Relembrando Messejana

Por Francisco Parente Brandão

Como sempre é bastante comum sentir saudades da Messejana, em Fortaleza, Ceará, onde nasci e fui criado. Ali vivi minha infância, adolescência e maturidade, como muitos outros filhos da Messejana.

Tenho muito do que recordar desses períodos: percorri descalço as ruas barrentas de chão batido - e aplainadas pelo trator que deixava a criançada curiosa e atenta nas manobras do maquinista; a chegada do calçamento de pedras toscas com fios de pedras delimitando as ruas nos quais corríamos sobre os mesmos desafiando nossos equilíbrio e ousadia, a melhoria da iluminação publica que no início mais parecia um vagalume de tantos apagares, os banhos de chuva sempre acompanhados de uma corrida até a bica, formada no Mercado de Messejana, que ao bater nas cabeças era sentida uma dolorida sensação, mas repleta de felicidades!

Vale lembrar ainda dos Ciganos, acampados nas sombras das mangueiras com suas festas acompanhadas pelo som da Sanfona e o bater ritmado e harmonioso das colheres e o canto galego que pouco nós entendíamos e nas noites, as tendas iluminadas por lampiões, nas quais dava para se apreciar o brilho dos anéis com pedras preciosas cintilando nos dedos dos chefes do grupo no puxado da Sanfona.

Os Circos montados na Praça do Mercado eram frequentes e nas tarde o Palhaço saía em cortejo pelas ruas com a criançada acompanhando-o e respondendo em coro:
 “O Palhaço o que é?” “Ladrão de mulher”, todos eram marcados no braço para terem acesso ao espetáculo programado para o dia.

Conhecíamos pelo nome as autoridades locais: o delegado de polícia, o coletor, o tabelião, o pároco, o subprefeito, o vereador e o deputado, o juiz, os principais comerciantes nas suas mercearias... Nossas celebridades, pessoas sem nenhum orgulho e honestos nas suas atitudes. Era como se fossemos uma grande e harmoniosa família apesar das adversidades ou diferenças. Vivências compartilhadas sem distinções de cor, credo religioso, status social o que nos garantia o respeito mútuo.

Áureos tempos coroados nas festas em datas comemorativas, como os desfiles garbosos dos alunos e alunas do Ginásio Presidente Vargas cujo nome era uma homenagem ao Presidente Vargas dada pelo Prof. Ernesto Matos Gurgel, a curtição da rivalidade sadia entre as agremiações esportivas Messejana e Salgado da Gama e as matinês no Cine Messejana!

Não podemos esquecer jamais as manhãs dançantes e as tertúlias no Balneário Clube de Messejana, ambiente de convivência social e familiar. Vale dizer que o Conjunto Big Brasa nas nasceu em abril de 1967 em Messejana, cresceu e se expandiu para outros estados rapidamente, em razão, principalmente, de suas participações na televisão cearense. Tinha inicialmente o conjunto musical Big Brasa o Sr. Alberto Ribeiro (in memoriam), que foi um grande incentivador e apoio fundamental para os componentes da banda, na sua maioria de Messejana, rompendo barreiras com a participação da Ala Feminina do Big Brasa, com filhas de Messejana. O grupo teve como principal responsável para o seu crescimento o seu filho João Ribeiro (no meio musical conhecido por Beiró), líder e guitarrista-solo do Big Brasa, incansável na sua luta e determinação para que o Conjunto tivesse bases sólidas. E tudo isso viria a acontecer, com uma trajetória plena de sucesso em Fortaleza, na televisão cearense (TV Ceará, Canal 2) e no interior do Ceará, além de sua atuação em várias localidades nordestinas. Além de ter estado presente com o conhecido grupo “Pessoal do Ceará”, com Ednardo Sousa, Belchior e Fagner, dentre outros. Boas e inesquecíveis lembranças!

Aí percebo que tudo ficou no passado e lembro das primeiras paqueras, a primeira namorada, a primeira dança encabulado e cheio de medos, tudo guardado na memória, as festas da Matriz com seus leilões e disputas dos Partidos Azul e Encarnado, para escolha da Rainha, o caminhar pela praça num jogo de sedução entre os passantes, o som do alto falante e os oferecimentos de determinadas músicas para certas damas e senhorinhas, a 1ª. Comunhão na Igreja Matriz celebrada pelo Padre Pereira, figura polêmica, carismática e impar como ser humano, a URJA - União Recreativa José de Alencar - onde aconteciam torneios de Voleibol, Futebol de Salão e festas dançantes nos seu salão principal.

Tudo evaporado no tempo restando apenas os escombros das estruturas que fizeram parte da arquitetura da Messejana onde nos seus domínios acolhiam a todos numa comunhão solidária e familiar. Tudo destruído encoberto pelo mato escondendo o que antes teve vida. Lembro do aterramento para a construção do Tremendão que se tornou ponto de encontro de várias gerações e frequentado por pessoas que se deslocavam de Fortaleza para as festas e atrações artísticas que vinham para abrilhantarem esse ambiente festivo, alegre e descontraído, hoje apenas ruínas sem nos dá alguma ideia do que virá a ser, parecendo que o abandono é o futuro esperado.

O Cine Messejana gerenciado pelo Sr. Benedito escombros do que fora um ambiente de encontros e acolhimento familiar. Bate sim uma saudade dolorida de tão impensável fim e nos deparamos com o descaso do poder público que nunca demonstrou interesse em manter esse patrimônio histórico como difusor de educação e cultura. O tradicional campo do Messejana transformado numa Areninha (o que se tornou coqueluche atual). Até quando terá sua arquitetura preservada e quem irá mantê-la funcionando adequadamente valorizando a gente local como Centro de acolhimento, centro Social para formação de vínculos afetivos como foi no passado?

Claro o tempo não para é dinâmico, mas não precisa destruir e esquecer sem nada fazer para desmontar essa EVOLUÇÃO que tem se dispersado ao invés de agregar. Porém, o que esperar dos gerentes sem raízes como eram pessoas de dentro da comunidade? Certamente esses gerentes atuais jamais tiveram pelo menos a curiosidade de caminharem pelas ruas e constatarem a situação de abandono tão evidente nos esgotos a céu aberto exalando o mau cheiro demonstrando a falta do saneamento básico tão necessário, porém, sempre prometido, protelado e esquecido.

Já não se tem as conversas nos bancos da praça ou nas calçadas, nada de seguro, os moradores tradicionais deslocados ou expulsos de suas residências acomodadas na periferia e tudo transformado em pontos comerciais ou derrubados para novos prédios visando o comercial sempre. Tudo parecendo um verdadeiro mercado persa...

Só nos restam as lembranças e a certeza de que valeu ter vivido participando dessa Messejana que foi e jamais deixará de ser em cada um de nós que teve a alegria e felicidade de fazer parte desse passado áureo da querida e abençoada Messejana fotografada em cores vivas da nossa memória.

A imagem que acompanha essas lembranças é a da Lagoa de Messejana, com a Estátua de Iracema e ao fundo o Restaurante Tremendão, marcas de um passado eternizado em nossas memórias.

Francisco Parente Brandão.

 



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