a TV de qualquer modo, como cantora ou
garota-propaganda.
-
A repercussão do “Show do Mercantil” no interior do Estado
Se
em Fortaleza a televisão divulgava o Big Brasa suficientemente, no interior a
penetração do Big Brasa era intensa, a divulgação era enorme. No início apenas
a TV Ceará existia. E por isso mesmo durante muitos anos sua imagem foi única no interior do Estado, em se tratando
de grupos musicais.
Imaginem
só, nos anos de 1970, um conjunto que aparecia todos os sábados num programa de
audiência total no interior, visto que a EMBRATEL ainda não possibilitava
transmissões do Sul do país. Quando o Big Brasa chegava a qualquer cidade
interiorana, obtinha enorme repercussão. Em muitos municípios fomos recebidos com
faixas de boas-vindas na frente dos clubes! A rapaziada local ficava com um
ciúme danado por que suas paqueras e namoradas se voltavam para nós, tudo muito
natural, por ser novidade, essas coisas
de tietes.
Foi
nesse esquema que praticamente se desenrolou a bem sucedida etapa televisiva do
Big Brasa, cujos episódios serão motivo de diversos enfoques nesses registros.
O PROGRAMA “ESTÚDIO
Programa
de muita audiência, no qual o Big Brasa se apresentou por quase três anos.
Levado ao ar diariamente pela TV Ceará, cada programa abordava, através de
entrevistas, temas diversos, dirigidos principalmente às mulheres. Diversos
artistas nacionais, cantores, pessoal de teatro e outras personalidades de
destaque participaram do “Estúdio 2”.
Dentre
os que eu lembro, a Dercy Gonçalves, do mesmo jeito que está agora, com as
brincadeiras, mas com bem menos palavrões, tendo em vista a censura existente
no período. O famoso músico Zé Menezes também foi acompanhado pelo Big Brasa.
No dia em que esteve no programa, ele usou minha guitarra, para executar alguns
solos e improvisos.
Às vezes a contra-regra produzia um cenário um
pouquinho melhor do que as simples cortinas e tapadeiras, que eram divisórias
de compensado para encobrir um ou outro defeito do cenário. Colocavam mesas e
cadeiras como num bar, com platéia, e o
ambiente ficava mais alegre e descontraído. A luta do pessoal do estúdio era sempre no sentido de manter o silêncio
daqueles que não estavam em cena, para não atrapalhar o programa , realizado
“ao vivo”.
Durante
praticamente toda a semana deixávamos o instrumental no amplo estúdio da TV
Ceará onde se realizava o “Estúdio
Nós
costumávamos dividir as despesas com a gasolina. Nunca deixamos de cumprir esse
horário, certinho.
O som do “Estúdio 2” sempre foi melhor que o do
Show do Mercantil. Deve-se isso, com certeza, aos operadores de áudio e de
microfones, além da própria acústica do ambiente. No estúdio a distribuição se
fazia com uma “girafa”, que para quem não sabia é um suporte bem
grande, na forma de um guindaste, que podia movimentar o microfone por cima de
todo mundo, captando bom o som de cada cena. Havia também os microfones de
lapela e os “varacionais”, explico: como a TV não possuía
microfones direcionais, aqueles que captam bem o som em uma determinada
direção, o pessoal da equipe técnica adaptava um microfone comum, forrado com
esponjas, a uma vara ou haste de metal ou madeira. Por causa dessa
improvisação, ficaram conhecidos por nós como os microfones “varacionais”.
Os
câmeras procuravam “detalhes” em todos os lugares que podiam para
ser mais criativos. Lembro-me muito bem do William (o “Irmão”, já
falecido), do Fred (atualmente na TV Educativa) e o Zé Lenir, o mais calmo e de
menos iniciativa. O “Irmão” e o Fred se destacavam como bons
profissionais. Na verdade eles eram muito bons mesmo. O Fred, bastante
dinâmico, se deslocava rapidamente para conseguir os melhores ângulos para as
imagens que o suíte (diretor de imagens) solicitava. Por falar em “suíte”,
os dois diretores de imagens que mais trabalhavam naquele tempo nos programas
em que o Big Brasa participava eram o Dedeco (Aderson Maia) e o Gonzalez, este
principalmente no Estúdio 2. Bem, eles nos colocavam “no ar”
diversas vezes sem estarmos tocando, em qualquer posição que estivéssemos, de
preferência quando a gente não notava que seria focalizado. Numa dessas vezes
que os câmeras ficavam procurando o que mostrar pelo estúdio o Fred ficou me
focalizando um tempão e eu, que estava prestando atenção ao que estava sendo
exibido no programa, não notei. Deu sorte porque minha imagem não tinha ido ainda ao ar. Quando
notei o Fred tentando me enquadrar, num ato impulsivo e de pura brincadeira,
“dei o dedo” para a câmera. Resultado: depois do programa o
Gonzalez desceu da “Engenharia”, como chamávamos, e me deu uma boa
chamada, dizendo ele que “quase” apertou no botão que levaria
aquele gesto para todos os cearenses.
O
conjunto fazia em média dois números por programa. No decorrer dessa temporada
a propaganda que o conjunto conseguiu foi enorme, por aparecer diariamente na
TV. As músicas quase sempre eram sucessos do momento, cantadas pelo Edson ou
pelo Lucius. Tocávamos “temas” de improviso e blues, ocasiões em que eu aproveitava para “tirar” sons
de todas as maneiras que sabia, na guitarra, fato que contribuiu para minha
relativa projeção como guitarrista-solo em Fortaleza.
Conseguimos
um fã-clube espalhado pelo interior do Estado. Todos os dias recebíamos cartas
e mais cartas. Umas eram dirigidas ao Conjunto Big Brasa, de um modo geral.
Outras eram destinadas aos músicos, em particular. Acho que os campeões de
correspondência eram o Edson Girão e o Lucius.
Ainda
hoje mantenho quase todas as cartas que recebi, muitas delas com fotos e até
declarações amorosas, com muito carinho e afeto. Sentia um prazer enorme ao
receber cada cartinha daquelas. Andei respondendo muitas, pessoalmente. Depois,
pela falta de tempo, contratamos uma amiga que respondia tudo por nós.
Tive que fazer uma fotografia minha ao
lado do caminhão de transmissões externas do Canal 2 e distribuí 500
(quinhentas) cópias para o fã-clube do conjunto no interior do Estado. Hoje em
dia ainda mantenho estas cartas bem guardadas, pois fazem parte de nossa
memória.
Ainda
sobre fotografias do conjunto, é bom contar que fizemos uma
“mutreta” um dia, quando um cara estacionou com um automóvel
conversível “Lorena”, em frente ao Canal 2, para resolver algum
assunto de seu interesse. Como estávamos aguardando o horário do Estúdio 2 entrar
“no ar” chamamos rapidamente o fotógrafo da televisão e fizemos uma
pose junto ao tal carro. Foram feitas centenas de fotos e enviadas também para
o interior. Isso certamente contribuiu para nossa imagem de conjunto
“rico”, com o carro dos outros ...
Tínhamos
que inventar novidades. Eu às vezes até abusava dos pedais (distorção e
"wah-wah") e brincava com os câmeras que se aproximavam demais de
minha guitarra no intuito de mostrar minha aliança para as fãs do interior.
De
tão acostumados com as câmeras e com o pessoal do estúdio todo, contra-regras,
operadores de microfone, os próprios câmeras-man, a gente se divertia muito. Eu
não perdia nenhuma oportunidade de improvisar sobre os temas das músicas que
tocávamos. Era uma boa forma de exercitar e também de mostrar para o Ceará
inteiro nossas habilidades.
No
entanto um dia o produtor do programa resolveu abrir mais um espaço para uma
entrevista com o conjunto, a pedido das fãs. O entrevistador foi o Flávio
Torres. Dirigiu perguntas principalmente para o Lucius e algumas para mim,
sobre nossa atuação em Fortaleza, quis saber se respondíamos as cartas do
pessoal, enfim um bocado de coisas. Fiquei, como sempre, um pouco nervoso ao
ser entrevistado. Senti que o sangue me fugiu e que deveria estar muito pálido.
Mas felizmente a TV ainda era em preto e branco... Na foto que temos desta
entrevista aparece a atriz de novelas e apresentadora Carla Peixoto, da TV
Ceará.
Toda
a vez que eu tinha que falar em
público ficava um pouco nervoso. Podia cantar, tocar, enfim, fazer tudo, que me
sentia bem, completamente à vontade. Mas falar em público, principalmente na
televisão, que você fala para uma platéia e também para uma câmera, sempre foi
um problema para mim. Uma vez, por exemplo, ao gravar uma aula em vídeo para a
TV Educativa, no qual eu aparecia tocando uma música ao piano e em seguida
teria que fazer um comentário musical e falar um pouco sobre o Paulinho da
Viola, esqueci o texto várias vezes.
OS FESTIVAIS NORDESTINOS DA MÚSICA
POPULAR
Pouco
antes da final de um dos Festivais Nordestinos da Música Popular que o Big
Brasa participou em Recife, defendendo músicas do Ednardo, adquirimos, por
intermédio do tio João, em São Paulo, dois “wah-wah” de marca nova.
A idéia era usar um para a guitarra-solo e outro para o órgão. A aquisição
desses equipamentos foi um verdadeiro show de competência. Tudo muito rápido, o pedido ao tio João, a aquisição, a remessa
e enfim a chegada dos pedais em tempo recorde. Fomos receber a encomenda no
departamento de bagagens da VARIG, quase às 11 horas da noite. Deu tudo certo,
os pedais foram incorporados a nosso instrumental e utilizados de acordo com o
planejamento. Sobre esse evento, realizado em dezembro de 1971, trecho de uma
nota publicada por um jornal cearense:
-
“Está seguindo na próxima sexta-feira para a capital pernambucana a
equipe de compositores e intérpretes que apresentarão as composições
selecionadas em Fortaleza para concorrer ao II Festival da Música Nordestina.
Entre a turma de músicos cearenses destaca-se a participação do Conjunto Big
Brasa, que defenderá as músicas Beira-Mar e Rua do Ouro, classificadas em
primeiro e quarto lugares respectivamente”.
A
respeito desse Festival, que foi televisionado para todo o Norte e Nordeste (na
época uma transmissão por demais comentada), lembro de alguns acontecimentos
interessantes. Um deles ocorreu durante o ensaio geral, no Ginásio Coberto
localizado no bairro Embiribeira (idêntico ao Paulo Sarasate, porém mais bem
acabado, com alojamentos e restaurante, e com uma área externa maior). Pois
bem, o Big Brasa ao ensaiar com a orquestra de Recife, acompanhando Beira-Mar,
do Ednardo, o maestro ficou entusiasmado com a música e o arranjo. Também entre
os músicos da orquestra a opinião unânime foi a de que aquela música tiraria o
primeiro lugar. Mas, como para ganhar em Recife não tinha jeito mesmo, ficamos
apenas com um terceiro lugar e uma menção honrosa. Valeu, entretanto, a
reportagem de três páginas na extinta Revista “O Cruzeiro”, sobre
o Festival, transcrevendo com destaque e
na íntegra a letra de Beira-Mar e publicando a foto do Ednardo, acompanhado
pelo Big Brasa e pela orquestra de Recife.
Um
segundo lance desse festival: durante o intervalo da TV, quando nos
preparávamos para entrar “no ar” com o Ednardo, o público do
Ginásio, que estava completamente lotado, começou a vaiá-lo intensamente. E
tome vaia, mesmo porque eles vaiavam tudo que fosse do Ceará. Um cara da
platéia tocava uma buzina duas vezes e depois vinha a vaia. Estávamos todos muito nervosos, evidentemente.
Mas por felicidade e presença de espírito, talvez, peguei o tom daquela buzina
na guitarra e, com o “wah-wah”, após o cara tocá-la, reproduzi o
som no palco com a guitarra a plena altura. O pessoal gostou, o negócio virou
brincadeira, alguns aplaudiram até e a vaia cessou de repente. Foi ótimo para
todos nós. Por último faço questão de registrar aqui a verdadeira e
inadmissível “melada” do maestro da orquestra pernambucana, que na
hora de começar a apresentação do Ednardo, veio me perguntar o andamento da
música para fazer a introdução. Eu expliquei para ele e cantei as primeiras
notas da melodia, no andamento correto. Qual foi nossa surpresa quando esse
maestro iniciou Beira-Mar com um andamento completamente acelerado. Nosso
baterista estava com a orquestra. Foi uma luta nos segundos iniciais para
tentar fazer o andamento retroceder ao original, uma verdadeira briga entre a
orquestra e o Conjunto. De propósito ou não isso certamente contribuiu para
atrapalhar o Ednardo, que ficou mais branco do que pó de giz durante toda a
música. Esse “pequeno deslize” do maestro pernambucano, de
propósito ou não, prejudicou de forma significativa nossa
“performance” naquela noite.
Nas
folgas, depois dos compromissos com ensaios, saíamos em grupo para conhecer os
pontos principais de Recife. Quase tudo financiado pela TV Ceará, ou Diários e
Emissoras Associados do Ceará, da Rede Tupi. Conhecemos duas adegas muito
bonitas e aconchegantes, que apresentavam shows noturnos. A Adega do Bocage e da Mouraria. Estivemos também na praia da Boa
Viagem e em algumas boates da cidade.
A EVOLUÇÃO DO BIG BRASA EM TODA SUA EXISTÊNCIA BIG BRASA – CONJUNTO
REVELAÇÃO DE 1971
O
Big Brasa foi eleito o “Conjunto Revelação de 1971”. Uma nota sobre
o fato, divulgada através da imprensa, na coluna Mudando de Canal, dizia:
“Este
é o excelente Conjunto Big Brasa, exclusivo do programa Show do Mercantil,
comandado por Augusto Borges. O Big Brasa foi eleito como o conjunto revelação
do ano, em recente promoção da TV Rádio e Revista. Constituído por quatro
jovens, o conjunto já acompanhou destacados nomes da música brasileira. Fora da
televisão o Big Brasa é um dos mais solicitados para animar festas em Fortaleza
e no interior do Estado”.
O BIG BRASA EM EXCELENTE FASE
Em 1971 o conjunto estava atravessando uma de suas
excelentes fases. Através do Lucius conhecemos o Gilberto, um cara que tocava
cuíca em uma Escola de Samba, gente boa e fácil de lidar.
Em todos os bailes, depois do intervalo, quando a
festa estava no pique mesmo, o conjunto mudava seu esquema. O Adalberto largava
o teclado e pegava um surdo; o Sérgio Alves passava de bigu a ritmista, tocando
um ganzá enorme, que produzia um som muito legal; o Gilberto pegava a cuíca e
tome sambão. Todo mundo cantava e parecia muito com esses pagodes de hoje, bem
animados. Fizemos uma seqüência de sambas que podia durar até mais de uma hora,
se quiséssemos. Aí a coisa pegava fogo e o ritmo bem marcado daquela seqüência
de sambas contagiava todo mundo. Quem não era chegado a música jovem
aproveitava para descontar. Nosso visual contribuía para o sucesso, além da
parte musical. Usávamos naquela temporada uns “blazers” muito
bonitos, tudo combinando e super-elegante mesmo. Minha guitarra nessa época era
uma Diamond acústica, muito boa por sinal.
BIG BRASA – O CONJUNTO MAIS POPULAR DE 1972
Em 1972,
o Big Brasa recebeu o Diploma da TV Rádio e Revista e Prefeitura Municipal de
Fortaleza e o troféu “João Dummar”, frutos do Concurso “Os
Melhores do Rádio e da TV”. Efetivamente naquele ano o conjunto manteve
um padrão de qualidade musical constante, fruto de bons e freqüentes ensaios,
equipamentos e instrumental sempre “em cima”. Portanto, com toda a
modéstia, nosso grupo fez por merecer a referida homenagem.
A ENTRADA DOS “METAIS”
NO CONJUNTO
Pelo
meu gosto pessoal, desejava que nosso
conjunto sempre tivesse instrumentos de sopro, como piston, saxofone e
trombone. Mas em Fortaleza era muito difícil conseguir músicos jovens, mais ou
menos de nosso nível, para ingressar no Big Brasa. Quando precisávamos dos
“metais” para ocasiões específicas, a saída mesmo era contratar o
pessoal da “velha guarda”, músicos veteranos, quase sempre das
bandas de música da Polícia Militar e da Base Aérea de Fortaleza. Apesar disso
tivemos muitos períodos de sonoridade excelente, com a participação de “metais”.
O
Big Brasa teve por algumas vezes saxofonistas. O nosso saudoso Barretinho,
ex-integrante do grupo “Os Rataplans”, foi o primeiro a participar
do Big Brasa. De início, teve que nos ensinar várias músicas nas quais a
presença do saxofone era fundamental, de modo a incrementar nosso som. Esteve
no conjunto por uma curta temporada, mas nos transmitiu muito de sua
experiência e enriqueceu nosso repertório com sua participação. Muito animado,
contagiava todo o grupo e fazia coreografias enquanto tocava seu saxofone.
Mais
tarde tivemos o Cefas, de Ipaumirim, o Silvino e o Assis, que também trabalhou
com o “Brasas Seis”, além do Messias, este contratado para bailes
carnavalescos. Todos contribuíram muito para a diversidade de nosso repertório
e sua ajuda foi imprescindível, de modo especial nas festas realizadas no
interior do Estado, onde sempre tem que sair um forró, um “Saxofone por
que choras” ou outras músicas desse gênero.
Entretanto
a presença de metais no conjunto foi marcante com a chegada do Airton e
posteriormente do Mairton, ambos excelentes pistonistas, que abrilhantaram o
Big Brasa e em muito enriqueceram seu repertório. Airton e Mairton tinham
tocado juntos e tiveram sua formação musical na Banda de Música do Colégio Pia
Marta. Trabalharam também em outros conjuntos antes do Big Brasa. Com sua
experiência de arranjos com metais, principalmente no que se refere aos duetos
que faziam com os pistons, a sonoridade do conjunto mudou completamente, e
seguramente para muito melhor. Fazíamos arranjos modernos, com improvisações e
participações em arranjos de rocks,
bem como a execução de diversos clássicos para piston do gênero Herbert Albert.
-
Assim falou Zaratustra
Além
dos inúmeros clássicos para piston, com o Airton e o Mairton nós escolhemos um
prefixo novo. Chamávamos de prefixo a música escolhida para iniciar e encerrar
todos os eventos. O tema escolhido foi “Assim falou Zaratustra”,
magnífico, o qual, com um arranjo do Big Brasa ficou especial. Durante o prefixo, para iniciar o baile, fazíamos uma
coreografia bem marcada, muito legal, acompanhando o balanço de corpo dado
pelos pistonistas. O grupo praticamente só utilizou duas músicas como prefixo,
And I Love Her, dos Beatles e Zaratustra. Ambos tiveram suas fases marcantes e
são inesquecíveis para mim.
Graças
à providência de minha mãe, temos recordações dos bons tempos do Big Brasa
através de notas publicadas na imprensa. Com muito gosto, ela recortava as
notas e as guardava cuidadosamente para montar um álbum. Essas recordações
possuem um valor inestimável para todos aqueles que efetivamente participaram
dos Anos Dourados e, de modo especial, do Big Brasa.
-
“Big Brasa, excelente conjunto musical dirigido por um
Joseense”
Esta
foi a manchete de uma nota publicada em um jornal de São José dos Campos, São
Paulo, pelo jornalista Vantuílde José Brandão, que visitou Fortaleza em 1969.
Esse jornalista fala de sua amizade com meu pai, durante os vinte anos que
morou em São Paulo e destaca que dois participantes do Big Brasa são
“filhos da terra”, os seja, joseenses.
Depois
de algumas considerações sobre a composição do Big Brasa, diz que
“Fortaleza é uma capital de um milhão de habitantes e que possui mais de
cem conjuntos musicais, que atuam em seus clubes. Pois bem, “Big
Brasa” é considerado um dos melhores. O simpático conjunto atua nos
principais clubes de Fortaleza e já percorreu as principais cidades do Ceará e
de outros Estados. Alcançou pleno sucesso em Teresina, no Piauí e São Luís, no
Maranhão”.
-
“Big Brasa retorna quente de São Luís: Música Jovem”
Diz
a publicação: “O conjunto musical Big Brasa, um dos papas do iê-iê-iê,
depois de vitoriosa excursão a São Luís do Maranhão, retorna a Fortaleza para
animar as festas da gente jovem. Conjunto agressivamente musical e de excelente
qualidade musical, o Big Brasa tem uma característica moderna, tocando o ritmo
do iê-iê-iê, em suas diversas modalidades, como os sambas modernos ou a
bossa-nova, dentro do melhor estilo de Vinícius de Morais, de Tom Jobim e ainda
da música de protesto de Edu Lobo ou ainda de Gilberto Gil. Na capital Timbira
atuou nos melhores clubes, lavrando magníficos tentos”.
-
Big Brasa em Teresina
Nota de um jornal de Teresina:
- “Registramos a presença em nossa capital do
Conjunto Musical Big Brasa, radicado em Fortaleza, onde faz muito sucesso. São
seus integrantes Marcos Oriá, João Dummar Filho, João Ribeiro e Carlomagno Lima
(guitarristas), Severino Tavares (baterista) e Getúlio Ribeiro (mascote). Esses
rapazes são todos pré-universitários e aqui estão hospedados na residência do
Professor Raldir Bastos. Boas vindas, rapazes !”
O PESSOAL DO RÁDIO E DA TELEVISÃO
-
Aderson Maia
O
Aderson Maia, “Dedeco”, era diretor de imagens (suíte) da TV Ceará,
considerado por todos um excelente profissional. Os principais programas da
televisão necessariamente tinham que ser realizados por ele, pela qualidade de
seu trabalho. Gostava muito do Big Brasa e mostrava sempre as imagens do
conjunto, sob os melhores ângulos, quando de nossas apresentações. Destacava o
quanto podia os solos de guitarra e quando me encontrava pelos corredores da
televisão sorria, dizendo que eu era “uma fera”, gesticulando como
se estivesse tocando uma guitarra. Sempre elogiava minha atuação como
guitarrista-solo.
-
Antônio Mendes
O
Antônio Mendes (Toinho) foi um dos apresentadores do programa diário Estúdio 2,
da TV Ceará. Profissional de televisão correto e experiente era muito
solicitado para fazer comerciais ao vivo para muitas empresas de Fortaleza e do
interior cearense. O Toinho simpatizava bastante com nosso conjunto, visto que
sempre dizia uma brincadeira ou fazia alguma menção que valorizasse o grupo
antes de qualquer número na TV, ao vivo.
-
Augusto Borges
Apresentador do programa “Show do Mercantil”, levado ao ar
pela extinta TV Ceará, Canal 2, da Rede Tupi de Televisão. O Augusto Borges
contribuiu de forma significativa para o sucesso do conjunto, notadamente no
interior do Estado. Brincava sempre com os integrantes do Big Brasa durante os
programas, de modo especial na parte relativa à apresentação dos calouros.
Ainda gostava de dizer, quando o conjunto se apresentava com uma indumentária
nova, que tinha sido financiada por ele e coisas do gênero. Em razão da grande
divulgação através de seu programa, o Big Brasa foi considerado o Conjunto
Revelação de 1971 e o melhor conjunto de 1972, tendo recebido os Diplomas da TV
Rádio e Revista e Prefeitura Municipal de Fortaleza e o troféu “João
Dummar”, frutos do Concurso “Os Melhores do Rádio e da TV”.
-
Aurélio Brasil e o Lúbi-lúbi, na Rádio Assunção
Nossa
primeira apresentação no rádio foi em um programa na Rádio Assunção, comandado
pelo Aurélio Brasil. Tocamos uma três músicas em um estúdio super-apertado, sem
as menores condições técnicas para um conjunto musical. Naquele dia, o Luciano
“Lúbi-lúbi”, nosso amigo de Messejana e que também locutor daquela
rádio, recebeu algumas ligações de ouvintes dizendo que o conjunto estava muito
ruim e pedindo para nos tirar do ar. No entanto ele nos transmitiu os recados
sobre as ligações exatamente ao contrário, dizendo que o conjunto estava
agradando e que muita gente estava ligando pedindo para que tocássemos mais. Só
alguns anos depois, quando o Big Brasa estava com bem mais experiência, já despontando como um dos
melhores conjuntos de Fortaleza, bem
formado e em boa forma técnica e musical, ele nos revelou a verdade.
-
Ayla Maria
A Ayla
Maria, uma das melhores e mais afinadas cantoras de Fortaleza, além de ser uma
senhora extremamente fina, gentil e educada, por diversas vezes foi acompanhada
pelo Big Brasa. Sempre que se apresentava para os ensaios do Show do Mercantil
ou de qualquer outra apresentação, estava na companhia de seu esposo Armando
Vasconcelos. Eles informavam a música a ser ensaiada e ela cantarolava um pouco
da melodia para que eu pudesse pegar o tom na guitarra para acompanhá-la.
Quando
começava a ensaiar, interrompia a música logo no início e, invariavelmente,
solicitava que o conjunto subisse ou baixasse meio tom, hora que o Armando
Vasconcelos afirmava:
- Bem
que o finado Moreira sempre dizia, que Ayla “só canta em tons
intermediários”, com cara de entendido no assunto. Aí nós subíamos meio
tom e ela logo achava ótimo e tudo dava certo.
Acontece
que nessa subida de meio tom, muitas vezes a harmonia tinha que ser feita em
tons um pouco mais difíceis, particularmente para o tecladista. Essa situação perdurou somente por algum
tempo, até quando eu percebi que em muitas oportunidades o tom inicial estava
perfeito e que a solicitação de mudança era apenas para “fazer
charme”. Desse dia em diante, quando ela solicitava o primeiro tom eu
fornecia um Lá bemol ou qualquer “tom intermediário” como eles
chamavam, daqueles mais difíceis para fazer o acompanhamento. E não dava outra:
ela parava e pedia para subirmos ou baixarmos “um pouquinho” o tom,
fazendo os comentários de costume. Aí era só “correr para o
abraço”. Seriamente nós subíamos meio tom, para cair justamente nos tons
naturais, fáceis para todo mundo acompanhar, inclusive para os acordes no
teclado. Eles nunca perceberam nada, comprovando plenamente minha teoria
inicial. Toda a turma do Big Brasa já conhecia esse “macete” e era
só esperar para curtir muito depois.
-
Brito - “Britaleza”
Eletricista da TV Educativa, também
radioamador, cuja estação tinha o prefixo PT7-BZL (Brasil Zona Leste), conforme
anunciava ao rádio e “PX” (operador da Faixa do Cidadão). De grande
estatura e bom porte físico conseguia montar alguns tipos de
“plugs”, cortando os fios com as próprias mãos, enquanto nós
precisávamos de alicate. Foi meu amigo pessoal durante vários anos. Através de
nossa convivência aprendi muitos macetes de eletricidade e de montagens de
circuitos eletrônicos que usávamos em nossos equipamentos de radiotransmissão.
Em Mondubim, onde morava, juntamente com sua mãe, construía suas próprias
antenas para transmissão e outros acessórios, como compressores de áudio,
acopladores de antena dentre outros. Por várias vezes me ajudou em reformas na
parte elétrica de nossa casa, em Messejana. Para o conjunto Big Brasa, chegou a
executar um projeto de uma mesa de luz e de efeitos, de minha autoria. Depois
de concluída com pleno sucesso, essa mesa nos acompanhou por muito tempo.
-
Daniel Menezes
Também
radioamador de larga experiência, cuja estação tinha o prefixo PT7-CLN.
Trabalhamos juntos na TV Educativa, onde tive o privilégio de aprender com ele
muitos ensinamentos sobre televisão. Diretor de imagens experiente, conhecedor
de todas as áreas técnicas de uma televisão, conseguia transmitir sua calma
para toda a equipe nos momentos de maior agitação. Em nossa convivência diária
consolidamos uma firme amizade, baseada no companheirismo e no respeito
profissional.
-
Fátima Lima Verde
Muito
amiga do Big Brasa, gente fina e muito simpática. A Fátima foi também
integrante do grupo vocal “The Sangue Súgares”, estando presente em
muitos eventos dos quais o Big Brasa também participou. Por um bom período teve
a gentileza de nos ajudar a responder as inúmeras cartas de fãs, que chegavam
diariamente do interior do Estado, organizando a correspondência e enviando
fotografias.
-
Francisco Cabral
O Cabral, diretor técnico da TV Ceará, fazia o tipo
“durão”, com toda a sua seriedade. Com seus conhecimentos em
eletrônica e prática em equipamentos de transmissão, praticamente monopolizava
o mercado local de emissoras de televisão. Autorizou uma vez à equipe de
técnicos da TV, dentre eles o Bernardo e o “Spici”, a consertar os
equipamentos do conjunto em situações de emergência (quase sempre cabos com
defeito). Posteriormente trabalhamos juntos também na Televisão Educativa do
Ceará.
-
Gustavo Silva – “Gustavinho”.
Participava do
corpo de jurados do Programa Show do Mercantil, sempre com colocações
inteligentes, sensatas, precisas e bem-humoradas, demonstrando o seu bom senso
e seu conhecimento geral. Entre outras virtudes, além de ser um cara
extremamente “boa-praça”, possui habilidades como a de ser um ótimo
pianista e ter uma excelente percepção musical. Conhecido por toda a sociedade
de Fortaleza por sua simpatia, o
Gustavinho está colocado na relação dos verdadeiros amigos do Big Brasa. Sempre
nos demos muito bem. O Gustavo me incentivava muito em todas as apresentações do Big Brasa e eu sentia
realmente que ele ficava em perfeita sintonia com os solos de minha guitarra.
Esteve presente em diversos momentos do período áureo do
conjunto. De modo particular, compareceu a meu casamento com a Aliete,
juntamente com outros amigos e colegas de televisão. Ainda hoje o Gustavinho
marca sua presença na televisão cearense, sempre com sua ótima performance.
-
Isaíra Silvino
A
Isaíra Silvino, musicista, amiga, simpática e muito prestativa, era a líder do
grupo vocal “The Sangue Súgares”. Foi também minha
“conselheira espiritual” para assuntos de namoros e paqueras.
Estivemos juntos em uma temporada carnavalesca em Paracuru, com a nossa turma
toda. Nessa ocasião ela me orientou muito, principalmente no dia em que
exagerei um pouco na cerveja e, por não ser acostumado a beber, fiquei me
sentindo mal. Nesses momentos a Isaíra ficava perto e tinha cuidado de mim como
se fosse seu irmão.
-
Ivan Prudêncio
Ivan
Prudêncio era o discotecário da Ceará Rádio Clube, ligada à TV Ceará. Chegou a
fazer algumas gravações de músicas de sucesso, tiradas da discoteca da Rádio,
mas sempre colocando alguma dificuldade. Quando solicitado pelo conjunto para
emprestar algum disco de sucesso ou mesmo fazer uma gravação para que
aprendêssemos alguma música nova, botava a maior banca. Um bom profissional,
mas que superdimensionava sua posição.
-
Ivo Prudêncio
Sonoplasta
da TV Educativa, Canal 5. O Ivo também exercia o magistério, como atividade
paralela. Irmão do Ivan Prudêncio. Trabalhamos juntos por quatro anos na área
de sonorização de programas de televisão. Transmitiu sua experiência técnica
como sonoplasta para mim. Com a vivência do conjunto e do meio musical foi
relativamente fácil assimilar os conhecimentos e empregá-los ao longo de minha
permanência na TVE. O meu serviço na TV era preparar sonoplastia para novelas
educativas, aulas integradas e outros programas educativos. Fazia ainda
gravações para “BG” (background - fundo musical) que
“rodavam” durante os intervalos da emissora.
-
José Roberto Fernandes Távora
Técnico
em eletrônica, nos conhecemos na TV Educativa. O “Beto”, como era chamado,
integrava a equipe daqueles conhecidos por “pesquisadores” do grupo
que trabalhava na “Engenharia” da TV. Muito inteligente e esperto,
rapidamente aprendia a consertar equipamentos de todo o tipo na televisão, de
modo especial as máquinas de videoteipe. Muito interessado e persistente, de
vez em quando nós víamos o José Roberto tentando consertar um equipamento que
outros técnicos não se atreveriam. Além da eletrônica nós tínhamos outras
afinidades, a exemplo do radioamadorismo e do gosto por equipamentos de som.
Hoje em dia o José Roberto especializou-se na área, juntamente com seus irmãos
Pulo César e Marcos, sendo hoje um dos responsáveis pela maioria das emissoras
de televisão e de rádio de Fortaleza.
-
Júlio Matos
O
Júlio Matos, “Julinho” como o chamávamos, foi nosso amigo desde os
tempos iniciais do Big Brasa até o período em que trabalhei na TV Educativa,
onde nos reencontramos. Gostava de música e freqüentava de vez em quando o
“QG” do Big Brasa, interessando-se em conferir os novos equipamentos
do conjunto. Muito calmo, também fazia parte do nosso grupo de elite, do tipo
“pesquisador” em eletrônica. Gostava de montagens de circuitos
diversos e se empolgava com as novidades que iam aparecendo. O Julinho foi o
executor técnico responsável pela montagem do primeiro pedal
“distorção” no Ceará.
-
Jurandir Mitoso
Apresentador
de rádio de grande audiência. Muito animado. Fizemos algumas apresentações em
seus programas, ao vivo, na Rádio Dragão do Mar. Ele gostava muito do conjunto
e tirava brincadeiras com todos os seus integrantes. Chegou até a inventar,
anunciando “no ar” que o Conjunto Big Brasa tinha sido contratado
para tocar em Portugal. Brincava sempre comigo, dizendo que eu era parecido com
o Wanderley Cardoso. Ainda hoje o Jurandir Mitoso é apresentador de programas
de rádio. Pela falta total de censura no país o negócio “avacalhou”
totalmente e está como o diabo gosta. Ele, muito divertido, fala o que bem
entende em seu horário. Uma de suas características engraçadas são as frases e
brincadeiras de duplo sentido que emprega em seus programas.
-
Mauro Coutinho
Gostava de ser chamado de “Engenheiro de
Som”. Sonoplasta era pouco para ele, um pouco bitolado e metido a saber e
a entender mais que todo mundo. O Mauro trabalhava como operador de som, encarregado
de “mixar” o som do programa Show do Mercantil. O pessoal do
conjunto às vezes reclamava de que, quando ele estava na mesa de áudio,
dificilmente o Big Brasa se apresentava com um som legal. Aliado à grande
deficiência dos equipamentos da TV Ceará, de modo especial de microfones (em
qualidade e em quantidade), o Mauro Coutinho talvez se baseasse mais no
VU-Meter (que é um medidor da
intensidade dos sinais de áudio nas mesas de som) do que no próprio ouvido. O
som do contrabaixo dificilmente se ouvia pela televisão. Ele devia ficar
apavorado com os sinais que a intensa vibração dos graves do contrabaixo
produzia nos VU, ao jogar seus ponteirinhos de marcação lá para cima e então,
possivelmente pelo seu despreparo musical, baixava o microfone de captação do
contrabaixo, deixando o som do Big Brasa só com os agudos e a bateria. Na Ceará
Rádio Clube, onde também trabalhava, convidou-me certa vez para gravar diversos
“sinais de tempo” para jogos de futebol comigo, utilizando efeitos
sonoros de guitarra. O Mauro Coutinho é um dos profissionais que fez história,
em Fortaleza.
-
Neide Maia
A
Neide Maia foi uma das fundadoras da TV Ceará. Era gente muito boa e gostava do
conjunto, apesar de não ter ligação direta conosco. Em uma véspera de carnaval,
quando o conjunto ficou sem receber nenhum tostão da televisão, que não fez o
pagamento devido nem nos adiantou nada, deixando o conjunto todo “na
pior”. A Neide nos viu sentados na porta da televisão e foi logo dizendo:
-
“Já sei, vocês não receberam o pagamento, não foi?
E
afirmamos que sim. Ela então disse para nós não nos preocuparmos que ia ver o
que poderia ser feito. No dia seguinte, a Neide chegou para nós e disse,
demonstrando grande satisfação:
-
Consegui entradas grátis para todos os bailes de carnaval do Clube Líbano, para
todo o conjunto. Ela, através de seu prestígio junto à presidência do
mencionado clube, nos presenteou com todos os ingressos (permanentes) para
aquele carnaval e assim prontamente resolveu a nossa situação.
-
Paulo César Fernandes
Távora
O
Paulo César, o “Paulinho” como também era chamado, também foi um
dos nossos amigos da época da TV Educativa. Excelente técnico, educado e amigo
de todos, ele também integrava o grupo da “Engenharia”, na
televisão. Fazia parte também, assim como o seu irmão José Roberto, o Brito, o
Daniel Menezes e eu, da turma aficionada pelo radioamadorismo. Nossos assuntos
preferidos eram os transceptores, amplificadores lineares, antenas e acessórios
afins.
-
Rejane Lima
Verde
Excelente
amiga, bonita e simpática ao extremo. Tive a oportunidade de viajar a seu lado
de Fortaleza a Parnaíba, em um ônibus fretado pelo Canal 2, para uma das
apresentações do Conjunto, oportunidade em que conversamos bastante e ficamos
conhecendo um pouco mais um do outro. Em Paracuru se divertiu muito passeando
comigo e toda nossa turma em um jipe 51 verde, sem capota e com o pára-brisa
abaixado, tipo “ratos do deserto”.
-
Sebastião Belmino
O
Belmino era um dos diretores de imagens da TV Educativa, Canal 5. Excelente
profissional, muito criativo, brincalhão e ágil para todas as situações onde a
improvisação se fizesse necessária durante os programas que
“cortava”. Conseguia fazer aberturas muito boas para as aulas
integradas que chegamos a gravar para a TVE, principalmente se considerarmos os
recursos técnicos que possuíamos. Exigia muito de todos de sua equipe.
Reclamava bastante, mas também sabia elogiar quando o serviço estava sendo bem
feito. Trabalhamos juntos por um bom tempo, ele como suíte e eu como operador
de áudio. Às vezes discutíamos muito, em razão de uma ou outra falha. Lembro do
dia em que “tirei” a palavra do governador Virgílio Távora do ar
por alguns segundos, em uma entrevista pela TVE, após ter desligado um
“link” a qual estava ligado o áudio do microfone, por falha técnica
de outro operador. Confusão geral em todo o estúdio e na
“engenharia”, quase a gente se desentende. Mas tudo era movido a
plena emoção e “adrenalina pura” em nosso trabalho. Ao final das
gravações ou mesmo de programas ao vivo ele sorria e tudo sempre acabava em
“pizza”. Depois de ter executado praticamente todas as funções
técnicas em um televisão, “por trás das câmeras”, como se diz, ele
resolveu ser apresentador de programas de televisão e de rádio, onde tem papel
de destaque em Fortaleza.
-
Tertuliano Siqueira
Produtor do Show do Mercantil por um bom período, nós estávamos sempre em contato, particularmente durante o período em eu era responsável pela produção musical do programa. O “Terto”, como nós o chamávamos, trabalhava também na época para a Borges Publicidade, empresa do Augusto Borges. Fizemos algumas viagens juntos, com a equipe de artistas da televisão, dentre elas a de Mossoró, no Rio Grande do Norte e a de Parnaíba, no Piauí. EPISÓDIOS
DIVERSOS
Seguem-se
algumas histórias e fatos pitorescos que aconteceram durante o Big Brasa em
diversas localidades e outras, de nossas experiências musicais com o Big Brasa.
Com toda certeza muitos desses casos até hoje são lembrados com saudade por
quem os vivenciou.
COMO QUEM NÃO QUER, QUERENDO...
No final do primeiro ano do Big
Brasa, aconteceu um fato que para nós foi muito significativo. Estávamos ainda
lutando muito para divulgar o conjunto e ganhar mais espaço no meio musical de
Fortaleza.
Fomos convidados para participar
de uma festa no Clube dos oficiais da Aeronáutica, chamado de
“F-80”, nome de um avião caça, a jato, antigamente utilizado pela
Força Aérea Brasileira. Nossa contribuição seria apenas a de um pequeno show durante o intervalo, visto que para
o baile, o clube tinha contratado o conjunto “Alberto Mota”, um
grupo musical excelente, composto de profissionais tarimbados e, portanto,
“macacos velhos”. Daríamos uma “canja”, termo utilizado
no jargão musical para essas situações.
Chegamos no início do baile e
ficamos observando o Alberto Mota tocar, para aprender mais e pegar todos os
macetes possíveis, como sempre fazíamos em outras ocasiões. O próprio Alberto
Mota, que dava nome ao conjunto, músico veterano, naquela noite tocava piano.
Posteriormente passou a utilizar também uma “pianola”, que era nada
mais, nada menos, do que um pequeno órgão eletrônico, muito simples e de parcos
recursos, acoplado ao piano. Alguns anos mais tarde, o piano foi abolido
daquele grupo musical, cedendo lugar aos órgãos eletrônicos mais modernos.
E a festa seguiu, até o intervalo,
dentro de um clima meio desanimado, tanto pelos participantes, que não ocupavam
muito a pista de dança, quanto pelo “Alberto Mota”, que tocava o
baile rotineiramente, sem muito esforço para animá-lo. Acomodação que muito nos
favoreceu.
Chegando a hora de nossa
apresentação, reorganizamos o posicionamento dos microfones no palco, a posição
da bateria, de modo que ficasse mais visível, pegamos nossas guitarras e as
ligamos nos amplificadores do Alberto Mota, que nos cedeu gentilmente seu
equipamento.
Iniciamos com nosso prefixo,
“And I Love Her”, de mansinho, e depois “atacamos” com
nossas músicas mais animadas, ou seja, com aquele repertório que estava na
“crista da onda”, da Jovem Guarda, em especial iê-iê-iê. Os oficiais presentes e demais
convidados, tiveram um verdadeiro impacto pela mudança radical do tipo de som entre
os dois conjuntos. O Alberto Mota, conjunto tradicional, com sambinhas, muita
bossa nova, e o Big Brasa, com o som vibrante das guitarras e o tipo de
repertório moderno, que sem dúvida era bem mais animado. O resto ficou por
conta dos uísques que o pessoal já deveria ter tomado àquela altura da festa.
Notou-se uma mudança repentina no
salão. Muitas pessoas dançando animadamente e o Big Brasa com força total,
empolgação de sobra. Devemos ter tocado uma meia hora, quando paramos para que
o Alberto Mota desse prosseguimento normal ao baile. Aí a coisa pegou, porque o
pessoal não queria mais o Alberto Mota, preferindo que a festa continuasse com
o Big Brasa. E agora? A situação, para nós foi constrangedora. Não pudemos
fazer nada, a não ser ouvir e acatar a difícil solução tomada pelos diretores
do clube, os quais resolveram, acertadamente, no meu entender, deixar o Alberto
Mota continuar a festa.
Mais uma vez, foi confirmada
aquela história, muito conhecida pelos músicos, de que deixar outro conjunto
“tocar um pouquinho”, durante uma festa, pode ser fatal. Pois se o
aquele grupo que entra apenas para um show se apresenta mal, há quem reclame, perguntando: por que deixaram esse grupo
tocar? E, por outro lado, se o conjunto
que entra para dar uma canja apresenta-se bem, o prejudicado é o primeiro.
Nessa noite, nós aprendemos mais um pouco as manhas da profissão...
MÚSICO PRINCIPANTE EM CARNAVAL - TUDO NOVIDADE !
Em 1969, o Balneário Clube de
Messejana nos contratou para o Carnaval. A alegria foi grande, de nossa parte,
pois o clube tinha demonstrado confiança no Big Brasa. Seria a primeira
experiência com bailes carnavalescos. Eu tinha completado meus 17 anos de
idade, portanto ainda muito novo e sem prática nenhuma de bailes carnavalescos.
O entusiasmo de todos era muito grande e a responsabilidade pelo contrato
também.
Contratamos imediatamente dois
instrumentistas de sopro, saxofone e piston, da banda de música da Base Aérea,
para assegurar o sucesso musical daquele contrato. Fizemos alguns ensaios, na
realidade para aprender mesmo como seriam as coisas, definir mais ou menos o
roteiro, as marchas, os frevos. Aprendi logo uma porção de novidades, por
exemplo, não sabia nem o que era fanfarra - que é um pequeno trecho de música,
executado na tonalidade da música seguinte (ou não), para que o cantor se situe
no novo tom. Há uma fanfarra diferente para mudança de ritmo, de marcha para
samba e vice-versa.
O cantor, também contratado pelo
conjunto especialmente para aquela oportunidade, foi o Nozinho Silva, muito
conhecido em Fortaleza. Bastante animado ele garantiria a parte vocal. Por
último, como nós estávamos temerosos de não “agüentar o tranco”,
contratamos também um percussionista para tocar tarol, peça importantíssima na
sustentação dos ritmos de carnaval.
Desse modo, o que sobrava para
nós, diante dos profissionais contratados e com muito mais experiência no ramo?
Alguns instrumentos de percussão, as guitarras, o contrabaixo e alguma ajuda na
parte vocal. Eu tratei logo de
“garantir minha vaga”, pois queria ser útil ao grupo e participar
de forma plena daquele carnaval. Além de tocar guitarra, por iniciativa
própria, decidi também complementar a percussão utilizando o
“ximbau” da bateria para fazer uma batida semelhante à do tarol. A
combinação ficava excelente. Usava um prato de bateria à frente, para que
também pudesse fazer alguns “breques” e marcações nos momentos
apropriados.
Chegando o grande dia, instalamos
todo o nosso material no palco do Balneário, que tinha sido recém-pintado,
estava com uma decoração muito bonita, salão encerado, mesas bem dispostas por
toda a área livre, tudo bem caprichado. Aliás, o Balneário teve nessa época sua
fase áurea de organização.
Antes de iniciarmos o primeiro
baile o Big Brasa foi saudado pela diretoria do clube e todos os músicos foram
apresentados aos presentes.
E começou a festa. Fanfarra no ar
e animação geral com a primeira música, o tradicional frevo
“Vassourinha”. Todo o grupo com muita disposição, tocamos uma
seqüências de músicas conhecidas, para que os presentes entrassem no embalo
mais rapidamente. Após os primeiros instantes, minha preocupação, natural de um
principiante em uma estréia carnavalesca, desapareceu totalmente e entrei de
corpo e de espírito naquele clima de folia momina.
A festa foi transcorrendo e eu
observando todo o grupo, gostando demais dos instrumentistas de sopro, das
músicas, vendo todo mundo pulando animadamente no salão, e fazendo meu ritmo
com muita empolgação. Tanta euforia que no primeiro intervalo já estava com as
mãos e braços muito cansados pela movimentação do “ximbau”. Até me
atrevi a tocar um pouco de tarol, revezando com o percussionista contratado. O
cara me deu uns “macetes” e ficava ao meu lado, para no caso de
falha de minha parte ele poder assumir de novo, de imediato. O tarol, para que
você tenha uma idéia, é peça fundamental para uma percussão de carnaval. Se ele
parar o conjunto “morre”, enfraquece.
Chegamos ao final daquele nosso
primeiro baile exaustos. Mas satisfeitos pela missão cumprida. A diretoria do
clube gostou muito de nosso desempenho. No outro dia, dormi e descansei
bastante para recuperar as energias. Notei que meus braços estavam normais, sem
nenhuma dor muscular, como aquelas que tinha sentido na véspera, em razão de
minha falta de prática em percussão.
Para o segundo baile, já estávamos
com o moral alto, mais tranqüilos tudo seria mais fácil. E foi mesmo, com
exceção pelas dores que comecei a sentir nos punhos e pulsos. Para resumir,
voltou o cansaço da noite anterior em 15 minutos. Entrei em um verdadeiro
desespero e fiquei assustado. Com toda a certeza não agüentaria até o final, se
mantivesse o mesmo ritmo. Por sorte, no decorrer dessa festa, um rapaz que
estava olhando o Big Brasa tocar, subiu no palco e pediu para dar uma
“canja”, que no jargão musical significa uma ajudazinha, tocando um
pouco. Era o Pedro Ricardo, que também muito disposto e animado, nos ajudou
bastante naquela noite, vindo mais tarde se tornar meu amigo. Em uma dessas
coincidências, viemos a descobrir que o Ricardo e eu nascemos no mesmo dia, mês
e ano. No terceiro e quarto dias, como já estávamos “tarimbados”,
tudo correu dentro do esperado, na mais perfeita normalidade. Com exceção de
nosso pagamento, que a diretoria do Balneário, na última noite de festa,
alegando prejuízo, nos pagou apenas a metade do contrato. Mas meu pai fez
questão de efetuar o pagamento integral a todos os músicos. E nós, de casa,
ficamos o resto do ano inteiro para receber a quantia restante em módicas
prestações, como em um crediário...
Mas até isso valeu com experiência.
Nos carnavais que tocamos, alguns anos depois, no contrato havia uma cláusula
que os pagamentos deveriam ser efetuados de forma integral, após cada função.
“PEGAR O SOL COM A MÃO” EM UMIRIM
Numa das festas tocadas em Umirim, o Big Brasa
estava realmente muito bom, com repertório variado e músicas de sucesso.
Contrato de cinco horas, com início às 22:00 e término previsto para às 03:00
da manhã. Tudo correu muito bem, salão sempre animado e muita gente no clube.
Ao
final da festa, depois de o conjunto ter executado uma seqüência de músicas
super animadas, encerramos o baile. O pessoal que estava no salão mais parecia
um enxame de abelhas correndo para a frente do palco num tumulto enorme. Muita
gente pedia prorrogação e, após rápido acerto com a diretoria do clube, tendo
em vista que o contrato previa prorrogação (com o preço da hora duplicado) a
festa prosseguiu por mais uma hora. Até ali tudo bem, pois uma granazinha extra
estava garantida e não fazia mal a ninguém. Perto do segundo final, entretanto, tocamos o que seria a música de
encerramento e paramos de novo. A cena mais uma vez se repetiu e o Big Brasa
teve que enfrentar mais uma hora. Até às 05:00h da manhã dessa vez. Estávamos
muito cansados. Imaginem só, depois de uma viagem, instalação de equipamentos,
banho e jantar às pressas e uma tocata de 07 horas não era moleza.
Aí
é que o bicho pegou: o público não saía do clube e a diretoria foi nos
consultar sobre uma outra hora de prorrogação. Mesmo estando exausto perguntei
se os colegas topavam a parada e decidimos concordar com apenas meia hora de
festa, depois de novo intervalo de uns quinze minutos. E foi assim, o dia quase
amanhecendo quando paramos pela última vez. Ainda apareceu um gaiato querendo
mais festa que disse:
-
Aqui nós costumamos pegar o sol com a mão!
Naquela
hora eu virei para trás, no palco, puxei o cabo da guitarra do amplificador com
força. de modo que ele quebrasse mesmo, e disse para minha guitarra ao
guardá-la no estojo:
-
Você não vai tocar mais nada hoje, vai dormir e pronto.
E
guardei-a. Para o engraçadinho que queria nova prorrogação respondi, de
imediato:
-
Aqui vocês podem pegar o sol com a mão, mas lá em Fortaleza a gente não faz
isso não! E encerramos definitivamente aquela “pequenina” festa ...
Após
tomarmos um café da manhã reforçado, em uma residência de um dos diretores do
clube, para depois iniciarmos a desmontagem do equipamento, uma surpresa: por
incrível que pareça, encontramos ainda o Cefas, saxofonista, tocando em uma
mesa para uma turma. Tinha aceitado mais prorrogação por sua conta própria, na
raça.
Após
este momento nós refletimos bem e em grupo decidimos marcar um limite para as
prorrogações, o que foi feito e cumprido em diante.
O BAILE DE TÉRMINO DE CURSO QUE
“NÃO TERMINOU”
Fim
de ano, mês de dezembro, e o Big Brasa tinha sido contratado para animar mais
um baile de formatura no Clube de Regatas Barra do Ceará, não lembro mais de
que colégio. O patrono dessa turma foi o então Major Cisneiros, comandante do
Departamento de Trânsito do Ceará. Na noite anterior havíamos tocado no mesmo
clube e a festa foi excelente. O conjunto estava atravessando uma fase ótima,
repertório bom e variado, instrumental legal e “embalado”.
Iniciamos
o baile com o Clube praticamente lotado. Os concludentes desfilavam com seus
pares, preparados que estavam para dançar a valsa, que seria tocada à
meia-noite.
Fizemos
intervalo, após uma primeira parte de salão cheio e muita animação. Tudo
prometia ser tranqüilo. Após dez minutos de intervalo (que seria de trinta
minutos) resolvi alertar o diretor do colégio para que providenciasse o lanche
para o conjunto junto ao bar do clube a fim de que o intervalo não se
prolongasse. Ao fazer o contato com ele notei que estava um pouco
“chumbado”. Aí então ele disse que não sabia de nada a respeito e
que não iria providenciar lanche nenhum porque o conjunto “não tocava
nada que prestasse”. Ao que eu lhe respondi, dizendo que se ele gostava
de forró, realmente não estava bom pois a festa estava para música jovem.
Aquele senhor ficou muito invocado e disse que de maneira nenhuma pediria o
lanche para nós. Para desmascará-lo, disse para ele que iria perguntar a três
pessoas que por ali passassem se estavam gostando do conjunto, da festa enfim.
E foi assim: perguntei a quatro meninas que passavam por perto der nós e todas
elas afirmaram, na frente do diretor, que a festa estava ótima e o conjunto
tocava muito bem. Piorou a situação porque ele ficou ainda com mais raiva e
irritadíssimo, visto que tinha “quebrado a cara”. Desesperado,
perdeu o controle e gritou:
-
Não vai ter nada de lanche não, e está acabado!
Em
cima da hora, eu retruquei:
-
Não há problema. Não tem lanche para o conjunto e não vai ter mais baile para
vocês. E sinalizei para que o Sérgio Alves imediatamente começasse a desligar o
equipamento, o que por ele foi feito sem pestanejar.
Já
de volta ao palco, depois daquele “sururu”, apareceu-me uma mocinha
que na maior cara de pau perguntou:
-
Que papel é esse que diz que o colégio tem que pagar o lanche para o conjunto?
Ora,
mais uma vez não perdi tempo. Peguei uma das vias do contrato que estava atrás
do amplificador da guitarra e mostrando-o para ela, falei bem alto:
-
Minha filha, desconfio muito que você saiba ler, mas o nome desse papel é
contrato e nele contém, uma cláusula na qual o contratante se obriga a fornecer
o lanche para o conjunto...”
Com
essa resposta a menina saiu completamente descontrolada, nada respondendo, e
sumiu no meio da multidão.
Após
esse fato, como responsável pelo conjunto, fui chamado pela diretoria do
Regatas para esclarecer o que estava ocorrendo, visto que o clube permanecia
lotado, o baile interrompido há quase uma hora e nada. Fiquei um pouco
assustado mas fui lá e falei para eles a história toda. Tal foi minha admiração
quando um deles, após ouvir tudo, disse para mim:
-
Fez muito bem, meu jovem. Vocês agora vão receber um lanche completo, por conta
do Regatas.
E
pediu apenas que o conjunto ligasse novamente o serviço de som, para anunciar o
motivo da paralisação da festa. E assim o fiz. Pedi para ligar o equipamento de
som e o Luiz Antônio avisou que o Big Brasa iria interromper o baile em virtude
de não cumprimento do contrato por parte da diretoria do colégio. Com esta
jogamos o abacaxi todo para cima do diretor bêbado e chato, que conseguiu
prejudicar todo um grupo de concludentes e acabou com a festa. Fim da história:
na semana seguinte recebemos o pagamento integral da função.
Gostaria
de mencionar que esse episódio foi muito discutido na época, com meu pai, e que
até hoje “há controvérsias” sobre minha decisão. Eu poderia
simplesmente ter pago o lanche e continuado o baile, desprezando assim aquele
diretorzinho babaca. Mas na hora preferi não deixar que alguém faltasse com o
respeito ou maltratasse o músico. Sempre agia dessa maneira, seguindo meu
temperamento de não levar desaforo para casa. Além disso - o que é mais
importante - fazendo valer minha condição de músico profissional, merecedor de
respeito como os demais profissionais. Com o passar do tempo fomos nos
acostumando a lidar com essas situações com um pouco mais de calma, de
equilíbrio e de tolerância.
Para
quem não sabe, o problema é que a profissão de músico, de modo especial na
condição de músico de baile, é por vezes muito difícil. Em qualquer negócio
“normal” as pessoas estão sóbrias e pode-se conversar ou mesmo
discutir sobre alguma coisa e chegar a um resultado sem problemas. Agora com o
músico é diferente. Estamos em um baile, trabalhando normalmente, sem beber
nada, como era o meu caso, quando chega qualquer um participante (na maioria
das vezes com a cara cheia) e quer mandar, fazer e desfazer. Aí não pode...
MOMBAÇA – OS
TRÊS BURACOS DE BALA NO PALCO
Na
chegada do Big Brasa vimos faixas e cartazes de nosso fã-clube local, alusivos
à nossa presença em Mombaça. Uma recepção e tanto, demonstrando que a força
publicitária da televisão era muito importante.
Após
as medidas rotineiras de instalação de equipamentos e acomodação do pessoal
retornamos ao clube e iniciamos a festa normalmente. O público naquela noite
era predominantemente composto de jovens, e o repertório do conjunto estava
direcionado para esse pessoal.
Entretanto,
com uns quarenta minutos de baile, um senhor subiu ao palco e de uma forma
pouco educada pediu-me para tocar um xote. Lógico que não foi atendido. Em
primeiro lugar pela sua maneira de solicitar sua preferência musical e em
segundo porque o ambiente não estava para esse tipo de música. Pediu mais
outras tantas vezes e de novo não foi atendido, até que o conjunto, na hora
prevista, fez seu intervalo.
Nesse
momento eu conversava com um grupo de moças e, por sorte nossa, uma delas
chegou-se a mim e perguntou o que aquele “velhote” estava me
falando, ao que eu lhe respondi:
-
Ah, ele está pedindo xote o tempo todo... E ao invés de “xote”, ele
está é levando “choque” de minha guitarra, e eu também.
Então
aquela jovem me disse que ele era um candidato local a vereador e que tinha
dado três tiros no palco, em direção ao último conjunto musical que tinha
tocado na cidade, por causa de um pequeno desentendimento. Em seguida apontou
os buracos de bala atrás do palco. Avaliei calmamente a situação e pensando bem
- aí está um dos segredos do negócio - pedi para o Luiz Antonio (Peninha)
anunciar uma seqüência de xotes para aquele senhor, logo que o Big Brasa retornasse
do intervalo. Depois do “oferecimento” de uma seqüência de xotes
especialmente para o senhor “fulano de tal”, o dito cujo, alegre e
satisfeito foi o primeiro a entrar no salão para dançar. Escapamos dessa por um
triz...
OS SHOWS DO BIG BRASA NA ESCOLA NORMAL
O
Big Brasa em muitas oportunidades foi convidado para fazer shows em colégios. Nosso maior interesse era divulgar o conjunto o
máximo possível, visto que nessas ocasiões poderíamos conseguir um contrato
para festa de formatura, tertúlia de férias, aniversário de 15 anos ou outros
eventos. Sempre fomos muito bem recebidos. Durante os shows o conjunto era muito aplaudido, excitação e gritaria geral,
por conta das músicas e também por nossa causa. No final elas vinham conversar
conosco e pediam muitos autógrafos.
Lembro
muito bem das oportunidades em que nos apresentamos na Escola Normal Justiniano
de Serpa. As meninas ficavam alucinadas, em primeiro lugar pela animação
natural típica de um estudante, com shows daquela natureza. Em segundo pelo tipo de música e de conjunto, uma super
novidade naquela época.
No
último deles, do qual jamais esquecerei, as meninas do grêmio estavam vendendo
ingressos, na própria escola, para angariar recursos para um passeio de férias
e o show seria realizado no
auditório. Chegamos com bastante antecedência e instalamos nosso equipamento no
palco em horário de aula, para que não houvesse tumulto. Nos avisaram para
iniciar o show na hora do intervalo.
Começamos a testar o equipamento e afinar as guitarras. Muitas daquelas alunas
que tinham comprado ingresso já tinham entrado e, conversando animadamente nas
poltronas, esperavam o começo do show na maior alegria. Uma comissão de meninas ficava na porta do auditório para
controlar a entrada.
Quando
o Big Brasa realmente iniciou a apresentação, com a música Hello Good Bye,
houve uma invasão por parte das meninas através das janelas laterais do
auditório. Forçaram e conseguiram quebrar uma das janelas e naquele momento só
se via era menina voando por tudo que era lado para entrar de graça, na maior
algazarra. Não houve jeito, todo mundo entrou mesmo e o auditório ficou
superlotado. Ao final desse show a
diretora da Escola, Adísia Sá, agradeceu gentilmente a participação do
conjunto, mas disse que infelizmente nós nunca mais poderíamos “pisar
lá”, pelo tumulto causado...
A FESTA DE SÃO BENEDITO – LIGADO DIRETO !
Lembro-me de um contrato do Big Brasa para a cidade
de São Benedito, na Serra de Ibiapaba, como um dos mais “puxados”,
isto é, uma das mais cansativas funções que enfrentamos, exigindo de todos
muito preparo físico, psicológico e mental e correndo também alguns riscos.
O
conjunto tinha tocado na noite anterior em Fortaleza. Nosso equipamento, após
de desmontado, “dormiu” na Kombi, preparado para a viagem e a nova
batalha. Acordamos no dia seguinte e após termos almoçado cedo, por volta das
onze horas da manhã, seguimos viagem. Eu dirigia a Kombi, naquele dia. Depois
de mais ou menos umas sete horas de viagem, sem nenhum problema, conseguimos
chegar à São Benedito. Montamos imediatamente o instrumental no clube. Nessas
ocasiões todo mundo tinha que virar bigu, pois este sozinho não dava conta do
recado a tempo. Muitos equipamentos para desmontar, instalar, fios e cabos para
ligar, testar o som dos amplificadores, afinar guitarras etc. Quando tudo
estava pronto saímos para tomar um banho e jantar, também de forma rápida, para
iniciarmos o baile no horário previsto.
Ao
retornar para o clube, tudo estava certinho com os instrumentos e a festa
inteira transcorreu sem anormalidades. Ao final, a desmontagem de tudo e a
viagem de volta. Todo mundo cansado, dormindo, e eu com atenção redobrada, ao
volante. Daquela vez passei mais de trinta horas “ligado direto”,
sem dormir.
Hoje
reconheço que todos nós passamos por um verdadeiro perigo, pelo fato de voltar
dirigindo depois de uma noite toda acordado. Meu anjo da guarda estava ao meu
lado, mais uma vez ...
BRIGAS E AGITAÇÃO POR PERTO
Alguns
clubes de Fortaleza nos anos 60/70 sofreram muito pelas ações ocasionadas por
causa de turmas de bairros e suas famosas brigas. Era o que se chamava de juventude transviada ou as
“gangs” da época. Ainda bem que foram mínimas as ocorrências
referentes a conflitos, de qualquer natureza, seguramente uma minoria
insignificante se comparadas ao grande número de funções musicais realizadas
pelo conjunto Big Brasa.
Todos
os conjuntos tinham que conviver com esse risco e saber como se comportar
adequadamente nas situações de conflito que poderiam ocorrer nos clubes ou fora
deles. O Big Brasa sempre se saiu bem em todas as ocasiões de perigo, graças a
Deus. Uma das regras fundamentais para um grupo musical era a de não
interromper a festa quando uma confusão tivesse início ou uma briga estivesse
ocorrendo. Aprendemos isso através da experiência a nós transmitida por colegas
de profissão veteranos, acostumados com o que poderia acontecer durante uma
função musical, quase sempre brigas por excesso de bebida.
Por
que esse procedimento de não parar com a música? Pelo simples fato de que uma
parada da música poderia despertar a atenção de quem possivelmente não
estivesse nem vendo aquela confusão,
agravando o conflito. E com a música em andamento os seguranças ou a turma do
“deixa disso” poderiam acalmar a situação com mais rapidez.
Por
que parou, parou por que? Não é assim que diz aquela música?
-
As brigas de turmas no Maguari
Havia
por exemplo as “famosas” turmas da Aldeota e da Treze de Maio,
cujos confrontos, via-de-regra, ocorriam no Maguari, clube localizado na Treze
de Maio. Presenciamos uma dessas confusões, quando tocávamos uma tertúlia de
férias em julho de 1969. O Big Brasa tinha iniciado a festinha e tudo ia indo
muito bem, a rapaziada se divertindo normalmente até que começou a chegar a
turma da Aldeota. De cima do palco a visão sempre foi privilegiada, se bem que,
por outro lado, poderíamos ser facilmente alvos potenciais de tudo e de todos,
quando se tratava de brigas. De repente, quando um dos rapazes da turma da
Aldeota atravessava o salão - muito bem encerado - com toda a pose, escorregou
e levou uma tremenda queda. O que seria um fato normal transformou-se por conta
de uma vaia que ele levou da turma da Treze de Maio. Daí para o começo da briga
foi rápido. Quando menos espero vejo um dos caras levantar uma cadeira (quem
conheceu o Maguari sabe o tipo de suas cadeiras, de madeira e bem pesadas) e
atingir seu adversário bem na testa. Foi uma só “cacetada” e o cara
ficou estatelado no chão. O que se viu depois foram cenas de vandalismo e de
destruição. Mesas, cadeiras, garrafas e copos voando de lado a lado, no
confronto entre as turmas. Por alguns instantes continuamos a tocar, mas
depois, com o aumento do tumulto instintivamente alguém do conjunto sinalizou
para que todos se protegessem de eventuais “copos perdidos”. Fiquei
observando aquilo tudo de um canto do palco, por trás de uma das caixas de som.
Logo em seguida o Edson Girão achou por bem anunciar ao microfone, com voz de
locutor de transmissões de lutas de boxe, para fazer graça:
- Primeiro assalto!
Como se fosse uma luta real.
Para
que ele disse isso. Logo um dos brigões jogou um copo em nossa direção. Por
sorte ele bateu no prato da bateria, quebrando-se e espalhando cacos de vidro
por todos os lados. Imediatamente desligamos o sistema de som e o Edson deve
ter reconhecido sua tremenda mancada e o perigo de sua brincadeira. Essa
tertúlia não teve prosseguimento, pela anarquia ocasionada pela briga.
Ao
final, quando estávamos saindo do clube, vi um dos envolvidos na briga sendo
carregado, na calçada, com o rosto todo
cortado por uma garrafada.
-
Tiros no “CRA”
Em
outra ocasião, no Clube Recreativo da Aerolândia, o “CRA”, no
momento em que o Big Brasa estava chegando para dar continuidade a um dos
festivais de três conjuntos, houve uma briga muito grande. Os intervalos
longos, para troca de conjuntos, muitas vezes concorriam para que essas
confusões acontecessem. Estávamos ainda fora do clube quando ouvimos
nitidamente um primeiro estampido, seguido de mais uns dois ou três tiros.
Soubemos que um dos presentes, bêbado, por um motivo fútil, sacou de sua arma e
efetuou vários disparos no meio do salão, atingindo na perna um rapaz que não
tinha nada a ver com a história.
-
Susto em Guaiúba - um “38” ao lado...
Fomos algumas vezes convidados a tocar em Guaiúba.
Todas as funções sempre animadas e sem ocorrências anormais. Em uma dessas
vezes, porém, houve uma confusão perto do local em que o conjunto se
apresentava. Não tinha palco e ficávamos perto dos dançantes, no mesmo nível.
Em determinado momento eu olhei a confusão e vi um cara com um revólver enorme
na mão, segurado por outro sujeito, que o impedia de atirar.
Fiquei
olhando aquela arma apontada para cima, acho que por alguns segundos, até
corrermos todos para nos abrigar mais para trás. Não houve o disparo e tudo
acabou bem.
UMA RECOMPENSA MERECIDA
Em 1972 enfrentamos a maior jornada de trabalho no
final do ano. Para dar uma idéia da procura pelo conjunto, no mês de outubro o
Big Brasa já tinha contratos assinados para quase todo o mês de dezembro. Quase
chegamos a preencher totalmente nossa agenda. Isso pelo fato do grupo estar
atravessando uma excelente fase e muito bem divulgado, tanto em Fortaleza
quanto no interior cearense.
Foram ao todo 28 bailes, uma grande maratona de festas.
Nesse mês de dezembro nós tocamos ininterruptamente quase o mês inteiro,
“que nem cantiga de grilo”, como diz o matuto. Um trabalho árduo e
cansativo, mas que todos desempenhavam com facilidade, em razão principalmente
do gosto pela música. O dinheiro que ganhávamos era considerado por todos nós apenas
como uma conseqüência daquele trabalho. Em todos esses bailes, sem exceção,
posso afirmar que o Big Brasa apresentou-se muito bem. O repertório, o nível
técnico-profissional dos participantes e o alto astral do grupo foram fatores
determinantes do sucesso obtido.
Nesse
período tivemos até que contratar mais bigus e um motorista para nos ajudar, de
forma que eu pudesse estar completamente livre para retornar para casa tão logo
as festas acabassem, sem o trabalho de dirigir transportando equipamentos. Uma
das preocupações de meus pais era com minha saúde, pelo desgaste sofrido com as
noites seguidas de sono perdido, sem a necessária reposição no dia seguinte.
Após cada baile, quando chegava em casa eu dormia até a tarde do dia seguinte,
sendo acordado algumas vezes para me alimentar.
Quando
acordava, começava imediatamente a trabalhar para a próximo baile, revisando
todos os cabos, plugs e demais acessórios que pudessem ter sido danificados.
Volta e meia eu tinha que fazer algum conserto, para deixar novamente tudo em
ordem . O Sérgio quase sempre me ajudava nessa tarefa.
Ao
final dessa temporada toda a equipe do Big Brasa, inclusive bigus e motoristas,
chegou a faturar uma quantia significativa para nossos padrões, bem acima da
média, valendo a pena o esforço. Tivemos um fim de ano extremamente
movimentado, onde todo mundo participou de forma plena, de modo a poder cumprir
todos os nossos compromissos e receber uma recompensa merecida!
Em
diversas oportunidades acompanhamos o Ednardo, compositor de inúmeras músicas
belíssimas, dentre elas Beira-Mar e Pavão Misterioso, esta última tema de
novela exibida pela Rede Globo. Ednardo é um dos componentes do chamado
“Pessoal do Ceará”, composto também pelo Belchior, Rodger, Tetty e
Jorge Mello. O Big Brasa teve a oportunidade de acompanhar esse pessoal todo,
quer na televisão ou em apresentações em clubes ou boates de Fortaleza. Com o
Ednardo estivemos em dois Festivais Nordestinos de Música Popular, realizados
em Recife, Pernambuco, dos quais falaremos mais tarde.
Depois
que o Ednardo seguiu para uma temporada em São Paulo e conseguiu gravar,
retornou para Fortaleza para fazer o lançamento de seu primeiro disco e para
realizar alguns shows. Fez contato conosco
no sentido de acompanhá-lo e mais uma vez o Big Brasa topou a parada, que seria
o ensaio para a realização de sete apresentações. Três delas em Fortaleza, no
Teatro José de Alencar e Ginásio Paulo Sarasate, duas em São Luís do Maranhão e
duas em Teresina, essas últimas nos teatros locais.
Começamos os ensaios em nosso “QG”.
Muito trabalho, porque tínhamos que deixar vinte e cinco músicas preparadas
para as exibições. E os arranjos foram muito caprichados. O Ednardo sempre foi
bem detalhista em seu trabalho e eu gostava de produzir as introduções das
músicas, arranjos e encadeamentos harmônicos para que pudesse improvisar e usar
todos os recursos de efeitos de que dispunha. Passamos mais ou menos uma semana
ensaiando o dia inteiro, serviço cansativo e por demais desgastante. O
importante é que tudo ficou bem arranjado. Copiei em pauta musical todas as
introduções e outras passagens para que não houvesse o perigo do esquecimento.
O Adalberto tocava bateria e às vezes órgão. O Cláudio Pereira contrabaixo e eu
guitarra, viola e flauta doce. O Ednardo, além de cantar suas músicas, usava em
algumas delas umas percussões para produzir maior efeito nos arranjos e tocava
viola ou violão. Toda a produção do show,
ao final, ficou excelente.
Preparamos cerca de 30 músicas
para as apresentações. Os músicos eram o Cláudio (contrabaixo), Edi (bateria),
Adalberto (órgão) e eu, que tocava guitarra, viola e flauta doce. O repertório
era todo anotado, as introduções e arranjos em partituras para que não
houvesse esquecimento.
Em todas as ocasiões, nas casas de
espetáculo ou teatros, nós tínhamos que instalar todo o instrumental com
bastante antecedência, passar algumas músicas ou introduções, esperar que as
equipes técnicas fizessem a marcação de luzes, posições, microfones e outros
detalhes.
Lembro que em um show realizado em São Luís, logo depois
da primeira música minha estante caiu do palco e voou a papelada toda, caindo
bem na frente da primeira fila da platéia. Por sorte um dos espectadores
apanhou a estante e me entregou rapidamente, de modo que deu tempo para eu
organizar as partituras na seqüência para a próxima música. Fiquei apreensivo
naqueles instantes, porque dependia muito das partituras para que todos os
detalhes dos arranjos pudessem ser executados. Ainda bem que a luz não estava
em mim e pouca gente deve ter notado esse pequeno incidente.
Foi
uma temporada realmente muito proveitosa. Todos adquirimos mais experiência ao
trabalhar musicalmente em teatros. A acústica, a platéia, as luzes, a própria
disposição do instrumental no palco, tudo era diferente do que se costuma fazer
normalmente em um baile.
O ATRASO EM PACOTI – QUE
“FRIA” ...
A
maioria das vezes em que o Big Brasa foi contratado para tocar no interior do
estado, aos sábados, durante o período em que o conjunto participou do programa
Show do Mercantil, nós tínhamos que fazer um bom planejamento para não perder
tempo, e chegar no destino antes da hora marcada, com tempo suficiente para
instalar o instrumental e testá-lo, pelo menos. O conjunto tinha um
“esquema” preparado para essas situações.
Naquela
noite o Big Brasa iria tocar em Pacoti, cidade serrana do interior do Ceará. À
tarde o conjunto participou do programa Show do Mercantil e mais ou menos às
18:30h, um pouco antes de seu encerramento, conforme tínhamos acertado com a
produção do programa, desmontamos nosso equipamento e os bigus levaram todo o
material para os transportes. Enquanto isso, nós fizemos um rápido lanche no
restaurante “Jerbô”, que ficava na esquina da Avenida Antônio
Sales, pertinho da TV Ceará, e nos mandamos para Pacoti em dois carros. Eu
dirigia a Kombi e o Fernando “Galba” a Rural.
No
percurso, tudo transcorria muito bem. O pessoal descansava um pouco, se
preparando para mais uma noite de muito embalo. Acontece que em virtude do
pouco conhecimento da estrada, noite muito escura e principalmente pela falta
de sinalização, chegando à Serra de Guaramiranga, eu e o Galba nos perdemos,
não encontrando a entrada para Pacoti. Ficamos rodando por algum tempo, mais
perdidos do que cachorros em dia de festa. A medida em que o tempo passava,
nossa preocupação aumentava. Por sorte,
encontramos com um transeunte, que nos forneceu a informação necessária para
que encontrássemos o caminho.
Quando
finalmente chegamos à cidade, quase meia-noite ou um pouco mais que isso, o
quadro era desolador. Muita gente na rua, rapazes e moças parcialmente
desarrumados, conversando em grupos e muito desanimados pelo quase certo
cancelamento da festa em razão da falta do conjunto. Um verdadeiro fracasso,
seria, se realmente tivéssemos faltado.
Enfim
paramos na porta do clube, sendo imediatamente cercados pelos contratantes e
populares. Explicações sobre o atraso foram dadas e bem aceitas, tendo em vista
que prometemos - e cumprimos - prorrogar a festa pelo tempo necessário para
cobrir nosso atraso. Pudemos notar, que rapidamente o pessoal se mobilizou, com
o maior entusiasmo. E a festa foi realizada, dentro de um clima de muita
animação. Naquela noite, tocamos até quase de manhã.
Durante
o baile, em razão do intenso frio, tivemos problemas para manter a bateria
afinada, visto que o couro dos tambores amolecia e ficava praticamente sem som.
Interrompemos a festa, mais de uma vez, para levar os tambores da bateria, até
perto do fogão do bar, a fim de que aquecessem novamente. Esse tipo de problema
com os couros da bateria, algum tempo depois foi solucionado, com o surgimento
das peles de “nylon”, que vieram para substituir o couro. Na hora
do lanche, no intervalo, as situações quase rotineiras: quase não tinha nada
reservado para o conjunto. Uma galinha praticamente congelada, pelo frio da
serra, refrigerantes e nada mais. O pessoal responsável pelo bar, querendo
faturar alto vendia tudo, sem a menor preocupação de reservar o lanche para o
conjunto. Nessas horas, o que fazer? Assim mesmo a batalha continuava.
No
decorrer da festa, um senhor me fez um pedido musical. Lembro que a música
solicitada não constava do nosso repertório. Então, no intervalo, eu
pessoalmente justifiquei o não atendimento do tal pedido. Na continuação do
baile, entretanto, lhe oferecemos uma
seqüência de sambas, pela qual ficou muito satisfeito e agradecido pela
atenção. Ficou me tratando, até o fim da festa por “educado”.
Com
o baile terminado e o dia amanhecendo, esse mesmo senhor nos convidou para
conhecer sua casa e tomar um café. Por ser uma proposta de uma pessoa para nós
desconhecida, consultei todo o grupo e, depois de desmontar e arrumar todo o
equipamento nos transportes, resolvemos aceitar aquele convite. A primeira
surpresa que tivemos foi com um automóvel de luxo que ele dirigia. Durante o
trajeto, alguns membros do conjunto foram juntos com ele, que dizia estar muito
satisfeito conosco, com a festa, e em tom animado e de brincadeira, afirmava
que sua casa estava disponível para tudo aquilo que quiséssemos, “menos
mulher”, porque só tinha uma e essa era a dele.
Ele
se dirigiu para Guaramiranga, no topo da serra. Ficamos sabendo de quem se
tratava. Era o Dr. Sílvio Leal, médico de conceito muito elevado em Fortaleza,
que todos os finais de semana se desligava de seus afazeres e procurava repouso
e tranqüilidade naquelas paragens.
Ao
chegar em seu sítio, encontramos uma verdadeira maravilha de paisagem, uma
estrutura fantástica, tudo muito bem cuidado, jardins floridos, uma barragem
artificial, e tudo sob um clima frio, agradável, com um pouco de neblina no
horizonte. E o Dr. Sílvio Leal, com toda simplicidade, nos mostrou,
detalhadamente, todas as dependências de sua morada de campo. A casa, em três
níveis, construída em estilo colonial americano, possuía vários dormitórios,
todos com móveis de madeira, funcionais e artisticamente trabalhados, um bar
completo, salão de jogos, guarda-roupa com vestuário adequado para frio, uma
despensa repleta de mantimentos e de produtos importados e até mesmo uma
belíssima lareira. Fiquei realmente impressionado, pois só tinha visto casas
daquele tipo em filmes. Depois de conhecermos tudo, ele nos levou para uma das
varandas, onde nos sentamos para conversar. Tomamos um café, completo, ocasião
em que ele nos pediu também para ficar para o almoço. Em seguida tocamos um
pouco de violão e o Mardônio cantou algumas músicas. O Dr. Sílvio nos confessou
que estava muito saudoso, em razão da viagem de sua esposa e de uma filha para
o exterior, e que nossa presença o tinha deixado muito feliz.
Enquanto
isso, um de seus moradores, bem defronte à casa, fez uma demonstração da
quantidade de peixes que existia naquela barragem, jogando uma rede de pesca, que
em poucos segundos voltou repleta de peixes. o Carló ficou tão entusiasmado que
pôs um anzol na água, mesmo sem isca, e conseguiu fisgar um peixe... Nessa
manhã, enquanto nosso grupo descansava um pouco e se divertia, resta dizer que
o Fernando Galba nos chamava insistentemente para ir embora, pois segundo ele
teria que fazer uma “corrida” com sua rural ainda naquele dia. Ao
perceber esse fato, o Dr. Sílvio o chamou e muito discretamente lhe deu uma
pequena gorjeta, de leve, para acalmá-lo... Depois dessa providência o Galba se
transformou em um grande puxa-saco. Parou de reclamar, chegou-se para perto de
nosso grupo e ficava nos ouvindo, prestando bastante atenção. Cada vez que o
Dr. Sílvio começava a falar alguma coisa, ele entrava no meio de nós, batia
palmas e dizia para todo mundo:
-
Calma, calma, pessoal, deixem o doutor falar!
E
outras frases similares, típicas de um “puxa-saco” militante.
Almoçamos
muito cedo, mais ou menos às 10 horas, e logo em seguida retornamos para
Fortaleza. Todos ficamos muito agradecidos pela recepção oferecida pelo Dr.
Sílvio Leal, que nos proporcionou bons momentos em seu maravilhoso sítio, o
qual ficou por nós conhecido como o “paraíso na terra”.
Posteriormente,
fui chamado para tocar teclado em uma recepção em sua casa de Fortaleza,
oportunidade em que recebi um excelente tratamento. Fiquei admirado com a
suntuosidade de todos os ambientes, até mesmo com as torneiras dos lavabos, que
douradas pareciam banhadas à ouro. Coisas finas, de gente que tem muita grana,
sabe gastá-la e aproveitar bem a vida...
BARRADOS NO BAILE ???
Certa
vez, o Pablo Sebastian (pianista e cantor estrangeiro, acho que argentino) veio
fazer uma apresentação no Show do Mercantil, acompanhado pelo Big Brasa.
Naquela noite ele iria se apresentar também no Náutico Atlético Cearense, que
estava comemorando aniversário do clube com uma grande festa. Como o Big Brasa
acompanhou o Pablo “na medida certa”, ele gostou muito do conjunto
e convidou-nos a participar, juntamente com ele, do show que iria realizar no aniversário do Náutico.
Show
do Mercantil terminado nos preparamos para a tal apresentação no Náutico. Lá
chegando, pouco antes do horário previsto, com roupas esportivas, conforme
usávamos sempre - tênis, jeans -
fomos barrados por um diretor, na entrada principal do clube, porque não
estávamos de smoking, traje
determinado pelo Náutico para aquela ocasião. Naquele momento, eu disse pronta
e secamente para ele que aquilo não seria problema para nós. Completei,
afirmando para aquele senhor que o Big
Brasa não queria entrar no Náutico, mas, sim, tinha sido convidado para participar do show,
acompanhando o Pablo Sebastian, e que em vista do impasse esperaria apenas uns
dez minutos em frente ao clube, tempo para que alguma coisa pudesse ser
resolvida para depois ir embora. Nos minutos seguintes logo apareceu o Augusto
Borges, com cara de espanto. Ao informar-se da situação chegou-se a nós e
disse-me que o conjunto poderia entrar da maneira que estávamos vestidos mesmo,
sem nenhum problema. Soubemos mais tarde que o Pablo Sebastian, disse ao seu
empresário e ao Augusto Borges, que só faria aquela apresentação se fosse
acompanhado pelo Big Brasa.
Tiramos
literalmente o Náutico do sério naquela noite, o que para nós, foi espetacular!
O Conjunto entrando no clube, desfilando devagarinho com calças jeans, tênis, e todo mundo admirado, nos
olhando. A verdade é que mesmo se quiséssemos seguir as normas daquele baile
não poderíamos, visto que o conjunto não possuía “smokings”, por
não ser do seu gosto e estilo. O Náutico era mesmo - e acho que ainda é - um
saco.
Outra
vez estávamos tocando em uma tertúlia de férias, no Náutico, e estava combinado
que haveria um desfile de moda na piscina em determinado momento. Tudo bem,
iniciamos a tertúlia normalmente. Mais ou menos uma hora depois apareceu um
diretor, que mandou o Big Brasa parar de tocar, porque o desfile iria ter
início. O salão estava quase cheio, música jovem, gente nova, muita animação.
Aí a turma logicamente parou de dançar e “chiando”, sem gostar da
interrupção. Alguns minutos se passaram, com o conjunto parado, quando surgiu
um outro diretor, para raivosamente reclamar:
-
Por que o conjunto parou? Quem foi que mandou parar a música?
E
eu respondi que tinha sido o primeiro, ao que ele retrucou:
-
Podem continuar tocando, que o desfile não vai ser agora. E saiu.
Então
nós continuamos. Quando a festa estava animando novamente, o primeiro diretor
apareceu e, irritado, mais uma vez mandou parar a festa, alegando que o desfile
iria começar (de novo...). Paramos, e a cena se repetiu. Para completar, o
outro diretor subiu ao palco e, com um copo de uísque na mão, aparentemente
meio “chumbado”, reclamou de novo. Àquela altura, realmente eu
perdi o controle, porque estava de saco cheio com aqueles caras. E não me contive,
dizendo:
-
Rapaz, eu quero saber é quem manda nesta merda aqui. Resolvam vocês se é para
tocar ou não, depois venham aqui para nos avisar. Não pode é continuar com essa
bagunça que está.
Com
essa o cara ficou realmente p. da vida e disse que, se dependesse dele, nunca
mais tocaríamos no Náutico. Grande coisa... Tudo ficou naquilo mesmo e tocamos
por lá as vezes em que fomos contratados, que não foram poucas. Pelo visto o
tal confuso diretor não tinha tanta influência assim no clube...
O
Náutico, na minha opinião, sempre foi clubezinho cheio de frescuras. Uma vez
inventaram por lá uma festa, na qual um decorador estrangeiro colocou umas
moças para dançar na frente do conjunto, que ficava escondido por trás de uma
empanada. O pessoal só via a silhueta dos músicos. Coisa de gringo idiota...
O DIA EM QUE FUMEI AO
“CONTRÁRIO”
Tem
aquelas coisas bobas que acontecem conosco, mas quem as sofre não esquece
jamais. Esta foi uma delas. O Big Brasa seguia completo, em direção à Cascavel,
para tocar um baile. Mais ou menos às nove horas da noite e eu pilotando um
tremendo Fusca “azul pavão”, aquele mesmo que chegou a
“bater” o motor duas vezes comigo e quase me acaba de tanto gastar
dinheiro.
Seguíamos
conversando animadamente, apesar da minha atenção na estrada, por estar uma
noite muito escura. Dirigia sempre olhando para a frente. Em certo momento,
pedi ao Edi, que estava no banco traseiro, para acender um cigarro para mim.
Aguardando o cigarro aceso, continuei olhando para a frente da estrada. E com o
braço direito voltado para trás do carro, ouvi o Edi dizer:
-
Toma, Beiró.
Ávido,
segurei então o cigarro entre os dedos, trouxe a mão em direção à boca e
imediatamente dei aquela tragada. Puxei fundo mesmo. Só que, quando o cigarro
encostou em minha boca já foi queimando tudo, pois estava virado ao contrário.
Foi um Deus nos acuda. Tive dificuldades para estacionar, queimei um pouco os
lábios, a língua e a minha camisa. Aquilo poderia ter resultado em um acidente.
Na hora ninguém entendeu o que estava acontecendo. Depois, todo mundo riu
muito. Descemos do carro e eu fui lavar a boca, com a língua queimada e aquele
gosto horrível de pólvora queimada. Passei a noite inteira com a língua ardendo
sem parar. Aquilo me serviu como um aviso. Daí por diante nunca mais fumei
brasa de cigarro ...
UM POR TODOS, TODOS POR UM ...
Na
primeira temporada do Big Brasa em Teresina, em 1968, o conjunto foi bem
divulgado na cidade e iríamos tocar em dois bailes, nos principais clubes
locais. Em uma tarde, depois dos preparativos rotineiros para as apresentações,
como estávamos de folga resolvemos dar uma saída pelas redondezas da casa do
tio Raldir, que gentilmente tinha nos hospedado. Passeamos até a Praça Pedro
II, por lá ficando algum tempo.
Durante
nosso retorno, todo o pessoal do conjunto andava agrupado pela mesma calçada.
Perto de chegarmos uma turma que estava jogando bola em um terreno murado se
postou em cima do muro e ficou olhando para nós. Um deles, muito gaiato, disse
um insulto qualquer para o Dummar, que foi um dos últimos a passar. Naquele
momento não percebemos nada. Mas ao chegar, o Dummar, meio nervoso e muito
pálido, nos contou o que tinha ocorrido. Foi o suficiente para toda a turma se
agitar. O Adalberto, como de costume, foi o primeiro a ficar “enfezado”.
O bicho ficou doido, contagiando todo mundo. Com o ímpeto natural da juventude,
decidimos sair para um possível enfrentamento, prontos o que desse e viesse,
imaginem só. Como estávamos em desvantagem numérica, por
“brilhante” idéia minha, pegamos uns armadores de rede, para servir
de soco inglês, uma arma violentíssima, no caso de haver luta corpo a corpo.
E
retornamos ao ponto onde aquele pessoal tinha insultado o Dummar. O Adalberto,
vermelho como um pimentão, anarquizou todo mundo na frente deles, chamou os
piores (ou melhores) nomes que conheço para aquela ocasião, dizendo que de
“um por um” poderiam vir todos, que ele daria conta sozinho. Os
caras ficaram completamente amedrontados e afrouxaram no ato. Atribuo isso ao
fator surpresa. O resultado é que eles “abriram”, para nossa sorte.
Não tiveram a coragem nem de descer do muro e se aproximar, porque se não o
estrago teria sido feio. Ainda bem ...
VIAJANDO NO “PEITO E NA
RAÇA”
O Big Brasa teve a coragem, o que muitos podem
chamar até mesmo de loucura, de sair de Fortaleza e viajar até Balsas, Carolina
e São Luís, no Maranhão, com quatro guitarras e sem contrabaixo. Verdadeiro
heroísmo, mas que atualmente seria inaceitável. Naquela época não tínhamos
ainda experiência, noção musical e a tecnologia. Tudo estava começando para nós
e, por isso, temos que aceitar o fato numa boa, porque na verdade muita gente
não sentia falta nenhuma do instrumento. Era tudo novidade e a sensação eram as
guitarras. Com certeza, até hoje em dia tem muita gente que não tem
sensibilidade musical para perceber a falta que um contrabaixo faz em um
conjunto.
Apesar das insatisfatórias condições instrumentais
do conjunto, naquela temporada, havia emoção e muito entusiasmo por parte de
todos. Por causa disso e também da novidade que levamos para aquela cidade, o
Big Brasa até hoje é lembrado por quem participou de seus bailes, como o melhor
conjunto musical que por lá atuou. Boas e inesquecíveis lembranças, comprovando
que a primeira impressão é a que fica...
VERDADEIRA OBRA DE ARTE E
PACIÊNCIA
Sobre o repertório, tenho que acrescentar a
execução de um valioso trabalho executado para o Big Brasa por minha mãe, a
Dona Zisile, como o pessoal a chamava. Como o conjunto tinha dificuldades em
organizar e arquivar as letras das músicas, para tê-las sempre à mão, ela se
dispôs a copiar todas as letras, inclusive aquelas em inglês, para um caderno.
E assim o fez. Dezenas de músicas, todas copiadas com uma letra excelente e com
uma boa vontade incrível. Só vendo.
Essas letras tiveram muita utilidade. Eu ainda
tenho, guardado em casa, o tal caderno. Muita gente quando via esse repertório
se admirava. A obra, portanto, foi muito apreciada pelo ser valor.
CARNAVAL NA MARRA? A GENTE QUASE
SE ENRASCA...
Mais
uma daquelas situações difíceis, os chamados
“rabos-de-foguetes”, ou
imprensados, pelos quais nós passamos algumas vezes. O Big Brasa tinha sido
contratado pela AABB, de Iguatu, para animar um baile de “reveillon”.
Ficamos muito entusiasmados com a viagem, mas não nos preparamos devidamente
para o evento, pois apenas ensaiamos várias marchas e alguns frevos, mas com um
detalhe: o conjunto não tinha instrumento de sopro. As músicas teriam que ser
executadas através de solos de guitarra e cantadas. E como agravante, também,
não tínhamos um cantor acostumado com carnaval, que agüentasse a parada, como
se diz. Mas todo mundo continuava inocentemente na maior animação, com os
preparativos e ensaios para o que seria um “grande baile”. O pior
ainda estava para acontecer e, por total falta de experiência, não sabíamos. E
muito menos os contratantes, pois nada perguntaram sobre esse “pequenos
detalhes”.
Chegando
naquela cidade fomos recebidos pela diretoria da AABB, que nos proporcionou um
verdadeiro banquete na sede do clube. Mesa farta, tudo do bom e do melhor, uma
mordomia danada. Depois da lauta refeição, iniciamos a montagem de nosso
instrumental no palco, que em nada nos favorecia, em razão de ficar no mesmo
nível do salão de dança. Isso certamente dificultaria muito a distribuição
sonora do conjunto para todo o clube, pois as pessoas que estivessem em nossa
frente bloqueariam de certa forma as caixas de som.
E
começou o baile. O Big Brasa iniciou a festa com seu repertório normal e seguiu
assim até a meia-noite, quando após de um pequeno intervalo começou a tocar
músicas carnavalescas. Muita gente no clube. O tempo foi passando e
“engolindo” nosso pequeno repertório, que acabava rapidamente.
Nossa
preocupação inicial com o problema da distribuição de som tinha razão de ser.
Além da presença de um grande número de pessoas no salão, havia aquelas que se
postavam paradas na área em frente ao conjunto e às caixas de som, obstruindo
sua propagação ideal pelo clube. E assim, com o repertório carnavalesco se
acabando, nosso ânimo foi diminuindo e a tensão aumentando, porque ainda
faltava muito para a festa acabar. Para completar, alguns dos presentes
começaram a pedir mais animação para o conjunto e algumas músicas que não
sabíamos tocar. Mas não tinha como atender o público, porque nosso volume de
som era pequeno, o repertório também, a distribuição das caixas estava
prejudicada pelo seu posicionamento e o conjunto não tinha os
“metais”.
E
a coisa foi piorando - um sufoco dos
diabos. Até o Mestre Alberto, que estava no palco muito apreensivo, mas mesmo
assim não parava de incentivar o conjunto, de repente pegou o microfone e
começou a cantar uma música antiga de carnaval. Imaginem só que verdadeiro
aperreio.
Para
encurtar a história e dar uma dimensão exata do que aconteceu naquela noite, um
dos garçons, que tocava piston nas horas vagas, deve ter ficado com pena de
nossa situação e perguntou se queríamos que ele fosse buscar em casa seu
instrumento. Nós aceitamos a ajuda, imediatamente. Ele foi pegar seu piston e
logo retornou ao clube. Esse garçom nos prestou uma ajuda muito importante para
que conseguíssemos terminar a festa. Ao final desse pesadelo, pelo menos ficou
a experiência de que tínhamos que estar realmente preparados para eventos
daquela natureza. Experiência essa que muito nos ajudou no futuro.
ERRO DE CÁLCULO EM QUIXERAMOBIM
O
Big Brasa, no final de 1970, foi contratado para animar um baile de término de
curso no interior do Ceará. Viajamos normalmente, pela BR-116, passando pela
localidade conhecida por “Triângulo”, depois por Quixadá, para
chegarmos ao município de Quixeramobim. O término de curso iria se realizar no
principal clube daquela cidade. No local da festa muita movimentação,
preparativos por parte do clube e a moçada da cidade aguardando a chegada do
conjunto. Enfim, a expectativa do pessoal por aquela festa era grande....
Tratamos
logo de providenciar toda a instalação do equipamento, conforme de costume. O
palco do clube, bem amplo e com uma altura razoável, certamente nos
proporcionaria uma boa distribuição de som, além do que nossa visão da pista de
dança era muito boa.
Em
nosso repertório tínhamos valsas muito bonitas e bem ensaiadas, para essas
ocasiões. Dentre elas Contos dos Bosques de Viena, Vozes da Primavera e a Valsa
da Despedida, as mais solicitadas. Acertamos os detalhes com um dos diretores
do clube, sobre o horário que seriam tocadas. Ficou combinado que o Big Brasa
começaria a festa normalmente e dentro de uma meia hora chamaria os
concludentes para dançar a primeira valsa. E iniciamos o tal baile.
O
clube estava muito bem decorado, os presentes bem vestidos, com destaque para
os concludentes e seus padrinhos e madrinhas, estes com vestimentas muito
caprichadas. Logo que o conjunto iniciou
o baile, o pessoal começou a dançar e o salão superlotou. Algumas garotas
perguntaram se podiam subir ao palco para dançar ao lado do conjunto. Respondi,
sorrindo:
-
Claro que sim, podem e devem.
E
elas se juntaram ao envolvente e pesado som do Big Brasa. Muita animação era
sempre ótimo para nós, porque quando as coisas estavam assim significavam um
baile fácil de tocar - e o tempo passava mais rápido, também. Por volta das
22:30 horas nós interrompemos a música para anunciar a primeira valsa, fazendo
uma breve parada a fim de que todos os concludentes se reunissem no salão.
Olhando
aqueles casais de cima do palco, um a um, descontraidamente, enquanto
aguardávamos todos chegarem, notei que um dos padrinhos, um cara bastante alto, estava visivelmente
“melado”, com o andar trôpego e os olhos meio trocados. Aquele
jeitão de quem “tomou todas”. Achei graça ao notar o tal elemento e
o mostrei, discretamente, para todo nosso pessoal. Mas até aquele momento tudo
estava bem, nada de anormalidades.
E
começou a valsa. O salão repleto de pares elegantes enquanto que a platéia, nas
mesas em redor do salão, observava tudo aquilo com muita atenção. Fotógrafos
circulavam para lá e para cá, tentando as melhores poses dos casais.
Dava
até para desconfiar, de tanta organização, de tudo certo até demais. Aí é que mora
o perigo, segundo a Lei de Murphy... Nesses casos sempre tem uma
desmancha-prazer. Aquela noite era a vez do tal sujeito, que estava muito
“chumbado”. Ele começou a dançar e quase não acertava o passo,
cambaleante. E a valsa seguia de forma normal, ao contrário da cabeça daquele
cara, visto que começava a girar em alta rotação com os rodopios que tentava
fazer com a valsa, sempre perdendo o centro de gravidade. E nós todos olhando
para o cara e esperando um desfecho negativo qualquer. Como ele era bem mais
alto do que seu par, de vez em quando abraçava a jovem concludente, de maneira
que ela não pudesse ver seu rosto e notar os enjôos que estava sentindo. E
fazia um trejeito, como se estivesse golfando, ou mesmo prestes a vomitar. E
assim continuou por algumas vezes, sob o olhar atento de todo o nosso pessoal.
E seu mal-estar foi aumentando, ao passo da valsa. Em cada volta que fazia,
víamos que a situação dele ia piorando.
Mais
alguns segundos fatais e ocorreu o lamentável desastre. O coitado, vendo-se na
iminência de vomitar, sem dar tempo de desvencilhar-se daquela jovem, abraçou-a
fortemente, de modo que pudesse vomitar por cima de seu ombro tranqüilamente e
tudo cairia apenas no chão. Ele pensou assim mas a coisa saiu completamente
errada.
Por
um erro gravíssimo de cálculo, abriu aquela bocarra e soltou um jato tipo
“spray” por cima do ombro da mocinha, com tudo aquilo que tinha
armazenado em seu estômago naquele dia. A meladeira foi horrível, atingindo de
raspão todo o vestido de seu par, que ficou completamente borrado de cima a
baixo. Os casais em volta afastaram-se rapidamente para se livrar daquele banho
de suco gástrico misturado à cachaça e a tudo o que tem direito. A moça,
completamente assustada com a cena, largou seu “belo” padrinho,
começou a chorar e correu desesperadamente até a perdermos de vista. Não
retornou mais ao baile. O cara foi levado para algum local, bem distante, para
que se livrasse de uma “prensa” por parte dos pais da concludente.
Durante
tudo isso o conjunto não parou a valsa, o que nessas ocasiões sempre foi a
maneira correta de agir, para não chamar mais a atenção sobre o ocorrido.
Assistimos tudo de camarote. Noite “inesquecível” para aquela
garota e fato imperdoável para aquele irresponsável.
OLHA O BUMBUM DELE AÍ, GENTE !!!
Tem
alguns fatos que não podem deixar de ser contados. Esse é um deles, e aconteceu
várias vezes, nas voltas de festas do interior do Estado.
No
regresso das festas para casa, quase sempre todo o pessoal estava muito cansado
e dormia logo. Alguns comentários sobre o baile, uma brincadeira ou outra e era
o suficiente para todo mundo “apagar” de sono. Mas quando o dia
começava a amanhecer, parávamos no primeiro restaurante de beira de estrada ou em um posto de gasolina
para tomar um café. O pessoal descia, lavava o rosto e se alimentava um pouco.
Depois disso a turma ficava novamente esperta e era nessa hora que o Lucius
começava a preparar sua brincadeirinha.
De
surpresa, quando nosso transporte passava em alguns lugarejos ou cruzava com
alguns pedestres que iam ou vinham da feira, ele rapidamente descia as calças e
colocava a bunda toda para fora do carro. Gozação geral. E o pessoal do
conjunto ajudava, ao gritar para os pedestres apontando aquele bumbum:
-
Olha a bunda dele aí, gente! ... E a gente quase morria de rir da cara de
espanto daqueles transeuntes, que nunca esperavam ver um “desfile de
bumbum”, passando na estrada com tamanha rapidez. Eu sempre avisava para
o Lucius, que ele tivesse bastante cuidado, dizendo:
-
Rapaz, imagine só se vier alguém na estrada, voltando de uma pescaria, e lhe
jogar um anzol?
E
ele nem ligava. Mas em uma dessas vezes ele quase se lasca. Quando estava com
tudo para fora, nossa Kombi passou em frente a um posto da Polícia Rodoviária
Federal. Ainda bem que, por sorte geral, os patrulheiros deviam estar cansados,
dormindo e não viram a cena.
Outra
“ligeira” transgressão que ele costumava cometer, se dava na volta
dos bailes em Fortaleza, na época em que a Avenida Duque de Caxias não tinha
canteiros divisórios, nem “gelo baiano”. De madrugada, como o
tráfego era diminuto ou quase nulo, passava com seu Gordini da mão para a
contramão, desviando das mangueiras ali existentes, em uma verdadeira prova de
destreza ao volante. Dava para notar que naquele tempo já existiam os
inspiradores do novo Código de Trânsito...
PARTICIPAÇÃO EM GINCANAS –
UMA VITÓRIA E UM EMPATE
Por
algumas vezes participei de gincanas, como músico, a convite de equipes de
estudantes. Lembro-me, de modo especial, de duas delas.
A
primeira, que teve a apresentação final das equipes na sede do próprio colégio,
com acirrada disputa entre duas equipes. Eu tinha chegado de uma festa no
interior e ainda estava dormindo, quando o pessoal de uma das equipes veio me
convidar para participar da última tarefa, muito importante pela contagem de
pontos a ela atribuída. A minha mãe relutou um pouco em me acordar, explicando
o cansaço da noite anterior, a viagem de volta, além de outro compromisso que o
Big Brasa teria para aquele dia. Mas, pela insistência daquela turma, ela me
acordou e eu tive mesmo que ir, apesar da enorme preguiça e sono. Tomei um
banho rapidamente, um café e segui com o pessoal. A tarefa das duas equipes era
conseguir um cara que tocasse o maior número de instrumentos musicais. Na
realidade eu não sabia nem direito o que iria encontrar pela frente.
Chegando
ao tal colégio, a rapaziada toda com aquela animação, clima de disputa entre as
equipes, fomos diretos para o palco para fazer a apresentação. A gincana até
aquela altura estava empatada e os pontos finais seriam decididos com essa
tarefa, um músico que tocasse o maior número de instrumentos. Lá chegando,
encontrei-me com o Paulo, pistonista excelente que o conjunto “Brasa Seis”
possuía. Ele ia ser meu forte concorrente, pela outra equipe. O Paulo
apresentou-se primeiro, executando uma das músicas clássicas para piston, com
muita categoria. Um sopro forte, técnica, um solo de improviso, enfim, uma
demonstração espetacular. Foi muito aplaudido pela turma toda.
Ao
chegar a hora de minha apresentação, comecei tocando guitarra. Fiz alguns
improvisos, até procurando o difícil recurso de aproveitar as microfonias entre
os captadores e o amplificador para enriquecer os efeitos, além de tirar vários
sons utilizando os pedais; depois toquei bateria, fazendo batidas variadas de
iê-iê-iê, com pequenas variações e muitos “breques” para
impressionar o pessoal, em seguida toquei um pouco de cavaquinho, de bandolim,
de flauta doce, de violão, de contrabaixo e de outros teclados como piano,
acordeon e escaleta. A medida em que ia mudando de instrumento a platéia
aplaudia bastante e mais se entusiasmava. Ao final de não sei quantos
instrumentos, foi o suficiente para que os jurados votassem, tendo por
unanimidade considerado vencedora a “minha” equipe. Não
desmerecendo o Paulo do piston, como o chamávamos, nossa equipe mereceu a
vitória, porque interpretou de maneira correta a tarefa: “músico que
tocasse um maior número de instrumentos”. Recebi muitos agradecimentos por parte da equipe vencedora, o que, sem
dúvida, foi por demais gratificante para mim.
Em
outra oportunidade participei de uma gincana que fazia parte do quadro
“Colégio contra Colégio”, apresentado pelo Show do Mercantil. A
tarefa não especificava nada de música e sim, dizia que as equipes teriam que
apresentar uma curiosidade, uma atração. Para o vencedor o programa oferecia uma lembrança da gincana e um
pequeno prêmio em dinheiro.
Apresentei-me
por um dos colégios, tocando vários trechos de músicas nos seguintes
instrumentos: guitarra, violão, cavaquinho, bandolim, contrabaixo, órgão
eletrônico, piano, escaleta, acordeon, flauta doce, saxofone, piston e bateria
e, por malandragem também algumas percussões, como tarol, surdo e tamborim.
Faço
questão de dizer que no saxofone e no piston eu apenas conseguia executar uma
música em cada um deles, com muito sacrifício, pois, no caso do piston, não
tinha “embocadura” e nem sopro e para o saxofone faltava
resistência, o que o músico adquire apenas com muita prática. Mas ao final
foram contados, para efeito dessa participação, 14 instrumentos.
Meu
concorrente, pela outra equipe, apresentou como atração um aparelho de rádio,
que ele tinha montado em uma pequena caixa de madeira. O tal rádio nem chegou a
ser ligado, sendo apenas exibido para os jurados e a platéia. Com essa
montagem, interessante, mas que pelo seu grau de dificuldade não daria para
competir com um músico, naquelas condições, ele conseguiu
“arrancar” um empate do corpo de jurados, o que eu considerei um
resultado muito injusto. Assim, dividimos o prêmio, mas como minha equipe
estava na frente, foi a vencedora da gincana. Novamente alegria geral dos
estudantes, aplausos da turma e grande animação ao final do programa. Essa minha
exibição repercutiu de forma significativa, de forma a que depois de muito
tempo o pessoal me reconhecer, na rua ou nos clubes e comentar sobre o assunto,
tecendo elogios a minha performance.
QUEM JÁ VIU MACACO ENJEITAR BANANA?
Na
verdade, macaco enjeitar banana eu nunca vi, nem tive notícia. Mas o Big Brasa
já fez um diretor de clube, do bairro Varjota, em Fortaleza, ficar muito
admirado, chegando mesmo a nos dizer que tinha sido a primeira vez que aquilo
acontecia com ele. Faço questão de registrar esse pequeno fato, talvez
insignificante para muitos, mas não para mim, e pelo que poderá representar
para as gerações futuras a título de exemplo. O caso foi assim.
Tocávamos
uma festinha comum, de clube de subúrbio, em um sábado à noite. Quando chegou a
hora do intervalo, toda a nossa turma se agrupou em uma mesa reservada para o lanche do conjunto, como sempre o
fazíamos. Conversa vai, conversa vem, e chegou o garçom com os sanduíches e
refrigerantes e os colocou sobre a mesa. Mais atrás, vinha um diretor do clube,
que na maior satisfação, mais alegre do que pinto na lama, afastou o que tinha
no meio da mesa e colocou um litro de rum, dizendo:
- Olhem aqui pessoal, podem tomar tudo que a festa
está boa demais!
Disse referindo-se ao rum que trouxera. Eu fiquei
meio sem jeito para responder, em vista da animação daquele diretor, pensando
que estaria fazendo um grande benefício para nós, tentando nos agradar com
aquela bebida, de graça. Mas olhei para ele e, após agradecer a gentileza,
disse que nós não bebíamos e que ele podia levar de volta aquele litro de rum.
Tal foi a surpresa de sua parte, que esse fato foi motivo de comentários entre
toda a diretoria do clube, que posteriormente fez um elogio à nossa conduta.
Às
vezes o músico se dá muito bem, conseguindo faturar até mesmo mais do que o
combinado. Vejam só esse lance.
Contratado
por um médico para tocar em uma recepção, que faria em sua casa, para comemorar
seu aniversário, levei como bigu o Sérgio, que me acompanhava nessas ocasiões,
funções musicais extras, como casamentos e aniversários, para as quais eu
utilizava apenas o órgão. Tive que cobrar um preço mais alto que o normal, pela
hora, tendo em vista que o tal médico, categoricamente, disse que só desejava
uma hora e nada mais. Tudo bem. Iniciei às oito horas da noite, conforme
acertado. Na residência, que ficava perto da Praia do Futuro, muito boa por
sinal, não havia chegado ninguém. Só uns dois ou três garçons e o pessoal da
casa fazendo os preparativos. Essa hora passou rapidamente e não chegou
ninguém. O médico, com toda gentileza, perguntou se eu poderia tocar mais uma
hora. Afirmei que sim e continuei. Tocava algumas músicas, parava um pouco,
tomava um refrigerante e comia salgadinhos e doces. Logo a outra hora se passou
e só alguns “gatos pingados” tinham chegado ao ambiente. E a
história foi se repetindo. Mais uma hora e o pessoal começou a chegar. Mais
convidados e a recepção foi animando, naturalmente depois de alguns uísques do
pessoal.
Enfim,
toquei até as três e meia da manhã. Só parei porque estava verdadeiramente
cansado, saturado de tanta música. E também por questão de consciência, alertei
ao aniversariante que se continuasse a tocar o pessoal só sairia dali de
manhã... E ele prontamente aceitou minha sugestão, a de encerrar a música ao
vivo. Ao final recebi o pagamento em espécie, logicamente por todas as horas e
ao preço previamente acertado. Nessa noite fiz questão de gratificar o Sérgio
com uma quantia maior que a de sempre.
Fiquei
muito satisfeito com o resultado daquela noite de trabalho. Queria logo voltar
para casa e contar o fato para a Aliete. Ao chegar, assim que abriu a porta, eu
brinquei com ela, jogando todo o dinheiro para cima e deixando-o inteiramente
espalhado pela sala de nossa casa. Ganhei nessa função mais ou menos o
equivalente ao meu ordenado de um mês na TV Educativa. Foi bom ou não foi?
A INAUGURAÇÃO DO GINÁSIO PAULO
SARASATE
A inauguração do Ginásio Paulo Sarasate obteve
grande repercussão em Fortaleza, sendo amplamente divulgada através da
imprensa. O Augusto Borges, apresentador do Show do Mercantil, através de sua
empresa, a Borges Publicidade, conseguiu que seu programa fosse realizado no
próprio ginásio, no dia da inauguração.
Para
o Big Brasa foi motivo de muita expectativa, pela novidade de tocarmos em um
ginásio coberto em um evento tão importante como aquele. Durante a semana, por
mais de uma vez, estivemos no local para conhecer os equipamentos (da marca
Quasár) e participar dos testes de som do ginásio.
No
sábado, dia da inauguração, chegamos bem cedo ao ginásio para montar nosso
instrumental e fazer um rápido ensaio com os cantores cearenses que iriam se apresentar. Dentre eles a Maria
Zenáide, a qual, com seus 12 anos, encantou o público pela bonita voz que
possuía. E também o nosso amigo, cantor e compositor Belchior, que apresentou
uma canção magnífica, de sua autoria.
É
muito difícil, para um conjunto musical, se apresentar em um ginásio coberto,
que não foi construído para eventos musicais. Por sua acústica, os sons se
misturam e retornam de várias partes, num eco que confunde cada músico e
atrapalha o ritmo e o andamento. Um dos macetes que descobri, era o de me
posicionar meio de lado, com a guitarra, de maneira que facilmente pudesse
visualizar o pedal da bateria, para acertar a marcação e os compassos. Desse
modo conseguia manter o ritmo. Para resolver parcialmente esse problema
tivemos, em outra oportunidade, que montar um palco com tapadeiras ao fundo,
além de utilizar um bom sistema de caixas acústicas, para retorno do som.
TRÊS PNEUS, ASSIM É AZAR DEMAIS...
O Big Brasa estava retornando de mais uma noite de
trabalho, por volta das 4:30 horas da manhã. Tinha sido um baile no Clube de
Regatas da Barra do Ceará. A turma nessa ocasião era composta pelo Adalberto, Carló,
Severino, Luiz Antônio (Peninha) e eu. Nosso transporte era a famosa rural do
Fernando “Galba”. Durante o percurso, muita brincadeira, pois tudo
tinha saído às mil maravilhas, e estávamos bem dispostos ainda aquela hora. O
Peninha imitava o “Zé Bonitinho”, fazendo suas palhaçadas e o
Adalberto tirava um sarro com o “Galba”, dizendo que aquela rural
estava velha demais e sempre pedindo para que ele andasse mais rápido. E ele
sorria bastante, mas não se alterava nem um pouco com nossas brincadeiras.
À altura da Cidade dos Funcionários, a alegria foi
suspensa, pois a rural furou um pneu. Na hora, o “Seu” Fernando,
disse, com toda a categoria, que só andava prevenido, e como estava com os
pneus um pouco ruins, tinha dois estepes. Entretanto começou a ficar chateado
daí, porque iria atrasar seu serviço, visto que ele teria que fazer uma outra
viagem até o Regatas, ainda naquela madrugada, para trazer o equipamento do
conjunto.
Descemos da rural, ele trocou o pneu e reiniciamos o
regresso rumo a “Messejana City”, como a chamávamos. Assim que o
Galba ligou o motor da rural e o carro partiu, o Adalberto, que estava sentado
no banco de trás, azarou:
- Vai furar o pneu de novo...
Ao que o Galba respondeu, sorrindo, meio sem graça:
- Nem diga isso, só se for muita “zebra” mesmo.
Não esperou quase nada. Pouco mais de dois quilômetros,
quase na frente da sede da sede do DNER, baixou outro pneu da rural e aí
começou a gozação geral. Nesse momento o Adalberto falou de novo:
- Eu não disse que ia furar? E o Galba respondeu, querendo
demonstrar muita calma, apesar de tudo:
- Não tem problema, meu amigo, de jeito nenhum. Eu tenho
outro pneu de reserva, não sou motorista “peba” não. Fique calmo
que eu logo resolvo isso...
E trocou novamente o pneu. À essa altura, a turma já estava
sem graça, querendo chegar em casa, e o sono dominando todo mundo. Assim que o
pneu foi trocado, o Galba mais uma vez reiniciou sua jornada. Logo, o Adalberto
voltou a jogar praga no Galba:
- Ainda vai baixar outro pneu, na certa!
Depois desse último pneu furado o “Seu”
Fernando só fazia sorrir, sem graça, cansado, e também devia estar louco de
raiva do Adalberto, pelas pragas jogadas por ele. A rural continuou, pela
antiga BR-116, e finalmente chegou à pracinha de Messejana. Na curva em frente
à Igreja, o Seu Fernando parou em frente à casa do Peninha, para que ele
descesse. Foi a conta. Ouvimos um chiado bem alto e novamente outro pneu
começou a murchar. Foi o fim da picada. Todo mundo desceu da rural e ficou
enchendo a paciência do Galba, para valer. Desta vez, infelizmente, não houve
saída para ele, pois teve que tirar aquele pneu furado, juntá-lo com os outros,
para procurar uma borracharia. Ficou literalmente “no prego”. Não
sei realmente quando, nem a que horas ele terminou sua missão, porque voltamos
a pé para casa, andando uns quatro quarteirões. Haja pneu e azar, deve ter
pensado o Galba...
Certa
vez, o Big Brasa foi contratado para tocar uma festa junina em uma localidade
chamada Horizonte, a 38 quilômetros de Fortaleza, na BR-116. O conjunto tinha
repertório suficiente para esse tipo de festa. Tudo estava legal menos eu, que
tinha pegado uma gripe daquelas, fortíssima, com direito a muita coriza... Nada
agradável portanto, mas nossa vida sempre foi assim. Trabalho era trabalho e
não adiantava reclamar. E assim seguimos para Horizonte, em um sábado, depois
de nos apresentar no programa Show do Mercantil.
O
local onde o Big Brasa iria se apresentar era um pátio de um colégio, em frente
a uma pequena quadra cimentada, muito limpa e bem varrida, mas com as mesas em
volta, na areia. Tudo muito simples, do jeito que eu gosto. Boa organização, a
quadra toda enfeitada de bandeirinhas típicas de festa junina, venda de churrasquinhos
de “carne de gato”, aqueles depósitos de isopor cheios de cerveja e
o pessoal todo muito animado para a festança.
Começamos
a tocar. O forró “no mundo” e a turma dançando sem parar, uma
maravilha! Mas à proporção que a festa ia animando, a poeira também ia subindo,
trazida para a quadra pelos dançantes. Era um poeiral lascado. Conforme disse,
nessa noite eu estava muito gripado, com o nariz escorrendo bastante feito uma
cachoeira. Molhava um lenço atrás do outro. Minha “técnica” era a
de colocar os lenços molhados para enxugar, atrás do amplificador de minha
guitarra. Em pouco tempo eles ficavam prontos para uso de novo. E tome mais
forró, e o João Ribeiro tome a espirrar... Com o tempo a situação começou a
piorar, fiquei com os olhos ardendo muito, o nariz “em chamas”,
tudo muito ruim. Era difícil manter o mesmo nível de controle do grupo naquela
situação, no que se refere ao roteiro das músicas, pela falta de concentração
de minha parte em virtude daquela “agonia” no nariz.
Horas
depois, notamos um pequeno tumulto no meio da quadra de dança, possivelmente
uma briga qualquer. Observamos mais atentamente e notamos que dois soldados de
polícia estavam levando um anão para fora da quadra. Sabem por que? Soubemos
depois que aquele safado tinha colocado pimenta em pó, no bolso, e saído
espalhando-a pelo salão, apenas por pura brincadeira. Aquela pimenta, com a
poeira subindo, fazia um efeito tremendo. Via-se todo mundo reclamar de coceira
por toda a parte. Uma verdadeira “beleza”. Foi uma bela sacanagem,
mas o tal anãozinho deve ter pago bem caro por ela.
Nas movimentadas tardes e noites de sábado,
invariavelmente eu me deparava com alguns acidentes de trânsito, durante o
trajeto de nossa casa para os clubes, e principalmente na volta das funções
musicais, pelas madrugadas.
Carros
virados, polícia no local e, dependendo do horário, aglomerações, eram
ocorrências comuns. A antiga BR-116 era muito estreita e de mão-dupla, o que
aumentava substancialmente o perigo de batidas e de atropelamentos, em
especial, no trecho da Aerolândia, o mais perigoso, pelo tráfego intenso de
automóveis, caminhões, ônibus, carroças, bicicletas e pedestres, atravessando a
pista a qualquer momento.
Em
uma das noites de sábado, o Big Brasa tinha sido contratado para tocar em um
clube de subúrbio de Fortaleza, no fim da Avenida Leste-Oeste. Eu saí de casa
por volta das 20:00h, acompanhado pelo Sérgio, bigu, de modo a chegar ao clube
um pouco mais cedo, para ligar e testar os equipamentos. Meu carro era um
corcel vermelho, de duas portas, muito legal.
Na
avenida D. Manoel, ao chegar à altura da Santos Dumont, parei no cruzamento
para aguardar o sinal, que estava fechado. Alguns segundos e sentimos uma
batida, de leve, na traseira de nosso carro. Olhei pelo espelho retrovisor e vi
uma camionete, com três caras no banco da frente, sorrindo para nós. Naquela
hora, tive um ímpeto de descer para tomar satisfação. Enquanto raciocinava, os
caras deram nova batida, empurrando ligeiramente o corcel para a frente, no
sentido claro e evidente de nos provocar. Mas o sinal abriu e eu, felizmente,
pude arrancar e seguir, de maneira a deixar aqueles caras para trás. Naquele
noite, mais uma vez tive bom senso para avaliar, e não aceitei aquela nítida
provocação. Mas havia algo para acontecer, aquele noite ainda nos reservava uma
surpresa...
Ao
chegar ao clube, efetuamos nosso trabalho de montagem e testes de equipamentos,
como de rotina, e às 22:00h a festa teve início. Depois de duas horas de baile,
o Sérgio aproximou-se e disse que estava com muita dor de cabeça, pedindo as
chaves do carro para ir dormir. Como nós tínhamos montado aquele carro na
semana anterior, após uma pintura, ele sabia que somente a porta do motorista
estava abrindo, mesmo enganchando um pouco, a outra estava com defeito. Mesmo
assim eu avisei para ele, sobre um jeito especial para abrir a tal porta.
Continuei tocando normalmente e o Sérgio saiu do clube, desaparecendo entre a
multidão. Cerca de dez minutos depois, aparece o Sérgio, p... da vida, agarrado
pelos braços por dois soldados da Polícia Militar, tentando falar algo para
mim. Ao me aproximar, ainda com a guitarra, ouvi ele dizer, quase chorando e
com muita raiva:
-
Beiró, esses caras estão querendo me prender, não acreditaram que eu trabalho no
conjunto!
E
em vão, tentava se soltar dos policiais...
Naquele
momento eu entendi o que se passava. Expliquei ao pessoal da polícia que o
Sérgio realmente era nosso bigu, e tão logo esclarecida a situação ele
prontamente foi solto. O que aconteceu realmente, era que uma patrulha móvel
passava pelo estacionamento do clube, quando avistou um cara - o Sérgio - tentando abrir a porta de um carro,
provavelmente para tentar “puxá-lo”, como se diz na gíria policial.
Ao
ser abordado pelos soldados o Sérgio não portava nenhum documento pessoal,
muito menos os documentos do carro, que estavam em minha posse. Uma
“atitude suspeita”, conforme é mencionada em um manual de
orientação dos policiais militares. Portanto, não acreditaram naquela história
dele, de dor de cabeça, e resolveram confirmá-la, entrando no clube e falando
pessoalmente comigo. Na oportunidade, eu cheguei mesmo até a agradecer aos
policiais pela prontidão daquele “serviço prestado”.
O
Sérgio, por via das dúvidas, não quis mais sair do clube, permanecendo conosco,
no palco, até o final da animada festa.
Estive
em Mossoró, no Rio Grande do Norte, por várias vezes. Uma parte delas com o Big
Brasa, em eventos patrocinados pela TV Ceará, oportunidade em que viajamos em
ônibus de turismo, especial, com toda a equipe de produção, diretores e
artistas e demais participantes do programa Show do Mercantil.
Nessas
viagens o grupo aproveitava bem e se divertia bastante, porque tínhamos
hospedagem, alimentação e transporte tudo de graça. Além disso a preocupação
com a organização dos eventos e contratos não era nossa e sim dos diretores da
televisão. Ficávamos com a obrigação apenas de tocar nos horários determinados,
e com o resto do tempo livre para passear.
Nos
hotéis, tratamento especial, afinal de contas era uma equipe de artistas
cearenses que lá estava. Na cidade, pessoal bastante hospitaleiro e amigo. Uma
das atrações de Mossoró são suas águas termais. Nas torneiras comuns, temos
água morna, uma beleza. E nas piscinas, como as que eu conheci na Escola de
Agronomia, onde o Carló fez sua faculdade, a água vinha de poços artesianos,
saindo a uma temperatura aproximada entre 50 a 60 graus centígrados. Quando uma
piscina acabava de encher, não tinha quem conseguisse tomar banho, porque a
água ficava quente, “pelando” mesmo.
Mas
nós também tivemos temperatura alta, quando tocamos em uma das boates locais, o
“point” daquela época na cidade. O Big Brasa atravessava uma fase
magnífica. Músicas atualizadas de todo tipo. Equipamento bom, contava ainda com
uma percussão extra – as tumbadoras, ou atabaques – e sons de
pedais para minha guitarra, principalmente o “wah-wah” e a
distorção, com seus efeitos belíssimos nas improvisações. Nessa boate havia um
sistema de som para voz excelente, queima de incenso, e ainda contava com um
jogo de luzes e de efeitos chamados psicodélicos, verbete que segundo o
Aurélio, “diz-se de decoração, roupas, objetos etc., de cores muito
vivas, e totalmente fora dos padrões costumeiros.” Enfim foram
verdadeiros “embalos de sábado à noite”, com presença jovem
acentuada e muita animação.
Voltamos
à Mossoró outras vezes, sem o Big Brasa, na companhia do Silvino, cantor do
conjunto, e do Gustavo Silva, o “Gustavinho”, grande amigo nosso
que fazia parte do corpo de jurados do Show do Mercantil. Foram muitas
aventuras, sendo que uma delas foi resolvida às 4:00 horas da madrugada, quando
o Big Brasa estava terminando uma festa no Clube dos Diários e o Gustavinho
chegou na frente do palco, ainda muito disposto, apesar de estar no final de
uma festa, e disse:
-
Beiró, eu estou saindo para Mossoró daqui a pouco. Quer ir também?
Respondi
que sim, no ato. Combinei com ele que iria para casa só para pegar uma roupa e
que ele passasse por lá. Tudo certo e viajamos mesmo ao amanhecer do dia, no
Gordini do Gustavinho, que tinha um motor Renault, muito bom. Uma barra, para
agüentar o sono nas primeira horas. Mas foi tudo cem por cento. Chegamos em
Mossoró, passamos o restante do dia passeando e à noite fomos para um boate,
onde recebidos como artistas da televisão cearense, passamos muito bem,
obrigado...
Por
último, o Big Brasa esteve novamente em Mossoró para, desta vez, animar o baile
de formatura da turma do Carló. Nessa vez eu tive que fazer duas viagens em um
só dia para lá, em nossa camionete Chevrolet, “turbinada”, para
levar o equipamento e em seguida o pessoal todo. Esse baile foi super animado,
principalmente pela presença do Carló, que era chamado apenas de
“Big”, junto com seus amigos de turma, que gostaram de nosso grupo
e se divertiram a valer.
PRESENTE DE GREGO
Os shows que fizemos em Teresina, com o
Ednardo, foram excelentes. A platéia gostou muito, o grupo estava bem ensaiado
e tudo correu bem. Desta vez eu tinha seguido para Teresina de ônibus, sexta-feira
à noite, para que chegasse a tempo, pois os shows seriam realizados no sábado e no domingo, no teatro. Naquele tempo eu
trabalhava na TV Educativa a semana inteira.
O
teatro estava com um palco bem montado, o Big Brasa com seu instrumental distribuído
de forma excelente, boa produção, jogo de luzes com marcações perfeitas, boa
qualidade de som, tudo muito legal.
Durante
as apresentações, um cara, vestido com trajes indianos, com uma túnica
esquisita, ficava circulando entre os corredores, pela frente do palco, sempre
com varetinhas de incenso, que perfumavam o ambiente e até ajudavam a criar uma
atmosfera mística para o show.
Nos
dois shows esta “figura”
esteve presente, deleitando-se com as músicas, com as luzes e todos seus
efeitos, enquanto curtia e espalhava o incenso pelo público. Fim dos
espetáculos, volta para hotel e aquelas coisas de rotina. Na segunda-feira pela
manhã, quando eu estava na estação rodoviária, esperando o ônibus para
Fortaleza, de repente me deparei com o tal cara, que me cumprimentou pelos
improvisos de viola e de guitarra feitos na noite anterior. Gentileza dele. No
final daquele rápido contato, aquela figura estranha disse que tinha um
presente para mim. E entregou-me um pacote, um pouco menor que uma caixa de
sapatos, dizendo que aquilo era para que eu “viajasse” com a música
pelo espaço sideral, em um mundo de sonhos, luzes e cores e uma porção de
coisas mais que ele falou. Eu “saquei” logo aquele lance. Um
punhado de maconha. Imediatamente devolvi o pacote para ele, e agradeci pelo
presente, mas disse que não queria recebê-lo. Como ele insistiu, eu tive que
ser mais ríspido, até meio grosseiro, dizendo a ele que, por favor, se
afastasse de mim. Na verdade, foi o que costumamos chamar de “presente de
grego”!
As drogas estavam por toda a parte. Eu não tinha a
consciência disso, a princípio. Algumas vezes, durante os intervalos dos
bailes, cheguei a receber gratuitamente caixas ou vidrinhos cheios de
“bolinhas”, as anfetaminas, substância que era usada como
estimulante. Ao mostrar para meu pai, ele ficava indignado e comentava:
- “É um verdadeiro absurdo. Um indivíduo
desses não é capaz de oferecer um lanche, um copo de leite ou uma refeição para
um músico. No entanto, com a maior facilidade, de graça, oferece aquilo que não
presta, como bebidas e drogas”.
Pura verdade, mas graças a Deus conseguimos trilhar
nosso caminho, no mundo da música, quase sempre perto desse perigo, mas
conseguindo evitá-lo.
IMAGENS PERDIDAS DE UM FESTIVAL DE ROCK...
Em 1971, o Big Brasa participou de um festival de rock, realizado no auditório da
Universidade Federal do Ceará. Preparamos algumas músicas, escolhidas
cuidadosamente, de modo a causar o maior impacto possível, pois sabíamos que o
evento seria muito bem divulgado, e que boa parte de nosso público, sem dúvida,
tomaria conhecimento da nossa atuação. Dentre as músicas, um blue, no melhor estilo de Jimmi Hendrix,
com um tema especialmente criado por nós, cuja harmonia possibilitava
improvisações para a guitarra-solo, do jeito que eu mais gostava. Além de estar
naquele tempo com uma guitarra excelente, contava ainda com a ajuda de uma
“distorção” e de um pedal tipo “wah-wah”, ambos de boa
qualidade.
Para
esse festival, eu estava muito bem preparado tecnicamente, pois estudava horas
e horas a fio, exercitando escalas e mais escalas, para aumentar a agilidade em
minha guitarra branca, tipo “Gibson”. Essa guitarra, por mim
reformada, possuía um som da melhor qualidade, do qual falei anteriormente.
Passei a semana inteira dedicando todo o meu tempo disponível, revendo os
arranjos, com o pessoal do conjunto, no sentido de que o Big Brasa fizesse uma
apresentação marcante.
Depois
dessa expectativa, chegou o momento de mostrarmos nosso trabalho. O ambiente no
auditório da UFC estava amplamente favorável para nós. Mesa de luzes, com
“canhão”, um sistema de som razoável, amplificadores de boa
potência e qualidade, e muita gente para ver o show.
O
Big Brasa foi o último grupo a se apresentar, dos quatro conjuntos
participantes. Os organizadores do festival fizeram essa escolha de propósito,
creio eu, pois conheciam nosso “potencial de fogo”, naquele
momento, para fechar com chave de ouro aquela apresentação. Estávamos nesse
período, realmente, com um “time” que jogava muito bem, todo mundo
sabia o que fazer, portanto, tudo muito ensaiado e afinado.
Ao
chegar a nossa vez, subimos ao palco, ligamos nossos equipamentos e
“sentamos o porrete”, como se diz na gíria. No primeiro tema
apresentado, os aplausos e a vibração da galera foram enormes, o que aumentou
de forma significativa nosso entusiasmo.
Antes
de iniciarmos a segunda música, chegou a equipe de filmagem do “Canal
10”, a Televisão Verdes Mares, da Rede Globo. Naquele tempo, as
televisões ainda não tinham câmeras gravadoras de videoteipe, e os eventos eram
filmados. As imagens, portanto, só passavam na televisão no dia seguinte, após
a revelação e todo o processo de edição dos filmes da véspera.
Tivemos
muita sorte até nisso, porque, durante a nossa segunda música, um blue, com bastantes improvisações de
guitarra, praticamente tudo foi filmado, com detalhes para a bateria e
principalmente para os solos de guitarra. Naquele dia, eu realmente estava
inspirado. Via aquelas luzes e câmeras em minha frente, as quais, associadas
aos efeitos existentes e ao vibrante som produzido por nossos instrumentos,
faziam que eu me sentisse verdadeiramente em outra dimensão. Torna-se difícil,
para mim, descrever esse tipo de sensação através da escrita. Só a conhece,
quem teve a oportunidade de tocar um rock pesado ou um blue, de improvisar, de
cantar ou de estar entre amplificadores muito potentes. É por aí...
Esperamos,
com toda a ansiedade, para assistir o jornal da Verdes Mares do dia seguinte. E
valeu a pena. O repórter, após ter noticiado o festival, em matéria bem
produzida, apresentou um longo trecho do filme em que o Big Brasa aparecia.
Todo mundo lá em casa vibrou junto comigo. Na rua e nos clubes, nas semanas
seguintes, a repercussão foi extraordinária. Meses depois, tentei conseguir
esse filme, na TV Verdes Mares, mas não obtive sucesso. Fiz o possível com o
setor de filmagens para localizar aquele pequeno filme, mas o pessoal alegava
não mais encontrá-lo. Hoje, essas imagens teriam para mim um valor inestimável.
SOLIDARIEDADE À TODA PROVA
Há
tempos de alegria e tempos de tristeza. Horas para sorrir e horas para chorar.
Este fato, ocorrido com um participante do Big Brasa, meu primo e amigo
Adalberto, merece registro, por ser exemplo de como Deus está presente em
nossas vidas.
O
Adalberto sempre gostou muito de corridas de automóveis. Quando podia marcava
presença no autódromo do Euzébio, para ver a Fórmula Ford e outras corridas de
campeonatos regionais. Em uma tarde de domingo, eu, o Adalberto e o Carló,
fomos assistir a uma dessas provas automobilísticas. Muita gente de Messejana
por lá, aglomeração na entrada e movimentação intensa de pessoas para ver os
carros de corrida antes da prova ter início. Como eu não tinha nenhum interesse
específico, nem tanta empolgação assim por corridas, fiquei circulando por toda
aquela área, vendo um pouco de cada uma das curvas e apreciando a movimentação.
Se é que existia algum controle ou supervisão de segurança do autódromo, no que
se refere à entrada de pessoas nas áreas consideradas perigosas, esse sistema
deveria ser muito deficiente.
Quando
a corrida estava perto do final, eu conversava com alguns colegas perto das
arquibancadas, em frente a reta da chegada. Nos instantes finais ouvi alguém
anunciar o vencedor. Mas, olhando para a pista, a uma distância de uns trinta
metros, via muitos carros ainda passando, velozmente, para completar as voltas
ou para decidir um segundo lugar, não sei bem. De repente, observei um grupo de
três pessoas tentando atravessar a pista, mesmo com alguns carros ainda em
movimento. Uma frenagem brusca. À minha esquerda notei que duas daquelas
pessoas conseguiram voltar atrás. O terceiro cara, que estava fotografando um
dos carros já estacionados em um dos “boxes”, foi violentamente
colhido por um carro branco, que desenvolvia grande velocidade. Pude acompanhar
a trajetória daquele corpo por uns quinze metros, até vê-lo cair no chão. O
rapaz atropelado tentou levantar-se na mesma hora, sem no entanto conseguir.
Nesse momento houve um tumulto geral. Ao mesmo tempo em que várias pessoas
corriam para ver o acidente, outras saíam apressadamente do autódromo. Eu
estava entre os que saíam, quando ouvi um colega me dizer algo assim:
-
João Ribeiro, o “Carló” foi atropelado lá dentro, você viu?
Fiquei
muito assustado e não sabia direito o que fazer. A muito custo entrei novamente
no autódromo, mas não achei ninguém que me informasse detalhes sobre o
acidente. Soube apenas que patrulheiros da Polícia Rodoviária Federal tinham
levado o acidentado para um hospital.
Muito
apreensivo, providenciei minha volta para Messejana, conseguindo carona em uma
“pick-up”, juntamente com o Célio Freitas, nosso vizinho e amigo.
Chegando em casa obtive a confirmação, por intermédio de meus pais, de que o
acidente tinha acontecido com o Adalberto e não com o Carló. Ambos eram muito
parecidos e muitas pessoas os confundiam.
Prontamente
o Adalberto foi atendido em uma unidade hospitalar de emergência. Neste momento
é que se faz necessário destacar a importante providência divina, tendo em
vista que o médico de plantão que o atendeu decidiu amputar a sua perna, tendo
chegado até mesmo a marcar a hora da operação para a tarde daquele mesmo dia. O
“milagre” ocorreu por conta de um atraso desse médico, que nos possibilitou
consultar outro profissional, o Dr. Afrânio, excelente médico ortopedista, que
discordou totalmente do primeiro diagnóstico e, após devidamente autorizado
pelo Mestre Alberto, tratou do Adalberto de forma impecável, curando-o
integralmente.
Após
a notícia desse acidente ter sido divulgada através de emissoras de rádio,
houve solidariedade geral por parte de músicos de diversos conjuntos de
Fortaleza, e de populares que conheciam o Big Brasa, que de imediato se
prontificaram a fazer doações de sangue.
Durante
alguns meses o Adalberto ficou ausente do conjunto, por força do ocorrido.
Nesse período, entretanto, recebeu constantes visitas de amigos e fãs, que
muito se preocuparam com seu pleno restabelecimento. Garotas chegavam a todo
instante levando cartões com mensagens e bilhetinhos.
As
manifestações de solidariedade permaneceram por todo o tempo em que esteve
internado, sendo um dos fatores positivos para sua plena recuperação. Às vezes
a movimentação era tão grande que chegava a interferir no hospital. Seu
tratamento foi muito bem sucedido, não lhe deixando nenhuma seqüela. E ele, com
muita força de vontade e sacrifício, logo que pôde retornou ao palco, ainda com
a perna engessada.
Após
sua saída do hospital, onde passou alguns meses internado, o Adalberto fez
questão de assistir a primeira corrida que houve no autódromo. E esteve lá, de
perto, para conferir tudo. Mas desta vez, nada de fotografias!
O REVEZAMENTO
“PERFEITO”
Nos
períodos de carnaval e “reveillon”, o Big Brasa contratava músicos
adicionais, de instrumentos de sopro. Na quase totalidade das vezes as
contratações foram bem sucedidas, o pessoal desempenhou bem as funções, sem
problemas. Entretanto, toda regra tem uma exceção...
Uma
delas foi em um “reveillon”, no qual o conjunto foi contratado para
animar um baile no Iate Clube de Fortaleza. Eu não tinha nenhum instrumentista
de sopro em mente e tive que me deslocar até a Praça do Ferreira, para o
“ponto dos músicos”, local onde a rapaziada toda se encontrava.
Empresários, para agenciar contratos e músicos diversos.
Não
gostava muito daquele “ponto”, primeiramente porque não tinha tempo
e em segundo lugar porque o pessoal se ocupava demais em falar dos outros, o
que nunca foi o meu forte. Mas fiz contatos com três músicos da banda de música
da Base Aérea. Os instrumentos: sax, piston e trombone de vara. Estaria cem por
cento, pensava eu. Convidei-os para um ensaio e eles desconversaram, dizendo
que não seria necessário porque tinham muita prática, as músicas todas estavam
nos álbuns e não haveria problema. Achei que sim, em vista da idade e da
aparência dos caras, de profissionais experientes...
No
dia do baile iniciamos bem. Até a meia-noite, o conjunto executou seu
repertório normal, enquanto os instrumentistas de fora aguardavam, bebendo
cerveja... Péssimo sinal, mas já naquela hora não daria para fazer nada.
Após
um rápido intervalo, passado o ano, depois da meia-noite entraram os
“metais”. Começamos tocando uns três frevos bem animados e algumas
marchas. Durante uns trinta minutos tudo bem. Mas depois começou o que eu achei
uma verdadeira palhaçada. Ao invés desses três músicos permanecerem no palco,
fazendo arranjos e tocando em conjunto, ficava um só, enquanto outro descia do
palco e bebia cerveja lentamente, nos olhando com a maior calma. Enquanto isso,
o terceiro estava no banheiro, fazendo xixi. Isso durou quase até o final do
baile, apesar de minhas insistentes reclamações aos três irresponsáveis.
Mas
no final, o negócio piorou mais ainda: um deles, o trombonista, que estava de
“cara cheia”, cismou de ficar embaixo do palco e enquanto nós,
logicamente em cima do palco, tocávamos uma música, ele simplesmente virava o
trombone para nosso lado e tocava outra música, ou fazia pequenas frases
musicais completamente diferentes da música em andamento. Foi preciso eu descer
do palco e firmemente ordenar que ele parasse de tocar.
Para
completar, após o baile, mesmo a contragosto, fui efetuar o pagamento aos caras
para logo me livrar deles. Enquanto tirava o dinheiro, contava e pagava, perdi
500 mil, não sei como. Procuramos em volta do palco, por onde eu tinha andado,
sem sucesso. Alguém, na entrada desse Ano Novo se deu bem às minhas custas...
Naquela
noite, houve o que se pode chamar de “revezamento perfeito”: um
tocando, outro bebendo e o terceiro mijando...
UM INESQUECÍVEL DUELO MUSICAL
Certa ocasião, em um sábado à tarde, quando cheguei à TV Ceará para o
programa Show do Mercantil, encontrei três pessoas instalando um equipamento em
uma lateral do palco, perto do local onde o Big Brasa ficava durante todo o
programa. Aquele pessoal, acabara de ligar um amplificador e um órgão
eletrônico. Eu observava discretamente o grupo, enquanto ligava também nosso
instrumental, preparando-o para dar um ligeiro ensaio com os calouros e cantores
da terra, ou seja, uma “rápida passada” nas músicas, como a gente
dizia.
Logo que terminaram sua montagem, um deles, bem
lentamente, com toda a calma, sentou-se ao órgão e começou a tocar. Primeiro,
testou alguns timbres, com diversas mudanças de registros, enquanto empregava
uma harmonia bem estruturada. Percebi, de imediato, que aquele tecladista era
muito bom. Enquanto ele continuava a tocar, executando uma seqüência harmônica,
ou seja, um tema super favorável à improvisações, liguei minha guitarra e
comecei a acompanhá-lo. De início, eu fiz apenas algumas notas e produzi
efeitos sonoros rápidos, inclusive utilizando a alavanca da guitarra,
combinando com a harmonia e o ritmo do órgão. O tecladista, por seu lado,
começou a se empolgar e deu vazão à criatividade. E, nesse clima, descontraído
e gostoso, sem parar, tocamos por uns dez ou quinze minutos. Encerramos aquele
tema improvisado de forma muito legal, parecendo que tínhamos ensaiado por
muito tempo. Na realidade, nem nos conhecíamos e nada tinha sido
programado.
Nessa hora, cheguei perto daquele tecladista para
cumprimentá-lo. E só então pude perceber que era deficiente visual. Aquela
“fera”, chamava-se Sérgio Sá, um excelente músico e compositor, parente
do radialista Colombo Sá, de Fortaleza, e que iria se apresentar, também
naquela tarde, no Show do Mercantil.
O “Serginho”, como era chamado, gostou
demais do som que tiramos, elogiou os meus improvisos e me deu um grande
abraço. Conversamos bastante, tentando marcar um novo encontro musical, para
que aquela sessão pudesse ser repetida. Nunca esqueci esses bons momentos.
Foi um duelo musical que não teve vencido, nem
vencedor, visto que nós, ganhamos a sincera admiração de um músico pelo outro.
ENSINAR O PULO DO GATO, NUNCA!
O Edson Girão sempre foi um excelente músico,
particularmente no que se refere à harmonia das músicas. Muito detalhista e
possuidor de um “ouvido” muito bom, conseguia aprender todos os
acordes de uma música, de qualquer estilo. Nos ensaios por vezes se tornava
maçante, por ser meticuloso demais. Podia demorar, mas só ficava satisfeito
quando executava o encadeamento harmônico perfeito da música, ou para os
leigos, o acompanhamento certinho. E nos mostrava em sua guitarra, com muita
satisfação, os acordes mais difíceis de serem percebidos e que ele tirava
“de letra”. Quando não conseguia perceber um detalhe harmônico ele
ficava visivelmente irritado, dizendo que estava “faltando alguma
coisa”. E persistia na busca da perfeição harmônica, sendo que no momento
que conseguia descobrir o tal acorde, imediatamente se preocupava em ensiná-lo
para nós, na primeira oportunidade que
tivesse.
Enquanto muitos conjuntos musicais aprendiam as
músicas de maior sucesso no momento “na marra” para logo incluí-las
no repertório, mesmo que não estivessem cem por cento corretas, o Edson chegava
mesmo até a discutir nos ensaios, no intuito de fazer prevalecer o seu ponto de
vista – o de executar as músicas com as harmonias corretas, com o qual concordo
plenamente.
Quase sempre, de modo particular em cidades do
interior do Estado, os músicos locais compareciam aos bailes tocados pelo Big
Brasa ou mesmo por outro conjunto da capital para aprenderem
“macetes”, harmonias novas, conhecer um ou outro equipamento mais
moderno, enfim, para aprender mais.
Nós conhecíamos de imediato quando componentes de
algum grupo musical se posicionavam em frente ou ao lado do palco,
discretamente, para nos observar. Pelo interesse demonstrado, atitudes e
gestos, sabíamos que eram colegas que estavam ali para aprender mais um pouco
mais ou até mesmo, quem sabe, para “tesourar” o Big Brasa por
qualquer falha cometida durante a função. Na verdade, dificilmente um grupo se
preocupava tanto assim com a harmonia correta das músicas como o Big Brasa.
Acho que pelas dificuldades encontradas, pelo trabalho difícil e cansativo de
escutar uma música várias vezes até perceber um ou outro detalhe, o Edson
considerava suas descobertas como um “segredo de Estado”, portanto
merecedor de toda a proteção necessária. Muito justo!
Em algumas dessas oportunidades presenciei o Edson
verdadeiramente cercado por músicos, que no salão ou ao lado do palco, nem
piscavam para não perder um acorde ou outro mais difícil de ser feito. Mas por
esperteza, na hora exata em que ia inserir o tal acorde, ele virava um pouco o
corpo de lado de maneira a esconder dos espiões os acordes desejados,
preservando assim seu trabalho. Podiam copiar tudo, menos o “pulo do
gato”...
OS CHATOS DE GALOCHA E OS
“BICÕES”
Quem alguma vez participou de conjuntos musicais os
conhece bem. O Big Brasa identificou, ao longo de sua existência, vários
deles...
- Beiró, lá vem ele de novo ...
E começava a achar graça, já contando com as
perguntas bobas daquele elemento, e também com as nossas respostas, mais
cretinas ainda, na tentativa de bloquear seu papo e encurtar a conversa.
Os chatos, sempre examinavam nosso equipamento,
atentamente, na tentativa de notar alguma novidade que fosse motivo de comentário.
Se não encontravam nada, perguntavam sobre o repertório, se tínhamos incluído
essa ou aquela música, a que horas o conjunto ia começar, quantos intervalos
faríamos, dentre outros detalhes. E ficavam nos rodeando, fazendo com que nosso
bigus tivessem o cuidado para que nenhum cabo fosse pisado ou quebrado por
eles, coisas assim.
A história volta e meia se repetia, eis a questão.
Enquanto nós estávamos ocupados, e com a atenção voltada para nosso trabalho,
eles nos perturbavam com as mesmas perguntas.
Durante a festa, os chatos gostavam de subir ao
palco e falar com alguém do conjunto, somente para “aparecer”. Por
vezes, criticavam outros conjuntos, enquanto nos elogiavam para fazer média.
Por questão de ética, nunca entramos nesse tipo de conversa.
Os “bicões”, por sua vez, atuavam de
maneira diferente. Seu “modus operandi”, era o de aproveitar o
momento da entrada de participantes do conjunto no clube, para misturar-se
entre eles e entrar de graça na festa. Faziam questão até de ajudar a carregar
os equipamentos, para atingir seu objetivo. Chegavam mesmo a tomar um estojo de
guitarra, um amplificador ou qualquer acessório de um bigu, enquanto
descarregavam o material, para com eles entrar no clube. Depois disso,
desapareciam.
Outros tipos de bicões, eram aqueles que apareciam
apenas na hora do intervalo, quando o conjunto estava se servindo de um lanche.
Jogavam alguma conversa fiada fora e depois, de forma sutil, nos surrupiavam um
sanduíche ou um refrigerante. Como o lanche para o conjunto muitas vezes vinha
na quantidade certa, o aparecimento de um bicão poderia significar falta de
lanche para alguém.
A SOCIEDADE COM “OS
FARAÓS”
O
conjunto “Os Faraós” foi um dos grupos de rock de muito sucesso que existiu em Fortaleza. Formado por quatro
irmãos, Luisinho, Sebastião, Vicente e Antônio, tinha uma marca registrada:
repertório quase que totalmente direcionado para músicas em inglês. Não tocava
um samba nem para fazer remédio, como se diz popularmente. Sempre muito bem
ensaiado, possuía um vocal muito bom e apurava seus arranjos de forma a ficarem
idênticos aos originais. Seu líder era o habilidoso guitarrista-solo Luisinho,
também possuidor de uma magnífica voz. O
som dos “Faraós” era inconfundível. O meu pai sempre disse que
gostava mais dos Faraós do que dos Beatles.
E justificava sua afirmação para o Luisinho,
dizendo que ouvia os Beatles com a razão e os Faraós com o coração.
Contingências
da vida. Não foi bem uma sociedade, com contrato escrito e demais
características. Passei a integrar o conjunto “Os Faraós”, como
tecladista, alguns meses após o Big Brasa ter encerrado suas atividades. Nessa
época os “Faraós” também estavam um pouco desmobilizados e as
condições do mercado de trabalho não eram muito favoráveis, pela existência de
uma grande quantidade de conjuntos em Fortaleza naquele período, além das
inúmeras discotecas que invadiram a cidade com som mecânico, tomando o campo de
trabalho dos músicos. Eles se encontravam sem parte do instrumental e eu com
todo o material do Big Brasa. Foi uma junção perfeita, pois o grupo “Os
Faraós” passou a contar com a minha modesta participação como tecladista,
mas que certamente veio mudar a sonoridade característica do conjunto e
enriquecer musicalmente o grupo, também pelo fato do teclado aumentar as possibilidades
de arranjos e de estilo de repertório.
Nos
primeiros ensaios, fizemos todas as devidas adaptações de nosso instrumental.
Alguns amplificadores do Big Brasa, somados com as excelentes caixas de som Bussfle fabricadas pelos próprios
“Faraós”, acessórios de toda ordem e o conjunto ficou pronto. Havia
muita empolgação no ar e ânimo por parte de todos, visto que o “Big
Brasa” e “Os Faraós” não se consideravam rivais e juntos, por
várias vezes participaram de diversas promoções de grande sucesso em Fortaleza.
Cada um tinha o seu público e o seu estilo definido.
Foram
inúmeros os bailes e shows que
participei nessa temporada com “Os Faraós”, entre os anos de 1973 e
1977. No palco sempre muita potência de som, volume alto, jogo de luzes e efeitos
diversos que eram experimentados a cada tempo. Havia uma mesa de luz e de
efeitos, por exemplo, que comandava inclusive a explosão das chamadas
“bombas de fumaça”, criadas por nós, de fabricação caseira. Essas
bombas eram caixas retangulares de madeira com fusíveis de pedaços de fio, nas
quais colocávamos, a princípio, somente pequena quantidade de pólvora. O
problema era quando o Castorino exagerava nas porções de pólvora e a
“chibatada” era grande. Nas seqüências mais animadas de rocks ou nas músicas que antecediam os
intervalos as bombas de fumaça eram
disparadas. A pólvora queimava e subia rapidamente se espalhando por todo o
palco e encobrindo totalmente os integrantes do conjunto. Produzia um efeito
visual excelente, mas em compensação o cheiro da pólvora era de amargar.
Resolvemos esse problema mais adiante, misturando incenso à pólvora. A
luminosidade dos disparos também ficou mais clara e bonita. Chegamos até a
utilizar extintores de incêndio para produzir efeitos em meio a tudo.
Quanto
às luzes, chegamos a utilizar até oito lâmpadas estroboscópicas distribuídas pelo palco, mais dezesseis refletores
coloridos. Em algumas oportunidades usamos também gelo seco, para produzir aquela cortina de fumaça branca que ficava
espalhada por todo o ambiente. Dia a dia criávamos mais novidades e o pessoal
gostava muito. A mistura desses efeitos com o pesadíssimo som que tirávamos era
sensacional e às vezes impressionante.
Nós
tínhamos muito cuidado na preparação dos efeitos, principalmente das bombas de fumaça, para que não houvesse
acidentes. Mas sempre tem aqueles que não se preocupavam muito com o perigo.
Uma noite em Maranguape, antes de acionar duas bombas de fumaça e extintores eu
avistei um cara encostado no palco, de costas para o conjunto. Larguei imediatamente
os teclados e fui alertá-lo no sentido de que ele estava muito próximo das bombas e que aquilo ali iria
“explodir” para cima. Como o conjunto estava tocando a pleno vapor,
e o som do instrumental muito alto, tive que gesticular bastante, apontando
para os dispositivos, para que ele me entendesse. Mas o elemento nem ligou,
permanecendo na mesma posição. Como não tinha outro jeito e tudo estava
posicionado corretamente, no momento determinado o nosso bigu detonou duas
bombas de fumaça e eu acionei os extintores. Tudo isso ao mesmo tempo. Foi uma
cortina de fogo tão grande atrás desse cara que ele se assustou e afastou-se,
meio chamuscado, “fedendo a cão”. Nós quase morremos de achar graça
do susto que ele levou. Depois disso fizemos intervalo, no qual soubemos que o
dito cujo estava reclamando por que o conjunto tinha queimado um pouco sua
camisa nova. Que pena... Falta de aviso não foi.
Em
outra oportunidade, no Clube Vila União, soubemos que um garçom tinha corrido
em direção ao bar, gritando para todos que o palco estava pegando fogo, porque viu fumaça saindo por cima do teto. O aviso
quase causou pânico generalizado, se não tivesse sido desmentido a tempo. Foi a
maior gozação em cima do rapaz, via-se logo que ele ainda não conhecia nossos
“efeitos especiais”.
Nossos
maiores embalos sem dúvida foram realizados no Memphis Club, de Antônio
Bezerra. Eram festas animadíssimas, descontraídas, o público gostava demais do
conjunto e vibrava com o nosso som e efeitos apresentados. Apesar da
responsabilidade pelos contratos nessa época ser do Luisinho, eu sempre me
preocupava muito com tudo. Inclusive com a montagem do instrumental. O meu
amigo Sérgio Alves, anteriormente bigu do Big Brasa, passou a nos acompanhar e
muito nos ajudou também nesse período. Fazia tudo com boa vontade, mesmo
sabendo que para desmontar toda a fiação no final de cada baile, mais de
duzentos metros de fios e cabos tinham que ser dobrados e guardados, além das
pesadíssimas caixas de som, amplificadores e acessórios diversos. Guardo ótimas
recordações desse período em que integrei “Os Faraós”. Nossa
convivência e relacionamento foram excelentes. Sempre admirei muito o Luisinho
como solista e como cantor e sentia que a recíproca era verdadeira, no que se
refere a minha participação no conjunto como tecladista.
OS PRINCIPAIS CONJUNTOS MUSICAIS
DE FORTALEZA
Durante os chamados “Anos
Dourados”, Fortaleza chegou a ter um número muito grande de conjuntos
musicais. A febre do iê-iê-iê incentivava praticamente toda a juventude e assim
houve uma proliferação desses grupos. Quase uma centena deles. Entretanto, como
em toda arte, a qualidade prevalecia sobre a quantidade, e apenas alguns deles
sobreviveram por mais tempo.
Esses grupos
musicais efetivamente marcaram época em Fortaleza e no
interior cearense, atuando com destaque em seus melhores clubes.
Especial
registro quanto ao conjunto “Os Rataplans”, de meus amigos César
Barreto e Barretinho, que teve sua formação oficial a partir de 1966 e que
muito nos inspirou no início do Big Brasa. Vale destacar, de modo especial,
suas primeiras guitarras, de fabricação caseira, confeccionadas pelo Adilson e
que nós também chegamos a utilizá-las por um bom período. Os Rataplans
participaram do primeiro aniversário do Big Brasa, apresentando-se de forma
brilhante, com todo o malabarismo e animação de seu baterista Camelo e o
pesadíssimo som tirado pelo Barretinho, César e Adilson.
Por outro lado é imprescindível também destacar o conjunto
musical “Os Belgas”, que fez muito sucesso em Fortaleza nos Anos
Dourados. Formado pelo Eudes, Edson, Ricardo e Júlio, era possuidor de um vocal
muito afinado e de ótimos instrumentistas, além de ser muito bem ensaiado e
possuir um excelente repertório. Minha
homenagem especial ao amigo Júlio, exímio guitarrista-solo do conjunto, e
também apreciador incondicional dos Beatles, como eu.
MÚSICA - UM DOM DE DEUS
Por
circunstâncias da vida, aos 28 anos de idade, vivendo totalmente dedicado à
música, tive que mudar radicalmente de
profissão, para uma área de atividade totalmente diversa da que eu atuava.
Prestei um concurso público realizado em âmbito nacional para o cargo de
Analista de Informações. Ao ser chamado, assumi de imediato o cargo de Analista
de Informações do Ministério do Trabalho, sendo lotado na Assessoria de
Segurança e Informações da Delegacia
Regional do Trabalho, no Ceará. Isto significou para mim poder trabalhar
efetivamente para o bem do Brasil e participar de uma estrutura de Inteligência
muito importante para a Nação.
Por me
envolver integralmente para o bom desempenho nessa atividade, tive praticamente
que deixar a música. Pelo meu temperamento, como não podia exercer as duas
profissões ao mesmo tempo, em virtude dos horários não compatíveis, dentre outros
fatores, me senti um pouco frustrado e decidi até mesmo vender todos os meus
instrumentos musicais, para que pudesse esquecer mais facilmente. Não sobrou em
casa nem um violão, para marcar presença. O impacto inicial, com a falta da
música, foi marcante, mas foi diminuindo pouco a pouco, compensado talvez pelo
orgulho do nosso emprego, em servir à pátria de uma forma tão importante,
conforme considero. Mas no íntimo a música nunca deixou de estar presente.
Lutei e
me esforcei ao máximo para aprender a nova profissão e assim, ser um bom
Analista de Informações. Minha dedicação foi extrema. Voltei a ler muito, como
nos tempos de infância, só que desta vez para adquirir embasamento mais
profundo, de modo particular sobre múltiplos aspectos da conjuntura regional e
nacional. O tempo foi passando e eu consegui chegar ao topo da nova carreira,
com cursos de formação e de aperfeiçoamento em alto nível na Atividade de Inteligência. A diferença
entre as duas profissões era significativa. Se como músico eu desejava e
necessitava aparecer, fazer sucesso em todos os segmentos possíveis, como
Analista de Informações tinha que manter um comportamento reservado, peculiar à
natureza dos serviços executados.
Alguns
anos mais tarde encontrei-me com a Ana Maria Porto “Nininha”, nossa
amiga de Messejana, professora de música e regente, à qual me passou um
tremendo “carão”. Após ter comentado meu afastamento da música e de
eu ter lhe explicado os reais motivos, disse ela, sorrindo e apontando o dedo
para mim:
- Olhe,
você recebeu um dom de Deus e não está aproveitando como Ele deseja. Você ainda
vai pagar caro por isso!
Aquilo
que a Nininha disse me fez refletir muito sobre o assunto. Comentei com a
Aliete, em casa, e depois de alguns dias resolvi comprar novamente um violão
para “voltar a forma”. E assim foi o recomeço. Após a aquisição
desse violão, comprei um órgão eletrônico, amplificador, microfone e... voltou
tudo de novo, com a diferença de que a música, dali por diante, teria que ser
amadoristicamente. E minha vida ficou mais completa em decorrência dessa
atitude. A Nininha estava certa e a ela eu agradeço o comentário a mim
dirigido. A música é efetivamente um dom de Deus que não pode ser desprezado. E
assim tenho feito, dentro de minhas limitações, procurando utilizar a música
como forma de lazer e de entretenimento sadio para mim, para nossa família,
amigos e colegas. Hoje em dia toda a nossa família gosta demais de música e
meus filhos Alberto Neto e Cristiane sempre que têm algum tempo cantam e tocam
violão e teclados.
O MEU GRADUAL RETORNO À MÚSICA
Após o meu desligamento da sociedade com “Os
Faraós” em virtude de meu ingresso no serviço público, passei alguns anos
totalmente afastado do meio musical, conforme falei anteriormente, mas sempre sentindo
aquele desejo reprimido, uma vontade interior de tocar novamente. Pouco a pouco
as experiências de retorno à música começaram a ocorrer.
Primeiramente formei um grupo musical, sem grandes
pretensões e sem compromissos profissionais, com três grandes amigos, Roberto
Faria da Silva (Beto Carioca), sua esposa Rinah Melo e nossa amiga Laury. Usava
a princípio um órgão Yamaha PSR 70, muito bom, e um sintetizador DX7. Começamos
a ensaiar e aprontamos um repertório de alta qualidade. Nos apresentamos em diversas
oportunidades em encontros de amigos e chegamos até mesmo a realizar algumas
funções remuneradas. Evoluímos tanto no instrumental e no repertório quanto
tecnicamente. O pessoal ficava cada vez mais afinado e aprendia rapidamente os
macetes profissionais.
Em outra
fase fui convidado por meu amigo César Barreto a participar do Projeto Luiz
Assunção, que consistia em apresentações públicas nas principais praças de
Fortaleza, sob patrocínio da Prefeitura Municipal. Foi uma experiência rica,
pelo contato direto com o público e repertório mais popular. Conheci outros
músicos, que acompanhavam o César, de estilos diferentes, mas todos de ótima
qualidade. Nesse período eu utilizava uma viola de doze cordas, de propriedade
do César, que possuía uma sonoridade espetacular.
O César sempre brincava comigo, dizendo que tinha
conseguido me colocar “na vida” novamente, referindo-se à vida de
músico profissional, com todas as suas dificuldades. Sobre o César Barreto, é
importante dizer que na época em que integrava “Os Rataplans”,
conjunto famoso em sua época, ele conseguia estudar para o vestibular dentro de
casa, no meio de vários ensaios simultâneos. Um músico treinando bateria, outro
tocando guitarra e ele lendo suas apostilas calmamente. Hoje em dia é Técnico
do Tribunal de Contas do Estado e professor universitário. No entanto nunca
abandonou o gosto pela música.
Com o César estive também fazendo um programa de
televisão na TV Educativa e realizamos alguns shows pelo interior do Ceará, um deles em Crateús e outro em
Campina Grande, na Paraíba. Além disso tive a oportunidade de alguns créditos
como tecladista e guitarrista, nas gravações de dois discos por ele produzidos.
Mais à frente tive um reencontro com o Airton
França, depois de alguns anos em que não nos víamos. Ele ficou muito
entusiasmado com a idéia de começarmos novamente a tocar, por pura diversão, e
combinamos fazer uma dupla. Primeiramente o Airton comprou um piston novinho em
folha, com surdina e tudo. Recuperou a embocadura bem depressa e logo começou a
solar de novo as antigas músicas do Herbert Albert. Alguns meses mais tarde
decidimos ir a Manaus, onde eu adquiri um teclado mais moderno e ele comprou um
violão importado, tipo Ovation. Continuávamos ensaiando. O que nos surpreendeu
foi a rapidez com que o Airton desenvolveu suas harmonias ao violão. Estudava
por cifras e comprava tudo quanto era revista que contivesse músicas novas. Na
época que ele apenas era pistonista do Big Brasa não cantava quase nada,
fazendo participações vocais muito rápidas. Em nossa recente dupla, o Airton
cantava muito bem todo o repertório, particularmente as músicas do Fagner.
Ensaiávamos umas três vezes por semana, com
bastante afinco, nos finais de tarde. De repente ele apareceu com um
amplificador novo, para que o som de retorno tivesse melhor qualidade. Comprou
também uma pedaleira, com vários pedais de efeitos. Por muitos meses nosso
grupo permaneceu firme. E eu também passei a ficar novamente alucinado pela
música.
Como o Airton viajava freqüentemente para o Rio de
Janeiro, a negócios, pedi para que ele
me trouxesse o novo modelo do sintetizador mais famoso da Yamaha, o DX7-II,
instrumento excelente e que até hoje possuo. Com esse teclado adquiri um
acessório muito interessante, chamado de Breath Control, que tecnicamente
consiste em um aparelhinho com um bocal, interligado ao sintetizador, onde você
produz um sopro que é enviado para o gerador de áudio do equipamento, de forma
que quando tocamos no teclado o som se assemelha a um instrumento de sopro, de
acordo com o timbre ou registro escolhido.
Por último, vale destacar os mais novos recursos
musicais trazidos pela Informática, este fascinante mundo que descobrimos há
alguns anos, com seus inúmeros programas direcionados para a música. Por
curiosidade e satisfação pessoal adquirimos um teclado, marca Roland,
específico para o acionamento desses programas. Desde a criação de melodias e
harmonias, passando pela sonorização, escolha dos instrumentos, elaboração das
partituras, gravação e possibilidade de alteração a qualquer tempo das músicas,
tudo podemos conseguir facilmente através do computador e seus softwares
musicais. Tal a facilidade de operação e de recursos que um dia consegui
produzir rapidamente um playback para a minha filha Cristiane cantar, na época
em que ela estudava no Colégio 7 de Setembro.
A COMEMORAÇÃO DOS “VINTE
ANOS DE EMBALO”
Para
comemorar vinte anos de música tive a idéia de promover uma festa que se
denominou “Vinte Anos de Embalo”, com a participação de músicos do
Big Brasa e do conjunto “Os Faraós”. A festa, amplamente divulgada
através da imprensa local, foi realizada no Balneário Clube de Messejana, no
dia 09 de julho de 1988, e obteve pleno sucesso, tanto assim que foi seguida
por mais outra, semelhante, poucos meses depois.
A iniciativa
dessa promoção foi muito bem acolhida por todos. O objetivo principal da
realização desse evento, para mim, foi o de reencontrar amigos da época,
músicos ou não, além de registrar tudo aquilo em áudio e vídeo, pelas
facilidades que temos hoje para, de certo modo suprir a ausência de gravações
em vídeo dos tempos mais antigos.
Havia um
entusiasmo e, ao mesmo tempo, um sentimento de saudade por parte dos que
participaram efetivamente daquela vivência musical. Por outro lado, grande
expectativa e animação dos mais jovens,
nossos filhos e seus colegas, que ansiosamente desejavam ver seus pais atuando
no palco de novo.
O jornal
“O Povo”, em edição de 09 de julho de 1988, na coluna
Saudosismo, publicou uma extensa matéria
sobre o evento, sob o título “Os Embalos da década de 60”.
A
referida nota afirmava:
“No
final dos anos sessenta dois grupos musicais eletrizavam a juventude cearense
com suas participações nas festas que animavam nos mais diversos locais. Eram
Os Faraós e o Big Brasa., que em suas exibições, além dos sucessos da época,
tinham como base um repertório pautado nas composições dos Renato e seus Blue
Caps, The Beatles e Rolling Stones. Após duas décadas dessa efervescência
alguns dos ex-integrantes dos dois grupos voltam a tocar e cantar juntos, na
perspectiva de relembrar momentos dançantes passados e atuais. A primeira de
uma série que se intitula “Vinte Anos de Embalo” vai acontecer
hoje”...
Nesta
reportagem, seguindo-se aos comentários sobre os diversos aspectos musicais
daquele período, há um trecho da entrevista concedida por mim ao repórter, na
qual afirmei:
“
Foi uma experiência bem vivida. Tocávamos com todos os artistas que se exibiam
no programa do Augusto Borges. Eu fazia a seleção dos calouros e por meu crivo
passaram entre outros Mardônio, Maria Zenáide e as irmãs Lena e Leda. Esta
última se tornou depois a “Miss Lene”. Acompanhamos muitas vezes o
Jorge Mello, o Belchior e o Ednardo, com quem chegamos até a defender uma
música – Beira-Mar - num festival
em Recife”.
Mais
adiante, na mesma nota, procurei traçar um paralelo com as músicas e grupos
atuais fazendo a seguinte colocação:
“Hoje
em dia falta melodia nas músicas. São meio brutas, onde a harmonia não é
lapidada adequadamente. Isso não existia nas músicas do Renato e seus Blue
Caps. As composições dos Beatles nem se fala, pois eles usavam mais romantismo
e trabalhavam bem melhor os arranjos”. Ao final, a publicação informa que
os ingressos para os “Vinte Anos de Embalo” serão limitados e que
do show participarão várias pessoas
que viveram intensamente nos palcos a época da Jovem Guarda.
Entre
eles Edson Girão (voz e guitarra), Luciano Franco (contrabaixo) e João Ribeiro
- Beiró (teclados), como os três ex-membros do Big Brasa; Luisinho (guitarra e
voz), Sebastião (vocal e contrabaixo), Vicente (guitarra e vocal) e Antônio
(bateria) pelos Faraós. Ainda a presença de Roberto Carioca (cantor), Rinah e
Laury (cantoras).
A
promoção foi um sucesso e obteve ampla repercussão em Fortaleza. Todos os seus
objetivos foram plenamente alcançados, dentre eles o principal, ou seja, o de
realizar uma confraternização com todos aqueles que participaram daqueles bons
tempos.
Outra
matéria sobre o evento foi escrita pelo Luiz Antônio e publicada no jornal Tribuna
do Ceará, edição de 08 de julho de 1988.
"It
was twenty years ago today, Sargent Peppers taught the bend to play." (Foi há vinte anos atrás que Sargento Pimenta
ensinou sua banda a tocar). Com essa frase os Beatles lançavam em abril de
1967, o seu sétimo e mais controvertido LP na Inglaterra, o Sargent Peppers
lonely Hearts Club Band, com toda uma revolução sonora e poética.
Em Messejana no mesmo mês surgia, de um grupo de jovens
apaixonados por toda e exuberante enxurrada de inovações da época, o Conjunto
Musical Big Brasa, bem inscrito dentro dos padrões vigentes da jovem guarda.
Composto por João Ribeiro, Carlomagno, João Dummar Filho, Marcos Oriá e
Severino Tavares, usando equipamentos feitos aqui mesmo pela banda “Os
Rataplans”, que com caixinhas de som primitivas de seis watts de
potência, resolveram inaugurar no Ceará a tal estrada do rock, hoje
tão difundida em outros grupos. Tendo como prefixo a música And I Love Her, dos
Beatles, o Big Brasa logo passou a introduzir inovações no cenário musical
local, que eram privilégios dos grandes centros. Em um curioso paralelismo, as
bandas pioneiras e músicos de Heavy Metal, como Rolling Stones, Jimmy Hendrix
Experience, Cream, com o Eric Clapton, introduziam efeitos como a distorção,
obrigatória em toda banda metaleira, o wah-wah, e outros recursos, e o Big
Brasa não deixava por menos: os adotava em seus bailes para consternação dos mais velhos, com ouvidos
“nelsongonçalveanos”, e para a excitação da moçada”. E
continuava, referindo-se a um “Coroa muito doido”, dizendo:
“... O mais interessante era que o mentor de toda a
história era um senhor de quase cinquenta anos, maçom, de nome Alberto Ribeiro
da Silva, que além de dar uma força
e orientação para a moçada, mandando
“sentar o pau no rock”,
ainda se deslumbrava com os sucessos dos Beatles, como Help, Hello Good Bye e
Boys, ou então com Satisfaction, Jumpin Jack Flash e Under My Thumb, dos
Rolling Stones, essa última sua predileta.
Com um vigor de fazer inveja a muito gatão de hoje em
dia, ele se entusiasmava quando o rock fervia no palco, incentivando-o como um regente. Roqueiro de cabeça feita,
exigia que a turma abrisse o gás, o que a garotada cumpria com muito gosto.
Pode-se dizer que este avançado senhor, eternamente jovem, foi uma das peças incentivadoras
do rock aqui no Ceará, quando ainda
era uma coisa muito “revolucionária”.
“E pasmem - ainda chamava os seus amigos e
companheiros de geração que torciam o nariz ante a barulheira de seus pupilos
de "caretas e quadrados" e os espinafrava com uma irreverência de
fazer inveja ao próprio John Lennon. Nem é preciso dizer que o Big Brasa
inteiro adorava o Mestre Alberto,
como ele era carinhosamente chamado. Em 1968, no auge do movimento hippie, o Big Brasa aumentou sua
tonelagem sonora com equipamentos avançadíssimos para a época, e músicos como o
Peninha, Lucius Maia, Adalberto Pereira, Edson Girão, Luciano Franco, Edi,
Joãozinho, Lurdinha, passarem a compor o dinâmico plantel do Big Brasa,
que inclusive acompanhou e fez arranjos
para os primeiros shows do cantor e
compositor Ednardo, bem como inspirou, em primeira instância, o guitarrista
Manassés, um dos melhores do mundo, mas que na época, assistia aos solos do
João Ribeiro (Beiró) no Maranguape Clube com um brilho de admiração no olhar.
Após anos ligado ao Programa Estúdio 2 e ao Show do Mercantil, na extinta - TV Ceará, o Big Brasa debandou
em
OS AMIGOS
MÚSICOS QUE INTEGRARAM A FAMÍLIA BIG BRASA
-
Os participantes do Big Brasa (em ordem alfabética)
Primeiramente,
gostaria de dizer que o Big Brasa sempre manteve sua filosofia de preferir
músicos pelas suas qualidades pessoais, de conduta, educação, comportamento e
responsabilidade, do que simplesmente por sua maneira de tocar, ou seja, suas
habilidades como instrumentista. No início éramos todos estudantes
secundaristas, universitários ou pré-universitários.
Isso
quer dizer que é preferível você ter uma equipe mediana, mas que cumpra sua
missão, do que ter um grupo fantástico, tecnicamente, mas irresponsável no
cumprimento de horários, comportamento, entre outros aspectos. Nunca nos
arrependemos de ter mantido este sistema. Tivemos sempre uma equipe de pessoas
que “jogava para o time”.
Inadmissível
se falar em um grupo musical, tecer comentários sobre uma etapa inesquecível de
nossa vida, sem mencionar inicialmente aquelas pessoas que estiveram no mesmo
barco que nós, desempenhando suas funções com dignidade, esforço, sacrifício e
amor pela música.
Abaixo,
em ordem alfabética, estão os músicos e colaboradores que tivemos em nossa vida
musical, com breves comentários sobre cada um deles.
Adalberto Pereira Lima – guitarrista-base e posteriormente
tecladista. Meu primo, amigo e cunhado. Teve seu ingresso no Big Brasa a partir
de 1968, quando chegou a Fortaleza, para estudar, um ano depois de nossa estada em Balsas, na
época uma pequena cidade do sul do Maranhão. Preparou-se para ingressar no
conjunto, aprendendo violão. Ao chegar, logo assumiu a função de
guitarrista-base. Após algum tempo, em vista da necessidade do próprio conjunto
em razão da falta de tecladistas, passou a tocar órgão eletrônico, instrumento
que aprendeu rapidamente e desempenhou de forma bastante satisfatória.
O Adalberto fez parte da espinha dorsal do conjunto
por muito tempo. Além de tocar no conjunto, dirigia com grande habilidade,
dividindo comigo a responsabilidade de levar e trazer “numa boa”
todo o grupo para as viagens que fazíamos. Passamos por inúmeras situações
difíceis, ao volante, mas graças a Deus sempre nos saímos bem.
Hoje em dia é engenheiro agrônomo, reside em
Balsas, e exerce atualmente função pública de Chefia no Instituto de Terras do
Maranhão (ITERMA). Além disso é também professor de Química e Biologia na
Universidade Estadual do Maranhão (UEMA).
Airton França - “Torinha” - pistonista. Chegou ao Big
Brasa com bastante experiência musical, visto que tinha integrado outros
conjuntos e também estudado música na Banda do Colégio Pia Marta, liderado pelo
padre Luiz Rebufinni. Foi apresentado ao conjunto pelo Adalberto, que o
conheceu na Universidade Federal do Ceará (UFC). Possuidor de um sopro muito
forte, tirava sons legais no piston e tinha ótimo tino musical para os
arranjos. A sua atuação agradou tanto à direção do conjunto quanto ao público
em todas as apresentações que fez. Foi uma boa companhia para todos nós,
particularmente para o Mairton, também pistonista, sobre o qual exercia certa
influência. Sempre foi muito responsável e de conduta irrepreensível, jamais
criando qualquer espécie de problema para o grupo. Apesar de ter um pouco mais
idade do que eu e experiência musical anterior, sempre respeitou o princípio de
liderança de minha parte em relação ao grupo. No que se refere a parte musical,
trouxe muito enriquecimento para os arranjos, com os duetos de piston com o
Mairton. O Airton, além das qualidades acima mencionadas, demonstrou seu
reconhecimento pelo convívio com a nossa família e ainda hoje o demonstra
quando faz os melhores elogios e trata muito bem os meus pais. Na atualidade é
engenheiro civil e empresário.
Amaury Pontes - “Tijibu” - bigu. Exerceu essa função
conosco por algum tempo e sempre ajudou bastante o Big Brasa. Muitas vezes
chegamos a fazer manutenções completas em nosso equipamento, preparando o
material para que tudo desse certo nas tocatas. Mais tarde, enquanto ainda
acompanhava o conjunto, conseguiu também empregar-se com o Augusto Borges,
apresentador do Show do Mercantil. O Amaury é nosso amigo e vizinho até hoje,
em Messejana. Atualmente trabalha como câmera-man na TV Ceará (TVC), antiga TV
Educativa.
Armando - cantor. Gente boa, simpático e de fácil relacionamento.
Participou do Big Brasa, como cantor, durante um carnaval realizado em
Cascavel. Depois passou a integrar o
grupo “Alta Tensão”, que chegou a gravar e a viajar até pelo
exterior. Bom profissional, ainda trabalha com seu grupo no Pirata, casa
noturna de Fortaleza, conhecida no Brasil inteiro por suas festas animadíssimas
às segundas-feiras.
Carlomagno Pereira Lima - “Carló” – contrabaixista
e vocalista do grupo. Meu primo, amigo e cunhado. Iniciou no conjunto tocando
guitarra, mas fazendo o papel de contrabaixista, visto que nos primeiros meses
o Big Brasa não tinha contrabaixo. O Carló, em um breve período, exerceu também
a função de cantor do conjunto. Durante sua permanência, também fez parte da chamada
“espinha dorsal” do grupo. Moramos juntos por muito tempo e o
considero como mais um irmão. Participamos de diversos momentos da juventude
juntos, vivendo praticamente as mesmas emoções. Teve que nos deixar em virtude
de ir cursar a faculdade na Escola de Agronomia de Mossoró, no Rio Grande do
Norte, onde se formou. Desenvolveu posteriormente projetos agrícolas em Balsas.
Há algum tempo assumiu a direção técnica da Televisão Rio Balsas, afiliada da
Rede Globo, emissora pertencente ao nosso amigo Francisco Coelho, hoje deputado
federal. Nesse período participou de diversos cursos sobre televisão, no eixo
Rio-São Paulo tornando-se um expert no
assunto. O Carló, além dessas habilidades técnicas para eletrônica, ainda é
professor de Matemática e de Física da UEMA. Entretanto, nunca parou com a
música. Sempre que pode está com seu violão e sua voz para animar os amigos.
Gosta demais de uma seresta, de compor e é um amante da boemia por
excelência.
Castorino - Francisco Jorge da Silva
Rodrigues - bigu. Da época da sociedade com o conjunto musical “Os
Faraós”. O Castorino era totalmente pirado. Pequenino, usava cabelos bem
longos e dançava o tempo todo no palco, fazendo trejeitos e mil palhaçadas.
Certa noite, em um baile, levou um tremendo choque na mesa de luz e efeitos
quando foi rearmar uma “bomba de fumaça” e a corrente elétrica
ainda estava ligada aos contatos. Todos nós achamos muita graça dele. Ele
também riu, mas somente depois de ter se recuperado daquela
“cacetada”.
Cefas - saxofonista. Natural
de Ipaumirim, interior cearense, integrou o conjunto durante algum tempo. A
princípio, tinha grande dificuldade para improvisar, e eu tive que ensinar
“improvisos” para que ele os fizesse em algumas músicas.
Inocentemente, por causa de seu jeitão de matuto, me fez passar pequenos
vexames. Um deles, quando puxou bruscamente uma colega nossa pelo braço até que
ela parasse, para perguntar:
- Esse cheiro é teu? Referindo-se ao perfume
da garota.
Outra
vez, no Clube dos Diários, quando distraidamente, em frente a uma das caixas de
som, coçava “aquilo” na frente do palco. E por último, no Clube
Líbano, quando tocava “Saxofone por que choras”, bem na frente do
palco e durante a música ficou com o nariz entupido. Não contou conversa. Afastou
rapidamente o saxofone da boca e tapando uma das narinas com um dedo, soprou
fortemente. Naquela hora, o “pombo sem asa” saiu voando velozmente
até o chão. Que vergonha... Eu fiquei sem saber para onde olhar, naquele
momento. Apesar desses pequenos deslizes, era gente boa, brincalhão e fácil de
lidar. Sabia tudo sobre a história da II Guerra Mundial e era fascinado por
Hitler. Soube que ainda hoje é
saxofonista em Ipaumirim.
Francisco Alves da
Silva – “Chico da
Mazé” - bigu. Vizinho nosso, participou das primeiras apresentações
do Big Brasa, como pandeirista, e depois foi nosso bigu. Nos ajudou por um
período relativamente pequeno. Um dia conseguiu a “proeza” de
esquecer o suporte do tarol para uma festa, por não conferir o material
acertadamente. Hoje encontra-se em São Paulo.
César Barreto - Guitarrista-base e principal vocalista do excelente
conjunto musical “Os Rataplans”, que marcou presença acentuada em
Fortaleza nos Anos Dourados. Meu grande amigo pessoal de longas datas, desde a
infância, posso afirmar até mesmo que temos vínculos familiares. O César me
transmitiu ensinamentos, com sua simplicidade, sobre os primeiros passos na
música, a partir da estréia do conjunto Big Brasa. Juntos participamos de
diversos eventos musicais, tanto em Fortaleza e no interior cearense, quanto em
outros Estados. Além de ser um músico de primeira categoria, o César também é
compositor, com quatro ótimos discos gravados. Privilegiado por um elevado
“quociente emocional”, mantém bons relacionamentos em diversas
áreas de atuação. Tem participação ativa na vida cultural da cidade até hoje,
na imprensa escrita, no rádio e também na televisão cearense, além de diversos
projetos musicais que desenvolveu em sua carreira. Costumo dizer que o César
possui uma memória realmente fantástica, pois consegue armazenar facilmente uma
enorme quantidade de letras de músicas, poemas, versos, piadas e histórias de
todos os tipos. Mantém em sua residência vários instrumentos e acessórios
musicais de qualidade para seus ensaios, gravações e shows. Formou-se em Direito ainda na época do conjunto “Os
Rataplans” e há tempos é advogado do Tribunal de Contas do Estado. É
também professor da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Faz tudo isso mas
não esquece nem um minuto a música...
José Cláudio Pereira Viana - contrabaixista.
Bom músico e companheiro, sempre aplicado nos ensaios ao aprimorar suas
técnicas. Nos acompanhou durante todos os shows da temporada do Ednardo, cantor e compositor cearense, no Maranhão e no Piauí.
Ao chegarmos um dia em uma cidade do interior do Estado, após instalarmos
primeiramente o equipamento no clube, como era de costume, fomos jantar em uma
pensão daquelas bem ruins. O Cláudio, nessa hora, encontrou logo uma barata em
cima de uma cama, quando voltava do banho. Mas o pior estava por chegar: na
hora do jantar, a dona da pensão colocou cinco pratos feitos para nós, os
conhecidos “PF”. No meio da mesa havia uma garrafa de molho de
pimenta, e ele perguntou para se aquele molho era forte. Ela respondeu que sim.
Ele resolveu “testar” e encharcou seu prato. Lascou-se
completamente, do “primeiro ao quinto”, com se diz no jogo do
bicho, pois a pimenta era tinindo e ele não teve a menor condição de comer
nada, inutilizando assim a sua própria alimentação. Foi uma gozação geral por
parte do grupo e ele acabou passando a noite inteira sofrendo, pela falta
daquelas calorias. O Cláudio formou-se em Odontologia e desenvolve sua
atividades profissionais em Fortaleza.
Colares - Por algum tempo, nos anos iniciais, foi algumas vezes
motorista do Big Brasa, tanto em Fortaleza quanto no interior do Estado. Além
disso, indiretamente protegia nossa turma por ser um policial civil. Imprimia
respeito pelo seu porte e, mais ainda, por ser um “tira”. Foi o
Colares que, por ficar sabendo de meu gosto por armas, informalmente me
transmitiu os fundamentos teóricos e as primeiras lições práticas de tiro de
defesa com armas curtas.
David - vocalista e ritmista. O David pertencia a nossa turma de amigos de
Messejana. Ficou no conjunto durante alguns meses do seu primeiro ano. Antes do
Big Brasa ser formado, participava ativamente das alegres serenatas para as
nossas paqueras, colegas e namoradas do distrito. Possuía um repertório bem
atual e também ajudava a parte rítmica com um pandeirinho. Formou-se em
Medicina e reside em São Paulo.
João Dummar Filho - guitarrista e vocalista. O nosso amigo Dummar, também excelente
compositor, esteve com o Big Brasa em seu início. Chegou até a viajar para
Balsas com o conjunto, naquela inesquecível temporada, e participou de muitos
bailes em Fortaleza. Enriqueceu o Big Brasa não só com a sua voz, mas também
com sua maneira vibrante de tocar e de cantar. O Dummar se empolgava muito
quando cantava, sentindo a música e transmitindo sua vibração para todos os
demais. Uma se suas características marcantes era a forte “batida”
que fazia ao violão e guitarra. Muito inteligente, simples, possuidor de um
carisma especial e apreciador de conversas sobre música, temas espirituais e
esotéricos. Além de continuar a compor, escreveu também um livro de poesias.
Atualmente, tem como sua atividade principal a Medicina e possui uma clínica em
Fortaleza.
Edson Belém - guitarrista. Seu repertório tinha músicas muito
animadas. Cantava, entre outras, “Cabelos Longos e Idéias Curtas”
de forma especial, com expressões corporais divertidas, de vez em quando fazia como se estivesse
chutando uma bola ou coisa parecida e jogava a perna para o ar. Apesar do pouco tempo que esteve com o grupo,
marcou sua presença. Soube que ele
esteve na França, a serviço, por algum tempo.
Edson Girão Rios - guitarrista-base e vocalista. Grande companheiro e
amigo. Excelente e criterioso músico, apreciador e conhecedor de muita harmonia
musical, além de possuir um ótimo e variado repertório. Detalhista ao extremo,
meticuloso. Se um acorde qualquer não estivesse certo, inserido na hora exata,
tínhamos que ensaiar tudo de novo. Às vezes até chegava a exagerar, pensávamos.
Isso porque desejava fazer tudo bem feito. Sempre muito zeloso com o seu
instrumento, preocupava-se também com a aparência geral de todo o conjunto. O
Edson foi um dos participantes do Big Brasa que ficaram mais íntimos lá em
casa. Hoje em dia continua atuando com grande destaque na noite cearense.
Edmundo Reis Bessa - Edir - baterista. Carinhosamente
apelidado por nós de “Peito de Pombo”. O Edi foi indicado para o conjunto em face da
saída do Severino, por motivos profissionais. Em um dos
“festivais”, ou seja, bailes animados por dois ou três conjuntos,
muito comuns na época, no Líbano, Diários e outros clubes de Fortaleza,
encontramos o Edi tocando com o conjunto musical “Os Monkeys”. Ele
estava desmontando sua bateria, vestido com uma camiseta do Flamengo, todo
suado, com barba grande e tudo a que tem direito. O meu pai, ao ver aquela
figura, totalmente ao contrário do que ele imaginava ser “certo”,
perguntou para mim, com jeito de quem comeu e não gostou:
- João Ribeiro, é este o rapaz que você falou?
Perguntou, decepcionado. Ao que eu respondi afirmativamente, dizendo:
- É sim, pai, o cara é esse aí mesmo. Toca bateria
muito bem e, segundo me disseram, é uma pessoa bastante responsável. Resultado,
o Edi veio para o Big Brasa e chegou para ficar. Excelente profissional,
respeitador, amigo, “topador” de qualquer parada. Hoje, de vez em
quando é citado como exemplo, pelo Mestre Alberto, de que “as aparências
enganam”, como diz aquele ditado. Atualmente o Edi é comerciante,
professor de Matemática e dirigente de uma Escola de 1º e 2º Graus em Cascavel,
Ceará.
Eudes - Francisco Ferreira Filho - baterista. Pertencia ao conjunto
“Os Belgas”. Esteve no Big Brasa cumprindo algumas funções em
substituição ao nosso baterista, impossibilitado por motivo de força maior.
Todas as vezes que se apresentou com o conjunto fez muito sucesso. Chamava
realmente a atenção por sua agilidade e malabarismos com o seu instrumento.
Excelente profissional, que infelizmente já nos deixou.
Fernando - “Galba” – motorista. Trabalhou
conosco muito tempo. Conhecemos o “Seu” Fernando na pracinha de
Messejana, onde pegava corridas com sua rural, sempre muito bem cuidada. Era
zeloso com nosso material, cumpria sempre à risca os horários determinados, e
nos ajudava em tudo que podia. Nas viagens a turma tirava o maior
“sarro” dele. Brincava-se demais com o “Galba”, apelido
dado pelo Adalberto.
Fernando - “Café
Copa” - contrabaixista. Revendedor de uma marca de café, dirigia uma
Kombi, fazendo suas rotas em bairros de Fortaleza e no interior do Ceará. Daí o
seu apelido. Participou do Big Brasa por ocasião de alguns bailes
carnavalescos, intermediando um contrato para quatro bailes de carnaval em
Cascavel. Versátil, sabia também tocar guitarra e cantar. Era um camarada muito
divertido e gozador, brincava com tudo e com todos.
Getúlio Alberto Ribeiro da Silva – meu irmão e mascote do
Big Brasa. A presença do Getúlio com seus cabelos grandes, embora ainda
criança, tocando um pandeirinho, causava grande admiração por estar entre um
grupo de música jovem. Nos primeiros anos de existência do conjunto tinha seu
próprio fã-clube. Acompanhou o Big Brasa na temporada de Caxias, Estado do
Maranhão, onde fez um sucesso enorme com o público em geral e em diversos
bailes realizados em Fortaleza.
João Ribeiro da Silva Neto - Beiró
- guitarrista-solo, tecladista e vocalista. Vocalista apenas em back-vocal, com se diz hoje. Desde novo
estudei música e dediquei-me à profissão com todo o entusiasmo possível. Como guitarrista-solo do conjunto sempre
procurei “tirar” de meu instrumento todos os sons possíveis. E
tentava os sons “impossíveis” com a auxílio de pedais de efeitos diversos.
Pelos solos, efeitos e improvisos agressivos, cheguei a ser considerado um dos
melhores guitarristas do Norte e Nordeste, segundo comentários da imprensa
local sobre o meio artístico e publicação da TV Rádio e Revista. Em um dos shows do cantor Ednardo, no Teatro José
de Alencar, lembro que fui muito aplaudido por um dos improvisos na guitarra.
Meu objetivo principal foi o profissionalismo: ser um músico correto, tanto com
meus companheiros quanto com o público em geral. Sempre busquei o aprimoramento
das técnicas musicais, procurando fazer o melhor possível dentro das
possibilidades existentes. O que hoje em dia se chama de “Qualidade
Total”, cujo princípio é, “fazer certo da primeira vez”, eu,
por intuição, procurava empregar no Big Brasa naquela época.
João Sales Filho – “Joãozinho”, o “Lennon”. Guitarrista,
tecladista e cantor. Ingressou no Big Brasa através da indicação de um amigo.
Em seu primeiro ensaio facilmente adaptou-se ao grupo. Cantava um repertório
variado, sempre com músicas de sucesso. De relacionamento fácil, o Joãozinho
integrou-se bem ao nosso grupo musical. Com a aquisição do primeiro órgão
eletrônico, interessou-se pelo instrumento e aprendeu alguns acordes rapidamente, o suficiente para que passasse a
tocá-lo. Depois desenvolveu sua harmonia, acompanhando as músicas com bastante
desenvoltura.
Lurdinha - vocalista. Participou do conjunto por uns dois anos.
Com sua bonita voz pudemos diversificar nosso repertório com mais sambas e
forrós. Tinha muita presença em palco, possuía técnica vocal e sabia se
apresentar como uma verdadeira cantora profissional. Suas músicas sempre
animavam muito os bailes. A Lurdinha fez muito sucesso nas festas tocadas pelo
Big Brasa, em Fortaleza e no interior do Estado. Foi a única presença feminina
em nosso grupo.
Luciano Franco - contrabaixista. Excelente músico, profissional correto
e amigo de todos. Além de tocar contrabaixo, também é um ótimo tecladista. Sempre muito calmo e alegre, fazia uma
harmonia super completa. Por sua ótima percepção, além da marcação baseada nos
acordes convencionais, feita no contrabaixo, às vezes conseguia fazer variações
espetaculares e alcançar notas incríveis, logo incorporadas aos arranjos
musicais do Big Brasa. Participou conosco de muitos bailes e de diversos programas
Show do Mercantil, na TV Ceará.
Lucius Maia Araújo - contrabaixista e vocalista. Manteve seus primeiros
contatos com o conjunto no Clube Recreio do Funcionário e depois no América
Futebol Clube, quando cantou “Taxman”, dos Beatles. Com sua boa voz
e inglês fluente não admitia cantar uma música em que uma só palavra estivesse
em dúvida. Isto porque naquele tempo as letras das músicas quase sempre tinham
que ser copiadas do próprio disco. De gosto musical refinado, escolheu músicas
que enriqueceram o repertório do Big Brasa por longo tempo. Tinha muitos discos
e neles pesquisava para montar seu repertório.
Luiz Antônio Alencar - O “Peninha” - guitarrista-base e
vocalista. Aficionado por música, em especial pelos rocks pesados dos “Rolling Stones” e pela música dos
Beatles, dentre outros grupos famosos. Destacou-se no conjunto por seu
repertório de músicas em inglês, as quais na maioria das vezes, o Big Brasa as
usava nos momentos em que os bailes estavam precisando de maior animação. Muito
inteligente, aprendeu inglês ainda cedo. A origem do apelido
“Peninha”, evidentemente, foi em virtude de ele ser “um
pouco” desastrado com os equipamentos, cabos e tudo mais.
Nas
viagens do conjunto sempre tinha uma imitação para fazer, como a daquele
personagem da televisão “Zé Bonitinho”. Imitava também até mesmo
seus próprios parentes, o que para nossa turma funcionava muito bem. Gozador ao extremo, chegava a irritar o
Getúlio, ao cantarolar uma simples introdução de uma música que ele não
gostava.
Seu ingresso no Big Brasa ocorreu durante a
realização de um pequeno festival na sede do Messejana, em um domingo à noite,
organizado pela paróquia local. Ele cantou Penny Lane e todos ficamos
entusiasmados no sentido de que ingressasse no Big Brasa.
Por simples piração, houve um dia em que o Peninha
faltou uma festa de término de curso, que o Big Brasa animou no Clube de
Regatas. Foi encontrado na mesma noite tocando no Clube Líbano, com outro
grupo. Muita vergonha e dificuldade para nós, pois o repertório do Big Brasa estava
quase todo nas mãos dele e eu tive que solar praticamente a noite inteira,
melancolicamente. Nem é bom lembrar, foi um fracasso. Por esse fato, na semana
seguinte quase “decapitamos” o Peninha ...
Em outra ocasião, no Balneário, ficou tão empolgado
com a música e com a platéia, que começou a girar seu microfone, segurando-o
apenas pelo cabo. Quando eu vi aquela cena, do outro lado do palco, me preparei
para o pior, visto que se o cabo ou o plug se rompessem o microfone sairia
voando a uns mil por hora e poderia atingir alguém de maneira fatal. Dito e
feito. O cabo chegou a quebrar e eu pude ver toda a trajetória daquele pobre
microfone, que por pura sorte nossa e das eventuais vítimas, atravessou o palco
e chocou-se violentamente no suporte do prato da bateria, que amorteceu o
impacto.
Luis Alberto Magalhães - Luisinho - vocalista e guitarrista-solo e líder do excelente
conjunto musical “Os Faraós”, formado por quatro irmãos (Vicente,
Antônio, Sebastião e o próprio Luis), fez muito sucesso em Fortaleza na mesma
época em que existiu o Big Brasa. Participamos juntos (Big Brasa e Faraós) de
vários “festivais”, motivos de intensa publicidade e repercussão em
Fortaleza.
Com sua excelente voz, o Luisinho conseguia
interpretar os maiores sucessos internacionais e nacionais do momento
empolgando a todos. O som de sua guitarra-solo era característico, pois eu
podia saber perfeitamente quando ele estava tocando, mesmo antes de entrar no
clube. Sempre muito assediado por fãs, até a dissolução do seu grupo. Mais tarde
um pouco nos unimos por mais ou menos três anos em uma sociedade - “Big
Brasa” e “Faraós”, onde eu participava como tecladista, sendo
nosso trabalho musical bastante reconhecido pela boa qualidade do repertório,
arranjos e principalmente pelos inúmeros equipamentos e efeitos especiais que
utilizávamos, sempre impressionando com novidades a todos que nos assistiam.
Posteriormente iniciou sua carreira solo, mais uma vez obtendo merecido sucesso
em Fortaleza. Atualmente o Luisinho desenvolve seu trabalho musical à frente de
um novo grupo musical -“Luisinho Magalhães e Banda”- muito
solicitado para os principais eventos musicais da cidade.
Marcos Oriá - guitarrista-base e vocalista. Participou ativamente do
conjunto durante o seu primeiro ano de
existência. Colaborou também na formação de nosso primeiro repertório, sempre
com sugestões musicais de bom gosto. Cantava boa parte das músicas. Foi quem
desenhou e pintou o nome “BIG BRASA” em nossa primeira bateria.
Viajou com o Big Brasa na temporada de Balsas e de Teresina. O Marcos Oriá é
formado em Direito.
Mardônio - vocalista. Participou do conjunto em um período por um
bom tempo. Bom cantor, apresentava-se sempre muito bem, gostava de aprender
logo as músicas de sucesso e tinha postura de um verdadeiro artista. Sempre
manteve um bom relacionamento com todo o grupo. Muito brincalhão, com seu
cabelo comprido, fazia trejeitos de todos os tipos e às vezes até imitava um
“gay”. Isso também em pleno palco, o que fez no Náutico Atlético
Cearense, em um baile de formatura, quando em uma pausa na música “Pisa
na barata”, tirou o sapato e ficou correndo na frente de todo mundo,
desceu até o salão, tentando matar uma barata por ele inventada. Depois recomeçou a música normalmente. Como
sua brincadeira foi um verdadeiro sucesso e a turma curtiu muito, passou a
repeti-la em outros clubes. Posteriormente o Mardônio continuou sua carreira
artística. Chegou a trabalhar como cantor em diversas casas noturnas de São
Paulo e conseguiu gravar alguns discos.
Mairton Vitor dos Santos - pistonista. Excelente instrumentista,
contribuiu de forma valiosa para o enriquecimento musical do conjunto. Foi
trazido para o Big Brasa por seu amigo Airton França, visto que tinham sido
criados juntos e tocado anteriormente em outros grupos e na banda de música do
Colégio Pia Marta. Em Cascavel, durante um dos bailes carnavalescos que ali
tocamos, ao entrar no clube, pouco antes do horário de iniciarmos a festa, e
com uma fantasia completa de palhaço, disse para o porteiro: “O
pistonista do conjunto é um verdadeiro palhaço”, ao que o cara riu muito na hora. Muitas vezes, no
retorno dos bailes tocados no interior, para Fortaleza, parávamos em bares ou
pequenos restaurantes de beira de estrada para tomar o café da manhã. Ele
então, descia do carro com a cara toda amassada, de quem realmente trabalhou a
noite inteira, sentava-se ao lado de todos e, enquanto nós tomávamos café com
leite, pão, pedia para o garçom, com sua voz rouca e grave:
- Traz uma cervejinha aí, cara.
Então
tomava apenas uns poucos goles, como seu café da manhã. Ao final levantava-se
para sair, e olhando para o Airton dizia:
-
Torinha, paga aí que depois a gente acerta! E voltava para o carro. Todo mundo
achava graça e mais ainda o próprio Airton, que mesmo pagando as contas do amigo
nunca chegou a esquentar a cabeça com aquilo.
O
Mairton atualmente é o líder da banda “Sonhos Dourados”, que marca
presença significativa nos principais eventos musicais de Fortaleza.
José Marcílio Mendonça Ferreira - excelente
músico e companheiro. Participou de um carnaval com o Big Brasa em Cascavel,
como cantor. Como vocalista e instrumentista, por um longo período fez parte do
Quinteto Agreste, grupo que conseguiu muito sucesso em Fortaleza durante sua
existência. Atualmente o Marcílio é proprietário e coordenador musical de um
ótimo e bem sucedido estúdio de gravações digitais de Fortaleza, o
“Proaudio Studio”, que possui equipamentos de gravação modernos, de
última geração.
Messias - saxofonista. Bom músico, de sopro forte e muita
resistência. Participou, como músico contratado, de dois carnavais com o Big
Brasa. Em Cascavel, durante um dos últimos bailes, quando chovia muito em toda
a cidade e o clube enfrentava um verdadeiro “toró”, nosso
pistonista baqueou na parte final da festa. Ele então ao se ver sozinho como
instrumentista de sopro, desceu do palco repentinamente e desapareceu na
multidão sem avisar nada. Como o baile ainda estava na metade, eu fiquei muito
apreensivo, visto que teria que ficar o resto da noite solando as músicas no
órgão juntamente com o cantor, nada agradável para uma orquestra de carnaval.
Mas para minha surpresa, o Messias retornou instantes depois, aparecendo de
repente no palco, todo molhado e somente de calção. Aí eu pensei que ele tinha
ficado maluco, mas não. Ele pegou o sax, nele afixou um microfone, e gesticulou
para mim no sentido de que dali para a frente seria com ele, ou seja, iria
comandar o repertório. E assim foi, o cara se garantiu mesmo. Solo após solo,
com muita resistência, ele foi até o final da festa.
Sérgio Alves da Silva - bigu. Nosso vizinho até bem pouco tempo,
ainda mora em Messejana e continua nosso amigo. O Sérgio, além de ter sido meu
colega de infância, companheiro de jogo de futebol de botão, de campo, e também
de um “carteado” nas férias, teve longa permanência no Big Brasa.
Esteve presente tanto nas funções realizadas em Fortaleza, quanto no interior
do Estado. Aprendeu a controlar e a conferir todo o material do conjunto de
maneira que não faltasse nada. Eram muitas caixas de som, amplificadores, cabos
e acessórios diversos que não podiam faltar. Por vezes ficamos juntos até o sol
raiar, para transportar nosso equipamento para casa.
Inúmeras
vezes o Sérgio também me ajudou a reformar e a executar manutenções periódicas
nos equipamentos do conjunto, além de me auxiliar em funções musicais diversas
em Fortaleza, como casamentos e recepções. Às vezes tinha um problema de
deslocar a omoplata e quando isso acontecia, por mau jeito ou muito esforço,
tínhamos que colocar o braço dele de volta “na marra”. Foi operador
de microfone, câmera-man e atualmente é operador de áudio na TV Educativa, hoje
TV Ceará (TVC).
Severino Tavares, “Ziglim” -
baterista. Quando nós ainda estávamos
por definir qual seria o nome do conjunto, para que pudéssemos pintá-lo na
bateria e fazer nossa estréia no Balneário, em uma conversa entre nós ele
disse: “Big Brasa”. O pessoal se entreolhou naquele momento, porque
vários nomes já tinham sido sugeridos, mas houve aprovação geral. O Severino
ingressou no conjunto no seu início. Desenvolveu suas habilidades na bateria
pouco a pouco e com o passar do tempo firmou-se como um baterista que tocava
“para o conjunto”, isto é, talvez por não possuir muita técnica,
limitava-se a fazer tudo certinho, conforme os ensaios. Uma das dificuldades de
um conjunto consiste na passagem de uma música para outra. Convencionamos então
um único “breque”, feito pela bateria, que daria a entrada de todas
as músicas, variando apenas o andamento, a velocidade.
Silvino – vocalista. Grande amigo de todos, brincalhão, uma
figura simpática e agradável. Em seu repertório sempre diversas músicas
animadas. Com seu excelente timbre de voz, gostava das músicas do Tim Maia.
Participou de inúmeras apresentações com o Big Brasa, integrando posteriormente
o grupo vocal “The Sangue Súgares”, de Fortaleza.
Wilson Silvino de Moura - saxofonista.
Participou do Big Brasa em uma boa fase. Gente fina, simples, respeitador e
amigo. Com seu saxofone tenor, sabia improvisar e tinha um sopro suave.
Executava algumas músicas também como solista. Após ter deixado o conjunto
prestou concurso público para a Polícia Federal, onde trabalhou até se aposentar. Há
algum tempo, eu vi uma fotografia em um jornal que mostrava alguns agentes
federais que tinham feito uma grande apreensão de drogas em Tianguá. Pois o
Silvino aparecia nessa foto, empunhando uma submetralhadora, numa posição
característica, como se estivesse segurando o seu sax. Liguei para ele no dia
seguinte e lhe mandei um recorte da tal foto, comentando o detalhe observado.
Na oportunidade me disse que ainda tocava sax e que inclusive estava
aperfeiçoando sua prática em teclados.
Estes foram os músicos e colaboradores que marcaram
presença no conjunto Big Brasa e em minha vida musical. Quisera eu possuir
fotografias de todos, para aqui deixá-las registradas. Tenho certeza absoluta
que todos guardam boas recordações do período que estivemos juntos. Dos bons e
até mesmo de algumas momentos difíceis que atravessamos, visto que a nossa
união por um objetivo único - a Música - é que fez o Big Brasa brilhar em
Fortaleza, deixando esse nome bem guardado na memória de muitas pessoas. Foram
inúmeras apresentações onde o grupo inteiro deixou sua marca de competência, de
interesse e de responsabilidade pelo trabalho, dignificando e sempre honrando a
profissão de músico.
Passados praticamente trinta anos do início desse
maravilhoso período, restam as agradáveis lembranças de tudo que ocorreu em
nossa vida musical e agradecer a Deus por ter participado destes momentos
inesquecíveis.
João
Ribeiro da Silva Neto - O BIG BRASA E MINHA VIDA MUSICAL (1999) - Lembranças de um período inesquecível
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